Opinião
Novo Banco, velhos hábitos
O Banco de Portugal, altaneiro na sua torre, contempla com indiferença a plebe que se move na muralha circundante. O Banco de Portugal tem tempos próprios, as suas prioridades absolutas e um método para comunicar as suas decisões que escapa ao comum dos mortais.
Foi por isso que o Banco de Portugal considerou que só estavam reunidas condições para comunicar a sua decisão sobre o Novo Banco às 23:45 de quarta-feira, no limite do prazo, mas bem a tempo de dizer que o cumpriu. Para o Banco de Portugal, ao que parece, o primado de divulgar informação em tempo útil é uma esquisitice dos jornalistas, até porque para os portugueses é indiferente terem a informação às 23:45 ou às 21:00.
Este é um velho hábito disseminado pelos decisores nacionais, sejam eles públicos ou privados. A estratégia é básica. Se as notícias são boas, divulgam-se as mesmas à hora dos telejornais, o pináculo das audiências. Se são más ou complexas, aguarda-se pelo fim do dia, para que sejam engolidas pela calada da noite e para que, no dia seguinte, já pareçam uma notícia do dia anterior. O Banco de Portugal, os governos e as empresas são useiros e vezeiros nestas práticas e depois, com candura, queixam-se da desconfiança da opinião pública, dos eleitores, dos investidores e, claro está, dos jornalistas, que se excitam com as más notícias e reagem com indiferença às boas.
Estes velhos hábitos de opacidade lançam o descrédito, mas ninguém parece preocupado. Um exemplo. Lembra-se da auditoria forense à CGD aprovada a 20 de Junho de 2016 no Parlamento? Soube-se ontem que a 19 de Novembro, ou seja, cinco meses depois, o ministro das Finanças solicitou a realização da dita à administração da Caixa e que esta pediu ao Banco de Portugal para que desencadeasse o processo. E qual o ponto da situação? "A auditoria não está em curso. Está o processo de lançamento", explicou quarta-feira no Parlamento o ex-presidente da instituição, António Domingues.
Ou seja, enquanto a turba se deliciava com a declaração de rendimentos de Domingues, não se mexeu uma palha para tentar perceber as razões que forçaram a necessidade de um plano de recapitalização da Caixa.
Nas suas torres de marfim, sobranceiros, os decisores acham que estes são assuntos demasiado importantes e sofisticados para que a plebe os possa conhecer e escrutinar. E assim vai Portugal, a maior parte das vezes mal.