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10 de Maio de 2016 às 20:30

Deve o Reino Unido abandonar a UE?

O Reino Unido está profundamente ligado pelo comércio ao resto da UE, que representa a maior fatia do total das exportações e importações britânicas, com cada uma a corresponder a cerca de 30% do produto interno bruto (PIB) britânico.

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No 400º ano desde a morte de William Shakespeare, o Reino Unido enfrenta uma questão existencial: Ser ou não ser "europeu". Quando os britânicos votarem em Junho sobre a permanência na União Europeia (UE), fazer a escolha acertada vai requerer que cortem a direito a hipérbole apresentada por cada um dos lados e que considerem cuidadosamente o que o chamado "Brexit" irá verdadeiramente significar para o seu país.

 

As questões principais que vão moldar a decisão dos eleitores referem-se a relações comerciais, regulação e orçamento; política externa e segurança; e questões de política doméstica tais como assistência-social e imigração. Depois há questões relacionadas com benefícios substantivos e emocionais e a bagagem decorrente da pertença à UE, com todas as suas regras, regulamentos e burocracia. A escolha é difícil, mas as perguntas em questão não são todas preto ou branco.

 

O Reino Unido está profundamente ligado pelo comércio ao resto da UE, que representa a maior fatia do total das exportações e importações britânicas, com cada uma a corresponder a cerca de 30% do produto interno bruto (PIB) britânico. O Brexit teria portanto consequências significativas para os fluxos comerciais, não apenas entre o Reino Unido e a UE, mas também em relação ao resto do mundo. Quais seriam essas consequências depende dos termos e timing de novos acordos comerciais.

 

Quando a predecessora da UE, a Comunidade Económica Europeia, foi criada em 1957, ligava apenas seis países (Bélgica, Luxemburgo, Holanda, França, Itália e Alemanha). Tendo em conta as elevadas tarifas aduaneiras dessa altura, a CEE trouxe ganhos substanciais. Hoje, a UE tem 28 membros e é o maior mercado mundial, mas as tarifas estão genericamente muito mais baixas.

 

A verdade é que, nesta altura, é impossível saber como é que se iriam reestruturar as relações comerciais Reino Unido-UE depois do Brexit. Afinal não existe um verdadeiro precedente – a saída da Gronelândia da CEE é uma situação dificilmente comparável – e somente a negociação dos detalhes do abandono poderia levar até dois anos. Durante esse período de tempo, a libra tornar-se-ia mais volátil, os fluxos comerciais poderiam ser redireccionados ou adiados e algum investimento na indústria britânica ligada a bens transaccionáveis poderia ser posto em espera.

 

O Reino Unido pode emergir de tal processo numa situação similar à da Noruega: um membro do Espaço Económico Europeu (EEE) que paga a maior parte dos custos regulares de pertença à UE para assegurar a maioria dos mesmos privilégios comerciais. Ou poderá ser como a Suíça, que depende de acordos comerciais bilaterais, enquanto paga para ser parte do mercado único de bens mas não de serviços. Outra possibilidade seria apresentar-se de forma independente perante a Organização Mundial do Comércio (OMC). Ou o Reino Unido poderia criar um inteiramente novo modelo para si próprio. Em qualquer dos casos, seriam inevitáveis novos acordos comerciais com países não-membros da EU.

 

O Reino Unido precisaria também de prestar atenção especial à manutenção do papel da City londrina enquanto centro financeiro global - um estatuto que poderia ficar debilitado com um acordo parecido ao da Suíça, com o comércio britânico nos serviços financeiros com o mercado único a poder desabar. E pagar para continuar a beneficiar de preferências comerciais poderia expor o Reino Unido a futuras mudanças políticas da UE. Por exemplo, se a UE usar subsídios financeiros futuros para apoiar países periféricos altamente endividados, o orçamento britânico poderia também ser afectado. Em breve, perante um evento de Brexit, o Reino Unido poderá ter de tomar algumas decisões sobre comércio muito difíceis.

 

Mas o comércio é apenas o começo. O referendo sobre o Brexit terá também repercussões políticas, particularmente se o Partido Conservador se dividir sobre esta matéria – uma possibilidade a considerar independentemente do resultado. O que é que isso significaria para o futuro das políticas económicas do Reino Unido? Como é que isso afectaria a capacidade da economia britânica ou o orçamento de defesa do país?

 

Em matéria de política externa e de segurança, os britânicos não tiveram grandes impedimentos por parte da lenta e pesada UE. Enquanto a UE impôs sanções à Síria, o Parlamento britânico votou contra qualquer envolvimento militar naquele país. O serviço de inteligência britânico está, para todos os efeitos, muito à frente da maioria dos parceiros da UE e trabalha proximamente com os Estados Unidos. Num cenário de Brexit, os laços da inteligência britânica com os Estados Unidos tenderiam a tornar-se ainda mais fortes, apesar de quaisquer novas limitações no seu acesso a serviços de inteligência de outros países-membros da UE.

 

A única área em que esta questão não surge tão confusa, pelo menos da perspectiva britânica, é o euro, a que o Reino Unido nunca aderiu. (Eu aconselhei a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher a não integrar o predecessor da Zona Euro, a União Económica e Monetária.) Essa foi a escolha correcta, já que permitiu ao Reino Unido manter total autoridade sobre políticas monetárias e, com isso, a possibilidade de usar a taxa cambial de forma a absorver choques quando o auge e quebra domésticas não estivessem sincronizadas com o resto da Europa.

 

Da perspectiva da UE, perder o Reino Unido poderia representar um sério golpe, forçando a União a dar menos aos seus membros e com um custo mais elevado. Ao tornar mais fácil a outros países insistir nas suas excepções especiais – por exemplo, face aos "critérios" estabelecidos pelo Tratado de Maastricht sobre défice e dívida – o Brexit poderia apresentar sérios problemas para a evolução futura da UE. Actualmente, os membros da UE – especialmente os países da Zona Euro – têm evitado acções concretas para resolver as suas crises interdependentes económica, social, financeira, de dívida e monetária.

 

Enquanto tanto proponentes como oponentes do Brexit exageram nas suas alegações, uma revisão dos factos sugere que dizer não ao Brexit seria a melhor opção também para o Reino Unido. Se não gosta da forma como a UE – e a Comissão Europeia – tem evoluído, pode tentar renegociar os seus termos de adesão, tal como o primeiro-ministro, David Cameron, fez em Fevereiro, ou abandoná-la.

 

Mas se o Reino Unido sair agora, as suas opções tornam-se severamente limitadas. Em particular, futuras alterações na sua relação com a UE, em especial uma futura reentrada, se desejável, seria difícil de negociar (possivelmente e especialmente tendo em conta o desejo dos líderes europeus de deter outros Estados-membros de seguir o exemplo do Reino Unido). Na verdade, pode acarretar piores condições do que aquelas que Cameron conseguiu para o país no caso de permanecer na UE.

 

Michael J. Boskin, professor de Economia na Universidade de Stanford e membro sénior da Hoover Institution, foi presidente do Conselho de Assessores Económicos do presidente George H. W. Bush entre 1989 e 1993.

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org 

Tradução: David Santiago

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