- Partilhar artigo
- ...
Estará a Europa (e Portugal) a ir num bom caminho no que toca à transição energética? Conseguirá alcançar as metas? E nas datas definidas? Um estudo da McKinsey conclui que a União Europeia (UE) tem de ultrapassar obstáculos tecnológicos desta transição com materiais substitutos, inovação, construção de infraestruturas e regulamentação se quiser atingir os objetivos.
No que se refere a Portugal, Maria João Ribeirinho, sócia sénior da McKinsey, diz que o país tem vindo a ser considerado uma referência em descarbonização. O país está numa posição vantajosa, com uma das mais baixas emissões per capita da UE. No entanto, alerta que não podemos ser complacentes. "É imperativo manter esta trajetória uma vez que para atingir a meta de zero emissões de CO2 em 2050, Portugal terá de aumentar a velocidade de descarbonização em cerca de 20%."
Margarida Couto, presidente da GRACE, tem opinião semelhante. "Tomando como base valores de 2021, não só reduzimos as emissões em mais de 30% face a 2005, estando numa trajetória que parece alinhada com a meta europeia estabelecida para 2030, como somos, no setor da eletricidade, o terceiro país da UE com maior nível de incorporação de renováveis (mais 31% do que em 2005)", aponta. Além disso, acrescenta, as metas revistas anunciadas no âmbito do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) permitem acreditar que Portugal continuará a consolidar uma trajetória de descarbonização da economia compatível com o Acordo de Paris e com as metas europeias do Pacto Ecológico Europeu.
Já Pedro Nunes, da Zero, refere que a "situação de Portugal é vantajosa, pois mesmo no cenário mais ambicioso que o estudo da McKinsey modelou, a incorporação de renováveis na eletricidade em termos mundiais atingirá os 85% em 2050, quando o objetivo que virá vertido na revisão do PNEC até 2030 aponta para esse mesmo valor no sistema elétrico português já em 2030". O ambientalista lembra ainda que o Roteiro para a Neutralidade Carbónica em Portugal também aponta para uma redução de emissões em 2050 superior à que o estudo da McKinsey refere neste cenário. Ou seja, "comparativamente com a situação geral, Portugal está bem posicionado".
Ainda assim, Pedro Nunes refere que os esforços de descarbonização em Portugal não são suficientes, dado que "está fora de uma trajetória compatível com o 1,5 °C do Acordo de Paris". Por exemplo, aponta Pedro Nunes, essa trajetória implicaria nesta década a mais crítica para cumprir esse desígnio.
Maria João Ribeirinho considera que é crucial que o país alcance as metas também para garantir competitividade económica. No seu entender, o desenvolvimento económico e a transição energética estão relacionados, sendo que os eventos climáticos extremos que o país tem vindo a observar, como secas e ondas de calor, continuarão a afetar setores-chave. "Avançar decididamente na descarbonização ajudará a mitigar estes efeitos", afirma convicta, acrescentando que Portugal poderá investir em tecnologia e energia verdes. E lembra que Portugal tem uma enorme vantagem: o facto de ter capacidade para produzir energia renovável mais barata face à média da UE. "Temos uma oportunidade inédita na nossa história de criar valor e de industrializar, através da energia limpa."
Obstáculos a ultrapassar
Embora nalguns pontos Portugal esteja numa posição privilegiada, isso não significa que já esteja tudo pronto. Como aponta Margarida Couto, um dos obstáculos prende-se com o facto de o país precisar de desenvolver as redes de transporte e distribuição, sob pena de esta não comportar o esperado aumento da utilização e produção de eletricidade. Isso "não requer apenas um investimento que se estima na ordem dos 30 mil milhões de euros na rede elétrica, como exige que se acelere bastante a execução dos projetos associados ao reforço de redes".
A isto há ainda que acrescentar o nível de investimento que é necessário mobilizar. Principalmente junto do setor privado, afirma a presidente da GRACE, nomeadamente "em projetos de produção de energia verde - a estratégia de transição energética estabelecida no PNEC pressupõe um investimento de 75 mil milhões de euros até 2030". "O que é, no mínimo, desafiante", enfatiza.
Pedro Nunes, por seu lado, divide os obstáculos em duas categorias: a implementação de renováveis e os transportes. No caso das energias renováveis os principais obstáculos incidem na falta de recursos administrativos em termos de licenciamento dos projetos, no novo potencial eólico onshore por aproveitar escasseia, no facto de as centrais existentes só agora começarem a justificar "repowering" e ainda inexistência das chamadas áreas de aceleração de renováveis, em que o licenciamento é mais célere.
