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22 de Fevereiro de 2013 às 12:52

Austeridade em pequenos locais

O interesse nas políticas económicas de países pequenos está, normalmente, reservada para um reduzido número de especialistas. Mas há momentos em que as experiências dos pequenos países são interpretadas em todo o mundo como a prova de que uma determinada abordagem política funciona melhor que outra.

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Hoje em dia, a Grécia, os estados bálticos e a Islândia são, frequentemente, invocados para os prós e contras em relação à austeridade. Por exemplo, Paul Krugman, o economista laureado com o prémio Nobel, defendeu que o facto de o produto interno bruto (PIB) da Letónia estar ainda 10% abaixo do pico anterior à crise mostra que a abordagem de “austeridade e depressão de salários” não funciona e que a Islândia, que não foi sujeita à austeridade imposta por entidades externas mas desvalorizou a sua moeda, parece estar em melhor forma. Outros, contudo, argumentam que a Estónia seguiu uma austeridade estrita na sequência da crise, evitou uma crise financeira e está agora a crescer de um modo vigoroso, ao passo que a Grécia, que adiou o seu ajustamento orçamental por demasiado tempo, experimentou uma crise profunda e permanece mergulhada na recessão.

 

Ambos os lados nestas disputas costumam omitir as principais características idiossincráticas e as condições de partida específicas que tiram sentido a comparações directas.  

 

Para começar, a Letónia, tal como os restantes Estados bálticos, apresentava um enorme défice da conta corrente quando a crise se iniciou. Isto implica que o nível pré-crise do PIB não era sustentável, já que exigia influxos de capital superiores a 20% do PIB para financiar um consumo gigantesco e uma escalada da construção. Assim, quando os influxos terminaram no início da crise financeira, tornou-se inevitável que o PIB viesse a contrair na ordem das duas casas percentuais. Visto sob este prisma, não é nenhuma surpresa que o PIB da Letónia esteja agora mais de 10% abaixo do pico anterior à crise; no fim de contas, nenhum país consegue apresentar para sempre um défice da conta corrente de 25% do PIB.

 

Qualquer comparação entre os bálticos e a Grande Depressão (ou os Estados Unidos de hoje) não tem sentido. Os Bálticos tiveram de se ajustar a uma abrupta paralisação do financiamento externo. Esse não foi o problema dos EUA durante os anos 30; nem o é actualmente.

Uma melhor forma para analisar o comportamento no pós-crise é olhar para o hiato do produto – ou seja, o PIB efectivo relativamente ao PIB potencial. De acordo com a estimativa da Comissão Europeia, o PIB da Letónia era de quase 14% acima do potencial no pico da bolha, caindo para 10% abaixo do potencial quando essa bolha rebentou. A recuperação foi, contudo, igualmente rápida, com o PIB a regressar ao potencial (embora abaixo do insustentável pico da bolha).

 

O governo da Letónia aumentou os impostos durante o rebentamento da bolha para manter as receitas relativamente constantes no que diz respeito ao seu peso no PIB. Contudo, emergiu um considerável défice orçamental dado que as despesas da segurança social, entre as quais os subsídios de desemprego, dispararam ao mesmo tempo que a procura e o produto entraram em colapso. Com uma recuperação em forma de V, estas despesas caíram mais uma vez, o que reduziu o défice de modo acelerado. A recuperação pode ter sido apenas parcial, porque o nível anterior de produção era insustentável, mas foi a suficiente para permitir que o governo equilibrasse, novamente, as suas contas.

 

Assim, a Letónia apresenta hoje uma posição orçamental sustentável, a crescer e com a produção próxima do seu potencial. A austeridade pode, temporariamente, ter agravado a crise mas conseguiu conduzir a uma sustentabilidade orçamental sem danos permanentes para a economia. Pelo contrário, a produção na Grécia, que tem sido lenta na adopção de medidas de austeridade, continua a cair e está ainda 12% abaixo do potencial estimado.

 

Será que a Islândia constitui um contra-exemplo da Letónia? No final de contas, o seu PIB caiu muito menos, embora apresentasse défices da conta corrente igualmente substanciais antes da crise – e registou défices orçamentais muito maiores por muito mais tempo. Ao contrário da Letónia, a Islândia deixou que a sua moeda, a coroa islandesa, desvalorizasse de forma massiva. No entanto, a desvalorização é muito menos importante do que é normalmente assumido. Enquanto as exportações se comportaram, realmente, muito bem, os principais produtos exportados pela Islândia são recursos naturais (peixe e alumínio), sendo que a procura por estes bens se aguentou bem durante o período pós crise global de 2008.

 

Essa procura sustentada constituiu-se como um importante estabilizador para a economia local, que os estados do Báltico não têm. Na realidade, a Letónia sofreu particularmente com a quebra no comércio global em 2008 e 2009, dada a sua dependência face às exportações. O desempenho económico superior da Islândia não pode ser atribuído à desvalorização da coroa mas mais ao aquecimento global, que levou o arenque mais para Norte, para as águias islandesas.

 

A Islândia também não é o protótipo que prova que evitar a austeridade funciona. Em economias pequenas e abertas, é improvável que défices mais elevados sustentem a produção local porque muitas das despesas adicionais são canalizadas para as importações. Por isso, não é nenhuma surpresa que, apesar da enorme desvalorização, a Islândia continue a apresentar um elevado défice da conta corrente, a somar à sua já considerável dívida externa.

 

Além do mais, o rácio de dívida pública/PIB da Islândia está, actualmente, em 100%, que compara com os 42% da Letónia. Parte desta diferença reflecte, claro, as diferentes condições de partida e o custo dos resgates bancários. Mas não pode haver dúvidas de que, ao manter os défices sob controlo, as finanças públicas da Letónia estão em muito melhor forma nos dias de hoje, sendo que a sustentabilidade da dívida já não é um problema. Pelo contrário, a dívida da Islândia tornou-se tão grande que é provável que venha a limitar o crescimento futuro.

 

É necessário ser prudente quando se tenta retirar lições da experiência de pequenos países que, várias vezes, têm características muito particulares. A única conclusão que se poderá aplicar de forma geral é a de que desprezar a austeridade não faz com que se evite o problema de alcançar tanto a sustentabilidade orçamental como a externa.

 

Daniel Gros é director do Center for European Policy Studies

 

Copyright: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org

Tradução: Diogo Cavaleiro

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