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O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, mostrou-se satisfeito com o acordo para um Quadro Global para Biodiversidade, assinado por mais de 190 países nesta segunda-feira, no encerramento da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para a Diversidade Biológica (COP15), em Montreal, no Canadá. "Estamos finalmente a começar a forjar um pacto de paz com a natureza. Este Quadro é um passo importante para uma diplomacia determinada e exorto todos os países a cumpri-lo", referiu no seu último discurso público do ano, ontem, em Nova Iorque.
Num discurso em que discorreu sobre os inúmeros desafios que o mundo enfrentou em 2022, Guterres sublinhou que, no combate às alterações climáticas, "ainda estamos a avançar na direção errada", com "o fosso global das emissões a crescer". O secretário-geral alertou que sem maior cooperação e solidariedade para com os países em vias de desenvolvimento e uma ação mais firme para travar as emissões de CO2 "o objetivo de 1,5 graus em breve desaparecerá".
Desta feita, António Guterres anunciou a realização da Cimeira da Ambição Climática em setembro de 2023, apelando a todos os líderes para que se mobilizem, nomeadamente, governos, empresas, cidades e regiões, sociedade civil e finanças. "A Cimeira da Ambição Climática será convocada juntamente com uma reunião crucial de líderes mundiais para acelerar a ação a meio caminho dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Estou mais determinado do que nunca em fazer de 2023 um ano para a paz, um ano para a ação", referiu.
Quanto ao Quadro Global para Biodiversidade (QGB) assinado na COP15, este visa proteger 30% do planeta até 2030 e libertar 30 mil milhões de dólares (cerca de 28 mil milhões de euros) em ajuda anual à conservação para os países em desenvolvimento.
Considerado um acordo histórico, equiparado ao alcance do Acordo de Paris, o Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal procura colocar a humanidade no caminho certo, com a visão de "viver em harmonia com a natureza" em 2050. Integra quatro metas de longo prazo (2050) e 23 metas de ação urgente já para 2030.
Os signatários esperam que deixe de haver até 2050 a extinção de espécies associadas à atividade humana; que diminua em 10 vezes o risco de colocar em perigo ou extinção de espécies; e que se aumente a abundância de espécies selvagens nativas, entre outras metas.
Para 2030, algumas das metas a alcançar são garantir que pelo menos 30 por cento das áreas terrestres, águas interiores e costeiras e marinhas sejam conservadas e geridas; restaurar pelo menos 30% das áreas degradadas de ecossistemas terrestres, de águas interiores e costeiras e marinhas; eliminar ou mitigar os impactos de espécies exóticas invasoras; reduzir os riscos de poluição para níveis que não sejam prejudiciais à biodiversidade e às funções e serviços dos ecossistemas, etc.
As associações ambientalistas mostram-se satisfeitas por se ter alcançado um acordo para proteger a biodiversidade, mas destacam algumas lacunas. Para a ZERO, trata-se de "uma grande vitória para o planeta". A associação ambientalista sublinha que "apesar da falta de consenso num conjunto de metas relevantes inicialmente previstas para 2050 e do grau de ambição ser limitado em diversos objetivos, ter-se chegado a um acordo envolvendo também a criação de um Fundo Quadro Global para a Biodiversidade é um avanço extremamente significativo".
Para a ZERO, é fundamental que as decisões agora tomadas à escala global tenham um reflexo em todas as políticas nacionais, e em particular no domínio da conservação da natureza. "É preciso atingir-se antes de 2030 a classificação de 30 por cento de áreas terrestres e de áreas marinhas, assumir uma maior urgência nos planos de gestão das Zona Especiais de Conservação ao abrigo da legislação europeia, garantir que não há subsídios que promovam a destruição da biodiversidade, assegurar medidas de controlo e erradicação de espécies invasoras, dando-se também destaque a uma maior comunicação junto das populações da relevância da biodiversidade, integrando-as nos processos de decisão", defende em comunicado.
Apesar da lista de metas "fortemente positivas", a Liga para a Proteção da Natureza (LPN) manifesta uma grande preocupação com o QGB, "não ao nível dos princípios que estabelece, que são muito meritórios, mas da sua aplicação". Isto porque as versões preliminares do documento incluíam objetivos explícitos e quantitativos para a implementação das várias metas, que foram caindo durante o processo negocial, enfraquecendo o documento.
"Perdeu-se assim o sentido de urgência que levou ao lançamento do QGB e passou a ser fácil arrastar a implementação do acordo", refere em comunicado. A título de exemplo, explica, "o texto proposto indicava que a área de ecossistemas naturais ameaçados deveria crescer pelo menos 5% até 2030 e 15-20% até 2050, mas o texto aprovado indica apenas que a área deve crescer de forma substancial, sem definir o que considera substancial".
Também no caso dos 30% do território do planeta a proteger se manteve uma ambiguidade sobre as exigências mínimas para que uma área possa ser incluída nessa meta, refere a LPN. "Há assim um grave risco de que alguns países procurem contribuir para a meta através da inclusão de falsas áreas de proteção", realça a LPN.