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As energias renováveis eólicas oceânicas poderão ter impactos negativos nas populações, habitats e rotas migratórias de centenas de milhares de aves marinhas, nomeadamente em 34 espécies de aves marinhas na costa continental portuguesa.
O alerta é da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), que em colaboração com o cE3c e a Fundação Oceano Azul apresentou os primeiros resultados do estudo sobre o impacto do licenciamento de energia renovável oceânica (offshore) em larga escala, previsto acontecer em Portugal ao longo dos próximos anos, nas populações de fauna marinha e em especial nas aves marinhas.
Desta feita, estas organizações alertam que a descarbonização não deve ser conseguida à custa da perda de biodiversidade e apelam à mobilização de conhecimento técnico-científico antes do avanço dos projetos previstos para as costas de Viana do Castelo, Leixões, Figueira da Foz, Ericeira e Sines.
"A agenda da descarbonização é fundamental para o futuro do planeta e de Portugal, sendo os parques eólicos importantes para essa agenda, mas é fundamental cumpri-la de uma forma correta, não cometendo erros que possam levar a problemas numa outra agenda tão ou mais importante, que é a da proteção e recuperação da biodiversidade", alerta Emanuel Gonçalves, coordenador científico e administrador da Fundação Oceano Azul, acrescentando que "há uma oportunidade única neste momento de fazermos o correto; as eólicas 'offshore' têm a natureza de ocupação industrial do espaço oceânico, e tal deve ser feito com regras e conhecimento, para que a agenda da biodiversidade não se subordine à agenda da descarbonização".
Este exercício de mapeamento avaliou a sensibilidade de 34 espécies de aves marinhas às localizações previstas para a energia eólica "offshore", com base nas suas características ecológicas e comportamentais, evidenciando um forte aumento da sensibilidade de acordo com a distância à costa e às colónias de nidificação. O estudo aponta as áreas propostas de Viana do Castelo Norte, Viana do Castelo Sul e Ericeira como as áreas onde os impactos devem ser considerados e a localização e/ou delimitação destas áreas revista.
Tendo o Governo identificado cinco áreas na costa continental portuguesa para o desenvolvimento da indústria de energias renováveis no mar em larga escala, as organizações consideram que é fundamental que se debata, analise e estude os potenciais impactos e as zonas preferenciais para a sua instalação.
No caso da Ericeira, a zona proposta sobrepõe-se à estudada na Expedição Científica Oceano Azul Cascais Mafra Sintra, realizada em outubro de 2022, cujo objetivo foi o levantamento de valores naturais, com vista a uma futura proposta da criação da Área Marinha Protegida de Iniciativa Comunitária (AMPIC) de Cascais, Mafra e Sintra, área essa com valores naturais únicos apontados no relatório desta expedição, que será apresentado até ao final do ano.
No caso particular desta área, a mesma situa-se anexa a duas Zonas de Proteção Especial, e em habitat utilizado como zona de alimentação da população nidificante de cagarras nas ilhas Berlengas, alertam as organizações.
Domingos Leitão, diretor executivo da SPEA, refere que "sendo o espaço marítimo português e os seus recursos naturais património de todos os portugueses, é imperativo que este processo seja transparente, claro e ambicioso no que diz respeito ao envolvimento da sociedade no mesmo", lembrando ainda que "é de extrema importância acautelar desde já impactos futuros para as aves marinhas, começando por evitar as zonas identificadas como sendo ecologicamente mais sensíveis".
As aves marinhas e costeiras são um dos grupos de animais mais ameaçados do mundo devido a impactos humanos como as capturas acidentais por artes de pesca e a poluição. São o grupo mais afetado pela expansão dos parques eólicos marinhos devido às colisões com as pás das turbinas ou ao efeito barreira criado pelos parques eólicos e sobretudo à perda de habitat que necessariamente acontecerá pela exploração de vastas áreas marinhas.
Estando o Governo prestes a tomar uma decisão sobre estas áreas, estas organizações consideram que é fundamental mobilizar a melhor informação técnico-científica que sirva de base para esta decisão. "Neste momento, Portugal não tem ainda um mapa claro das áreas prioritárias para a conservação marinha, que é fundamental para atingir os objetivos a que o país se propôs na agenda da biodiversidade, na convenção da diversidade biológica ou na proteção de 30% do seu mar até 2030", destacam em comunicado.
Após os resultados do mapeamento de sensibilidade das aves e biodiversidade marinha à energia eólica no mar terem sido tornados públicos, a Direção Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos apresentará um Plano de Afetação, que incluirá, entre outros elementos, uma proposta final de áreas especializadas para implantação de projetos de energias renováveis offshore, bem como o relatório da Avaliação Ambiental Estratégica efetuada. Este Plano de Afetação será sujeito ao processo de consulta pública, brevemente. "Existe a ambição política de que o leilão das áreas definidas avance antes do final de 2023 e é fundamental que haja mobilização de conhecimento técnico-científico antes do avanço do projeto", defendem as organizações promotoras do estudo.