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03 de Fevereiro de 2014 às 20:21

Alemanha: o próximo "downgrade"?

A 5 de Dezembro, os holandeses celebram o Sinterklaas, um feriado tradicional de Inverno, comemorado com a preparação de surpresas. Mas, este ano, a celebração ficou marcada por uma surpresa que ninguém queria: alguns dias antes, a agência de notação financeira Standard & Poor’s (S&P) retirou ao país o "rating" de triplo A.

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O governo holandês reagiu a este corte tal como a França quando perdeu o seu triplo A, há cerca de dois anos. Não há motivos para alarme, apontaram as autoridades francesas, porque as duas outras agências de “rating” - a Moody’s e a Fitch - mantêm o “rating” da dívida soberana da França no nível mais elevado. Mas, no início de 2013, a Moody’s e a Fitch retiraram à França a classificação de triplo A e a S&P voltou a cortar a notação do país.

 

De facto, a Holanda tem muitos motivos para se preocupar – especialmente dado que, aparentemente, está a fazer tudo bem. Quando a notação da França foi cortada, a sua dívida pública superava os 90% do PIB e o governo tinha tornado claro que não ia arriscar o crescimento económico a curto prazo para abordar a questão do défice orçamental. A Holanda, por outro lado, tem um rácio de dívida pública face ao PIB de 74% e está comprometida em reduzir este valor ainda mais.

 

Isto deveria preocupar seriamente as economias mais importantes da União Monetária – a Alemanha – que, tal como a Finlândia, é agora um dos únicos países da Zona Euro a manterem o “rating” de triplo A com a S&P. (O Luxemburgo também tem o nível mais elevado, em termos da notação, mas o seu grande sector financeiro torna o Luxemburgo num caso único).

 

As economias da Alemanha e da Holanda estão ligadas de forma muito próxima, sendo que a economia holandesa está amplamente dependente da economia germânica. Durante décadas, a política monetária da Holanda tinha por base ir de encontro às taxas de juro alemães bem como, manter a taxa de câmbio estável entre o florim holandês e o marco alemão.

 

De igual forma, os dois países têm o défice e a dívida pública num nível baixo, com a Holanda a ser, há muito, o aliado europeu mais próximo da Alemanha em termos orçamentais, económicos e monetários. De facto, a Alemanha e a Holanda estiverem entre os principais promotores do Pacto de Estabilidade e Crescimento da União Europeia.

 

A dívida pública germânica é mais elevada do que a holandesa, em especial, tendo em consideração que a Holanda tem reservas de gás natural que representam mais de 20% do PIB e o fundo de pensões têm poupanças de cerca de um bilião de euros, ou aproximadamente 140% do PIB. Ainda que a situação orçamental da Alemanha seja, actualmente, mais saudável que a da Holanda, devido ao seu desempenho económico excepcional desde que começou a crise, a produção germânica titubeante ameaça enfraquece-la consideravelmente.

 

A S&P citou o enfraquecimento das perspectivas de crescimento como o motivo para cortar o “rating” da Holanda. A economia holandesa contraiu 1,2% em 2013 e é esperado que cresça apenas 0,5% em 2014. Mas as perspectivas não são muito melhores para a Alemanha. Apesar do Banco Central da Alemanha estimar que, em 2014, a economia cresça 1,8%, este número é muito incerto. E, a médio prazo, a Alemanha vai ter mais desafios para enfrentar, em termos de envelhecimento da população, que a Holanda.

 

Outro factor potencialmente destabilizador é custo de salvar o euro, que pode disparar se a crise agravar-se mais. Uma vez que a Alemanha e a Holanda deram elevadas garantias, os dois países arriscam-se a enfrentar um aumento substancial da sua dívida pública.

 

Além disso, a política alemães está a entrar numa nova fase, com a grande coligação de Democratas Cristãos e de Sociais Democratas preparada para governar o país durante os próximos quatro anos. Enquanto a maioria dos alemães apoiam o novo governo, e outros países consideraram-no como uma bênção para a Europa, há o risco que as divergências dos dois partidos sobre a forma de solucionar os problemas na Zona Euro possa causar algum atrito. Por exemplo, os Sociais Democratas apoiam a implementação de Eurobond, um tema ao qual os Democratas Cristãos se opõe com veemência.

 

De forma mais ampla, o beneficio potencial desta coligação – que tem um forte apoio no parlamento – pode nunca se concretizar, com as posições conflituosas dos dois partidos a travarem a implementação de reformas significativas. E as reformas que estão em curso, tal como a planeada introdução do salário mínimo, podem debilitar o desempenho económico.

 

Dado que as perspectivas económicas de médio-longo prazo são semelhantes para a Holanda, a Alemanha devia ver o corte no "rating" da Holanda como um alerta: o seu "rating" de triplo A está longo de estar seguro. De facto, com a eficácia política da Alemanha em risco bem como, o momento económico e a posição orçamental, um corte de “rating” pode bem ser uma questão de tempo. 

 

Sylvester Eijffinger é Professor de Economia Financeira na Tilburg University" na Holanda. Edin Mujagic é um economista ligado à area monetária da Tilburg University.

 

Copyright: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

Tradução: Ana Laranjeiro

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