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02 de Junho de 2017 às 00:01

Um país acima das nossas possibilidades

Está o caldo entornado no Alojamento Local. Em plena euforia do Airbnb, que promete fazer de cada proprietário um empresário da hotelaria, o PS vem meter um pauzinho que ameaça emperrar a máquina.

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Esta ideia de obrigar a que haja autorização do condomínio para que um apartamento possa ser arrendado a turistas não é particularmente feliz. Tem vários problemas: restringe um direito real de um para proteger a eventual violação do direito de outros; torna o Alojamento Local um exclusivo dos grandes investidores, aqueles que têm dinheiro para ter prédios inteiros; parece ignorar que já há regras para evitar abusos (as casas têm de estar licenciadas para tal e há a lei do ruído, por exemplo); e ameaça o rendimento de muitos portugueses que, com esta actividade, recuperaram um sustento.

E, no fundo, coloca mais uma vez o Estado a meter o bedelho numa actividade que o mercado está a fazer funcionar com sucesso, o que é normalmente um mau princípio que dá péssimos resultados.

Acontece que, neste caso, o Estado tem que meter o bedelho. Tem o dever de, responsavelmente, produzir políticas públicas que guiem o mercado, tendo em atenção todos os interesses em causa, que são muitas vezes contraditórios e até merecem protecção semelhante.

A discussão tem sido turvada porque tem sido incluída em blocos maiores e mais abstractos. O lado "bom" da discussão é a favor da liberalização total do Alojamento Local; das massacrantes obras modernaças de Fernando Medina, com um coreto em cada esquina; de cidades de catálogo desenhadas para os turistas. O lado "mau", que não consegue não soar reaccionário, quer os turistas nos hotéis; quer mais estacionamento para os automóveis e menos ciclovias vazias; quer correr com os turistas porque estes descaracterizam as cidades castiças que nós adoramos. Mas a vida não é a preto e branco, e não é preciso dividirmos o mundo entre quem está do lado do progresso e de quem está do lado do conservadorismo passado.

O turismo é bom, sim. É óptimo. Cria empregos, paga impostos e eleva a nossa autoestima. Mas querer regular os efeitos do turismo não é ser anti-turismo. Alertar para o deboche que tem sido a evolução dos preços do imobiliário (compra e arrendamento) em Lisboa não é querer afugentar os turistas. É perceber que há problemas que a mão invisível do mercado, só por si, não resolve.

A proposta do PS tem falhas. Mas torna inevitável que se discuta o que quer o Estado fazer - não perante o Alojamento Local - mas perante os efeitos colaterais que a sua explosão provoca (como provocou em muitas cidades mundiais).

Na habitação - e já começa a ver-se também na restauração - Portugal começa a ficar um país acima das possibilidades dos portugueses. A ideia é simplesmente não fazer nada acerca disso?
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