Opinião
Um ano à beira do desastre
O ano de 2012 acabou por ser tão mau como eu esperava. A recessão na Europa foi a consequência previsível e (prevista) das políticas de austeridade e de um enquadramento do euro condenado a falhar.
A recuperação anémica dos Estados Unidos – com o crescimento a ser praticamente insuficiente para criar postos de trabalho para quem está agora a entrar na força laboral - foi a consequência previsível e (prevista) do impasse político, que impediu a promulgação do projecto Lei sobre o emprego proposto por Barack Obama e que atirou a economia para o "precipício orçamental".
As duas principais surpresas de 2012 foram o abrandamento dos mercados emergentes, que foi ligeiramente mais acentuado e mais alargado do que o previsto, e as reforma notáveis adoptadas na Europa – apesar de ainda estarem longe do que é necessário.
Os chineses entendem, correctamente, que devem focar-se na "qualidade" do crescimento – reequilibrando a sua economia das exportações para o consumo doméstico – e não apenas na produção. Mas, apesar desta mudança, e das condições adversas da economia global, o crescimento de 7% deverá manter os preços das matérias-primas, beneficiando assim as exportações de África e da América Latina. Uma terceira ronda de "quantitative easing" por parte da Reserva Federal dos Estados Unidos poderá ajudar, também, os exportadores de matérias-primas, mesmo que tenha pouco impacto no crescimento interno dos Estados Unidos.
A economia dos Estados Unidos, com Barack Obama reeleito, deverá continuar a arrastar-se, tal como aconteceu nos últimos quatro anos. Os indícios de recuperação no mercado imobiliário serão suficientes para desencorajar importantes medidas políticas, como uma redução do valor das hipotecas "underwater" (em que a parte do empréstimo que falta pagar excede o valor de mercado da casa). Mas como o valor real das casas (ajustado à inflação) continua 40% abaixo do anterior pico, é pouco provável que ocorra uma forte recuperação no sector imobiliário (e na indústria da construção).
Entretanto, mesmo que os opositores republicanos de Barack Obama não arrastem o país para o precipício orçamental de aumento automático dos impostos e corte das despesas a 1 de Janeiro de 2013, irão garantir que as suaves medidas de austeridade vão continuar. O emprego no sector público está, actualmente, 600 mil abaixo do nível pré-crise – uma expansão normal implicaria 1,2 milhões de postos de trabalho adicionais. Significa isto, que o défice de postos de trabalho no sector público é de aproximadamente dois milhões.
Mas o verdadeiro risco da economia global está na Europa. Espanha e Grécia estão a atravessar uma depressão, sem sinais de recuperação. O "fiscal compact" da Zona Euro não é solução e as compras de dívida soberana por parte do Banco Central Europeu (BCE) são, no máximo, um paliativo temporário. Se o BCE impuser mais condições de austeridade (como parece que poderá ocorrer na Grécia e em Espanha) em troca de mais financiamento, a cura vai apenas piorar a condição do doente.
Da mesma forma, uma supervisão bancária comum na Europa não é suficiente para evitar a saída de fundos dos países com problemas. Isso exige um programa comum de garantia de depósitos, que o Norte da Europa já avisou que não está nos seus objectivos de curto prazo. Apesar dos líderes europeus terem, repetidamente, feito o que anteriormente era impensável, as suas respostas não têm estado sintonizadas com os mercados. Os líderes europeus têm, constantemente, subestimado os efeitos adversos dos seus programas de austeridade e sobrestimado os benefícios dos seus ajustamentos institucionais.
O impacto da operação de refinanciamento de longo prazo do BCE (LTRO) – no valor de 1 bilião de euros -, que empresta dinheiro aos bancos comerciais para que estes comprem obrigações soberanas (uma operação que parece tão peculiar como o financiamento soberano do BCE para apoiar os bancos), foi de curta duração. Os líderes europeus já reconheceram que a crise da dívida nos países da periferia só vai piorar com a falta de crescimento económico e até já reconheceram (algumas vezes) que a austeridade não ajuda a resolver esta questão. Ainda assim, não conseguiram apresentar um pacote de crescimento eficaz.
A depressão que as autoridades europeias impuseram a Espanha e à Grécia já está a ter consequências políticas. Em Espanha, os movimentos independentistas, em particular na Catalunha, renasceram, enquanto o neo-nazismo está em marcha na Grécia. O euro, criado com o reconhecido objectivo de fomentar a integração de uma Europa democrática, está a ter, precisamente, o efeito contrário.
A lição que podemos tirar daqui é que a política e a economia são inseparáveis. Os mercados, por si só, não são nem eficientes nem estáveis. Mas a política de desregulação deu espaço a excessos sem precedentes que levaram a bolhas de activos e à crise que se seguiu ao seu colapso.
A política da crise levou a respostas que estão longe de serem as adequadas. Os bancos foram salvos mas os problemas de base continuaram a agravar-se – sem surpresa, já que tanto na Europa como nos Estados Unidos, a tarefa de resolver os problemas foi atribuída aos políticos que os causaram. Na Europa, foi a política e não a economia, que levou à criação do euro. Foi a política que criou uma estrutura imperfeita, que mais tarde deu espaço a bolhas mas pouca margem de manobra para lidar com as consequências.
Prever 2013 é prever como é que um governo norte-americano dividido e uma Europa dividida respondem às suas respectivas crises. As bolas de cristal dos economistas estão sempre nubladas, mas as dos cientistas políticos estão ainda mais nubladas. Dito isto, a economia dos Estados Unidos vai, provavelmente, continuar a arrastar-se durante mais um ano; nem será atirada do precipício nem será colocada no caminho da recuperação sustentável. Mas, dos dois lados do Atlântico, a polarização da política da intimidação e da provocação estarão em evidência. O problema com a política da provocação é que, às vezes, alguém fica à beira do desastre.
Tradução: Ana Luísa Marques