Serão as medidas anunciadas pelo Governo suficiente? A Zero tem dúvidas. Pedro Nunes considera que o setor mais bem posicionado é o da eletricidade, em que o Governo tomou medidas importantes e eficazes na descarbonização, como o fecho das centrais a carvão. No entanto "há apostas questionáveis, como seja a exportação de hidrogénio verde". "Uma aposta cara e desperdiçadora de energia", descreve. A isto Margarida Couto acrescenta que "infelizmente Portugal costuma ter mais problemas na execução das medidas no que no seu desenho".
Há oportunidades?
Maria João Ribeirinho considera que o país tem duas grandes oportunidades: o hidrogénio verde e o ecossistema de baterias, intimamente relacionado com a indústria automóvel.
No caso do hidrogénio verde, a executiva da McKinsey refere que o facto de Portugal produzir energia renovável cerca de 20-30% mais barata do que a média europeia permite-nos ambicionar ser o "hub" de hidrogénio verde da UE. Isto acontece porque mais horas de vento e sol.
Contudo, explica, Portugal deverá também produzir outras matérias que requerem hidrogénio verde e que têm maior valor acrescentado, como o aço e o amoníaco verde - elementos-base da indústria automóvel e dos fertilizantes, respetivamente. Conseguir que o país seja líder nestas matérias-primas verdes é um passo importante para revitalizar a indústria, tornando-nos competitivos relativamente outros países historicamente mais industrializados.
Já no caso das baterias "o ‘know-how’ da indústria, aliado a mão de obra competitiva e infraestrutura de exportação sólida, dá a Portugal as condições ideais para atrair a produção de veículos elétricos em escala". Tendo em conta que o Global Energy Perspective estima que até 2030 a procura de baterias de lítio aumente três vezes, Portugal teria um papel importante nesta indústria. Pelo que Maria João Ribeirinho considera que desenvolver uma cadeia local de baterias é, não só uma oportunidade considerável, como também potenciará a indústria automóvel do futuro. "Este é o momento de "jogar ao ataque" e apontar à captura de valor, pois a janela temporal desta oportunidade não é infinita: se não atuarmos, outros ganharão", afirma.
No que se refere a Portugal, Maria João Ribeirinho, sócia sénior da McKinsey, diz que o país tem vindo a ser considerado uma referência em descarbonização. O país está numa posição vantajosa, com uma das mais baixas emissões per capita da UE. No entanto, alerta que não podemos ser complacentes. "É imperativo manter esta trajetória uma vez que para atingir a meta de zero emissões de CO2 em 2050, Portugal terá de aumentar a velocidade de descarbonização em cerca de 20%."
Margarida Couto, presidente da GRACE, tem opinião semelhante. "Tomando como base valores de 2021, não só reduzimos as emissões em mais de 30% face a 2005, estando numa trajetória que parece alinhada com a meta europeia estabelecida para 2030, como somos, no setor da eletricidade, o terceiro país da UE com maior nível de incorporação de renováveis (mais 31% do que em 2005)", aponta. Além disso, acrescenta, as metas revistas anunciadas no âmbito do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) permitem acreditar que Portugal continuará a consolidar uma trajetória de descarbonização da economia compatível com o Acordo de Paris e com as metas europeias do Pacto Ecológico Europeu.
Já Pedro Nunes, da Zero, refere que a "situação de Portugal é vantajosa, pois mesmo no cenário mais ambicioso que o estudo da McKinsey modelou, a incorporação de renováveis na eletricidade em termos mundiais atingirá os 85% em 2050, quando o objetivo que virá vertido na revisão do PNEC até 2030 aponta para esse mesmo valor no sistema elétrico português já em 2030". O ambientalista lembra ainda que o Roteiro para a Neutralidade Carbónica em Portugal também aponta para uma redução de emissões em 2050 superior à que o estudo da McKinsey refere neste cenário. Ou seja, "comparativamente com a situação geral, Portugal está bem posicionado".
Ainda assim, Pedro Nunes refere que os esforços de descarbonização em Portugal não são suficientes, dado que "está fora de uma trajetória compatível com o 1,5 °C do Acordo de Paris". Por exemplo, aponta Pedro Nunes, essa trajetória implicaria nesta década a mais crítica para cumprir esse desígnio.
