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UE: protecionismo industrial ou metas ambientais?

Se o objetivo é acelerar a transição para veículos elétricos, restringir a entrada, no mercado europeu, de concorrentes mais acessíveis talvez não seja a melhor abordagem. O sucesso talvez passe, antes, por incentivar uma concorrência saudável que beneficie os consumidores.

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Reacendeu-se o debate sobre o equilíbrio entre o protecionismo industrial, o direito dos consumidores a produtos mais económicos e as sonhadas metas ambientais.

 

A recente aprovação, pela União Europeia (UE), de tarifas especiais sobre veículos elétricos fabricados na China, que poderão chegar aos 45%, surge como forma de combater práticas desleais e de proteger a indústria automóvel europeia. Contudo, é legítimo questionar o seu impacto nos consumidores, bem como na transição energética e na descarbonização.

 

É difícil ignorar que, enquanto a indústria automóvel de combustão era dominada por fabricantes europeus, nunca a UE se preocupou com o facto de estes terem unidades de produção na China, nas mesmas condições que agora condena e que dá como justificação para aplicar tarifas. Onde estavam as câmaras de vigilância da UE quando isso acontecia?

 

As vendas de veículos elétricos na UE têm abrandado o seu ritmo, com o mercado a estagnar e as marcas tradicionais a sofrerem grandes quebras (as vendas de carros elétricos produzidos fora da China tiveram uma queda de 16% desde 2022). Em sentido oposto, os veículos elétricos produzidos na China têm vindo a aumentar as suas vendas na Europa, tendo representado cerca de 19,5% do total de vendas em 2023, perspetivando-se que cheguem aos 25% este ano. Os números traduzem a crescente aceitação que os modelos fabricados na China têm tido na população europeia. E isto deve-se, sobretudo, a baixos preços e reconhecida qualidade, o que salienta a importância que estes modelos oferecem na desejada massificação de veículos elétricos.

 

As recentes decisões da UE passam uma mensagem clara: a sustentabilidade e o meio ambiente parecem não ser prioridade. Com o congelamento da medida que impunha 2035 como o fim da era a combustão e com a imposição de tarifas que, de acordo com o relatório da Oxford Economics, farão aumentar os preços no mercado europeu (onde já custam o dobro do preço praticado na China), a UE sinaliza que continuará a privilegiar o protecionismo da sua indústria em detrimento do fácil acesso dos consumidores a tecnologias mais sustentáveis.

 

Uma vez que algumas marcas chinesas já assumiram que não vão aumentar os preços até ao final do ano, importa perceber o que acontecerá a partir de janeiro de 2025. Isto sem perder de vista que as marcas que mais venderam automóveis elétricos em Portugal no último ano produzem alguns dos seus modelos mais populares na China.

 

Não deixa, por isso, de ser ironicamente paradoxal que, no mesmo dia em que a UE confirmou a aplicação de tarifas sobre os veículos elétricos produzidos na China (decisão que contou com a abstenção de Portugal, como quem diz "não fomos nós"), o governo português tenha anunciado novos incentivos à compra de carros elétricos, subsidiando em 4.000 euros a compra de novas viaturas - desde que tenham um preço máximo de 38.500 euros. Ora, as contas são fáceis de fazer: as tarifas impostas sobre os carros chineses ultrapassarão o benefício dado pelo Estado português, sendo que aquilo que seria, em teoria, uma medida para tornar os carros mais acessíveis, acabará por ser absorvida por outra medida que vai tornar esses mesmos carros ainda mais caros.

 

É evidente que a descarbonização exige esforços globais. No entanto, invariavelmente vemos políticas paliativas que parecem transferir o ónus financeiro para os consumidores, enquanto os governos e as indústrias se adaptam a um novo paradigma. Isto coloca um fardo desproporcional às costas dos cidadãos que, apesar de incentivados a adotar alternativas verdes, podem ter de pagar mais para o fazer. É o mesmo que convidar alguém para uma festa e, no fim, apresentar a conta.

 

Se o objetivo é acelerar a transição para veículos elétricos, restringir a entrada, no mercado europeu, de concorrentes mais acessíveis talvez não seja a melhor abordagem. O sucesso talvez passe, antes, por incentivar uma concorrência saudável que beneficie os consumidores.

 

Sentindo o adversário a fugir no marcador, a Europa pediu um desconto de tempo para se tentar reagrupar. Resta saber quais serão os efeitos dessa estratégia quando soar o apito final.

P.S. Estamos a menos de um mês do COP 29, que este ano acontecerá em Baku.  Estive há um ano no COP 28, no Dubai, onde se refletiram estratégias em relação à mobilidade elétrica.  Vai ser curioso perceber onde se situará o debate em novembro.

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