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13 de Junho de 2012 às 23:30

Um guia argentino para a crise grega

Os responsáveis pelas políticas europeias parecem estar surpreendidos com a actual corrida aos depósitos na Grécia (e com a que está a começar em Espanha). Não deveriam. Quem está familiarizado com os colapsos nos mercados emergentes sabe que, depois de uma crise orçamental, quase sempre se segue uma crise financeira.

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Os responsáveis pelas políticas europeias parecem estar surpreendidos com a actual corrida aos depósitos na Grécia (e com a que está a começar em Espanha). Não deveriam. Quem está familiarizado com os colapsos nos mercados emergentes sabe que, depois de uma crise orçamental, quase sempre se segue uma crise financeira.

O ‘default’ (incumprimento) da Argentina em 2001 é um exemplo útil. Na crise argentina, a economia contraiu 18% e o desemprego disparou para os 22% da população activa. A Grécia já está próxima desses níveis.

A Argentina enfrentou um ‘default’ total e caótico na sua dívida pública. Na Grécia, a reestruturação imposta aos credores tem sido gerida pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). No entanto, com uma dívida ainda insustentável, a próxima ronda do ‘default’ grego pode fazer o caso da Argentina parecer positivamente teutónico na sua regularidade.

Na Argentina, a banca esteve próxima do colapso, o que levou o governo a proibir a retirada de dinheiro dos bancos – introduzindo o chamado corralito para os depósitos – e estabelecendo mecanismos de controlo dos movimentos de capitais. Esta parece ser a etapa em que a Grécia está a entrar agora. Assim, se o precedente da Argentina e de outros mercados emergentes é um guia útil, o que se pode esperar da Grécia?

Para responder a essa pergunta é pertinente recordar os circuitos que ligam as crises orçamentais às crises financeiras. Os bancos têm créditos ao governo e às empresas na qualidade de activos. A crise orçamental e a situação de incumprimento reduzem o valor dos primeiros, ao mesmo tempo que a recessão subsequente mina o valor dos segundos.

Esta é a ligação entre os problemas orçamentais e os problemas bancários. Mas existe também uma ligação no sentido inverso: à medida que os bancos procedem à desalavancagem para compensar as perdas, limitam o crédito e a economia contrai, o que faz cair a receita do Estado. Se, e quando, os bancos requerem uma injeção de capital proveniente de fundos públicos, a despesa adicional – que pode ser grande – enfraquece ainda mais as finanças públicas.


Estas forças que se reforçam mutuamente podem resolver-se a si próprias num longo processo de recessão e desalavancagem. Ou então podem levar a uma súbita corrida aos bancos, causando a implosão do sistema financeiro. O resultado depende da confiança.

Os economistas entenderam há muito tempo que, na ausência de um emprestador credível de última instância, os bancos são vulneráveis a crises de confiança. Esse credor pode ser monetário ou fiscal, e na Grécia ambos os tipos estão em dúvida.


Se o acordo grego com a União Europeia e o FMI se quebra, o Banco Central Europeu não vai mais aceitar títulos gregos como garantia. E o Estado grego não tem meios para salvaguardar os seus bancos. Nestas circunstâncias, seria mais surpreendente se os depositantes não corressem para retirar os seus fundos dos bancos gregos.


A experiência argentina sugere que, depois da corrida aos depósitos bancários, o capítulo seguinte da saga é o colapso monetário. Com a receita em queda livre e o crédito cortado, as províncias argentinas tiveram que recorrer à impressão de letras para pagar salários e pensões. A certa altura havia em circulação mais de mais de uma dúzia de "quase-moedas".

O que acontecerá se a Grécia perder o acesso ao crédito da União Europeia e do FMI? Os optimistas assinalam que é suposto o país eliminar o seu défice primário (o Saldo orçamental menos o pagamento de juros) em 2013, o que implica a possibilidade de pagar as suas obrigações não relacionadas com a dívida com os seus próprios recursos depois de um ‘default’.

Mas esta visão sobrestima a capacidade do Estado para arrecadar receitas numa situação de pânico financeiro. Com a economia em queda livre e um clima de incerteza generalizada, muitas famílias e empresas deixam simplesmente de pagar os seus impostos. Assim, mesmo que o governo grego não pague os compromissos relacionados com a dívida, pode não ter alternativa se não imprimir pedaços de papel para cumprir as suas obrigações.

Isso não constituiria um abandono oficial do euro mas, com o tempo, a diferença poderia tornar-se mais formar do que real. A letra ou vale recém-emitido – chamemos-lhe neo-dracma – seria transaccionável e altamente líquido. Mesmo que transaccionado com um grande desconto, como certamente aconteceria, mais tarde ou mais cedo seria utilizado para efectuar todos os tipos de transacções.

Aqui, a história da Argentina sugere que a crise volta a atacar os bancos: em breve as empresas começam a reclamar que os seus rendimentos são agora denominados em neo-dracmas enquanto os seus créditos permanecem denominados em euros, e começam a pressionar insistentemente para que os seus créditos sejam neo-dracmatizados (“pesificados” no jargão da Argentina). Um parlamento ávido da aprovação do público só pode estar ansioso por cumprir estas exigências. No entanto, isto apenas acelera a corrida aos bancos, com as famílias e empresas a perceber que os seus depósitos não estão apoiados em activos sólidos.

Pagar aos trabalhadores do sector público com neo-dracmas desvalorizados implica um corte nos salários reais que recebem. O passo final do processo chega com a neo-dracmatização dos salários do sector privado. As empresas voltam a exigi-lo, alegando que, de outra forma, não poderão exportar. Inicialmente os sindicatos opõem-se, mas eventualmente acabam por ceder, assustados pelo fantasma de um desemprego ainda maior. A promessa de controlos de preços selectivos adoça o acordo.

Quão profunda será a desvalorização do neo-dracma? Na Argentina, o número de pesos necessários para comprar um dólar aumentou mais de 300%. A Grécia registou um défice de conta corrente de quase 10% do PIB em 2011, apesar da depressão económica interna. A desvalorização real necessária para restaurar o equilíbrio externo será enorme, talvez maior do que na Argentina.

A Grécia tem actualmente o seu terceiro governo em menos de um ano, e brevemente terá um quarto. A Argentina teve quatro presidentes em menos de dois anos, antes de a situação política e económica estabilizar. Também a Grécia acabará, eventualmente, por estabilizar. Neste ponto, é praticamente o único precedente de esperança que a história da Argentina conta.

Andrés Velasco, antigo ministro das Finanças do Chile, é professor convidado da Universidade de Columbia.

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2012.
www.project-syndicate.org


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