Maria João Ribeirinho considera que é crucial que o país alcance as metas também para garantir competitividade económica. No seu entender, o desenvolvimento económico e a transição energética estão relacionados, sendo que os eventos climáticos extremos que o país tem vindo a observar, como secas e ondas de calor, continuarão a afetar setores-chave. "Avançar decididamente na descarbonização ajudará a mitigar estes efeitos", afirma convicta, acrescentando que Portugal poderá investir em tecnologia e energia verdes. E lembra que Portugal tem uma enorme vantagem: o facto de ter capacidade para produzir energia renovável mais barata face à média da UE. "Temos uma oportunidade inédita na nossa história de criar valor e de industrializar, através da energia limpa."
Obstáculos a ultrapassar
Embora nalguns pontos Portugal esteja numa posição privilegiada, isso não significa que já esteja tudo pronto. Como aponta Margarida Couto, um dos obstáculos prende-se com o facto de o país precisar de desenvolver as redes de transporte e distribuição, sob pena de esta não comportar o esperado aumento da utilização e produção de eletricidade. Isso "não requer apenas um investimento que se estima na ordem dos 30 mil milhões de euros na rede elétrica, como exige que se acelere bastante a execução dos projetos associados ao reforço de redes".
A isto há ainda que acrescentar o nível de investimento que é necessário mobilizar. Principalmente junto do setor privado, afirma a presidente da GRACE, nomeadamente "em projetos de produção de energia verde - a estratégia de transição energética estabelecida no PNEC pressupõe um investimento de 75 mil milhões de euros até 2030". "O que é, no mínimo, desafiante", enfatiza.
Pedro Nunes, por seu lado, divide os obstáculos em duas categorias: a implementação de renováveis e os transportes. No caso das energias renováveis os principais obstáculos incidem na falta de recursos administrativos em termos de licenciamento dos projetos, no novo potencial eólico onshore por aproveitar escasseia, no facto de as centrais existentes só agora começarem a justificar "repowering" e ainda inexistência das chamadas áreas de aceleração de renováveis, em que o licenciamento é mais célere.
Este é o momento de jogar ao ataque e apontar à captura de valor. Maria João Ribeirinho
Sócia sénior da McKinsey
Já no caso dos transportes, o ambientalista considera que "está tudo por fazer" já que "o automóvel continua esmagadoramente a ser a forma preponderante de os portugueses se deslocarem".Sócia sénior da McKinsey
Serão as medidas anunciadas pelo Governo suficiente? A Zero tem dúvidas. Pedro Nunes considera que o setor mais bem posicionado é o da eletricidade, em que o Governo tomou medidas importantes e eficazes na descarbonização, como o fecho das centrais a carvão. No entanto "há apostas questionáveis, como seja a exportação de hidrogénio verde". "Uma aposta cara e desperdiçadora de energia", descreve. A isto Margarida Couto acrescenta que "infelizmente Portugal costuma ter mais problemas na execução das medidas no que no seu desenho".
Há oportunidades?
Maria João Ribeirinho considera que o país tem duas grandes oportunidades: o hidrogénio verde e o ecossistema de baterias, intimamente relacionado com a indústria automóvel.
No caso do hidrogénio verde, a executiva da McKinsey refere que o facto de Portugal produzir energia renovável cerca de 20-30% mais barata do que a média europeia permite-nos ambicionar ser o "hub" de hidrogénio verde da UE. Isto acontece porque mais horas de vento e sol.
Contudo, explica, Portugal deverá também produzir outras matérias que requerem hidrogénio verde e que têm maior valor acrescentado, como o aço e o amoníaco verde - elementos-base da indústria automóvel e dos fertilizantes, respetivamente. Conseguir que o país seja líder nestas matérias-primas verdes é um passo importante para revitalizar a indústria, tornando-nos competitivos relativamente outros países historicamente mais industrializados.
Já no caso das baterias "o ‘know-how’ da indústria, aliado a mão de obra competitiva e infraestrutura de exportação sólida, dá a Portugal as condições ideais para atrair a produção de veículos elétricos em escala". Tendo em conta que o Global Energy Perspective estima que até 2030 a procura de baterias de lítio aumente três vezes, Portugal teria um papel importante nesta indústria. Pelo que Maria João Ribeirinho considera que desenvolver uma cadeia local de baterias é, não só uma oportunidade considerável, como também potenciará a indústria automóvel do futuro. "Este é o momento de "jogar ao ataque" e apontar à captura de valor, pois a janela temporal desta oportunidade não é infinita: se não atuarmos, outros ganharão", afirma.