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O plano Lego

O Governo, pela mão do secretário de Estado das Infra-estruturas e Transportes, Sérgio Monteiro, tem andado numa campanha eleitoral antecipada, com a bandeira da política de Fomento.

 

Um comboio para aqui, uma pequena estrada para ali, um porto mais além, um aeroporto acolá. É tão reconfortante como brincar com uns Legos. Porque dá a sensação de omnipotência. Tudo é possível, desde que as peças encaixem. O problema é quando faltam peças essenciais.

 

Neste caso, as peças que faltam neste brinquedo são aquelas que, nas obras públicas, maior risco de despesismo comportam: taxas de rentabilidade dos parceiros privados, por um lado, e litigância, por outro.

 

No caso das taxas de rentabilidade implícitas nos projectos de obras públicas, este Governo, em especial este secretário de Estado, é talvez a pessoa mais habilitada para tomar decisões. Não só porque esteve na elaboração de vários contratos de parcerias público-privadas (PPP), mas sobretudo porque conhece em detalhe os equilíbrios de forças exigidos para "corrigir" esses contratos.

 

A actual experiência deste governante tem sido dominada por permanentes e complexas negociações no sentido de reduzir os encargos do Estado com anteriores PPP. Sérgio Monteiro tem procurado executar essa tarefa, sendo que as rentabilidades são o ponto central dessas negociações. Como tal, Sérgio Monteiro sabe exactamente qual é a taxa de rentabilidade mais "justa" em praticamente todos os contratos de infra-estruturas em curso. Por exemplo, há PPP rodoviárias com taxas de rentabilidade médias de 14%, quando as negociações já apalavradas estão a reduzi-las para 8%.

 

Já a litigância decorre de problemas de execução tão diversos como as autorizações ambientais ou os efeitos destruidores das constantes mudanças de estratégia económica ou simplesmente de Governo. Os tribunais estão cheios de pedidos de reequilíbrios financeiros de contratos antigos que superam já os três mil milhões de euros.

 

É, pois, um exercício de mera propaganda eleitoral definir 59 projectos estratégicos, sem adequá-los à realidade. E essa realidade passaria por definir - ainda que de forma indicativa, apenas como princípios para contratos futuros - os riscos potenciais de litigância de cada um e, mais importante, as taxas de rentabilidade adequadas do ponto de vista do concedente (Estado), dada a experiência e os alertas acumulados nos últimos anos.

 

Não fazê-lo, é como construir Legos, de facto. As peças até podem ficar muito bonitas umas em cima das outras, com cores garridas adequadas a cada sector. Mas quando se tentar encaixá-las, as dificuldades práticas das PPP vão desencadear o instinto político de mandar tudo abaixo e empilhá-las outra vez, num exercício fútil que trata as obras públicas como um jogo para manter as crianças ocupadas enquanto os adultos planeiam estratégias eleitorais. 

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