Opinião
Previsões e Opções Macroeconómicas
Com a publicação do World Economic Outlook (WEO) de Abril pelo FMI na passada quarta-feira iniciou-se o ciclo das previsões macroeconómicas da primavera. Além das previsões propriamente ditas, os textos de avaliação da situação e das políticas económicas
Isso resulta, em primeiro lugar, da importância crescente das interligações entre as diferentes economias incluindo, com especial destaque, as dos países emergentes que, de uma espécie de resíduo cuja inclusão nas previsões era pouco mais do que uma formalidade, se transformaram gradualmente no motor – e na condicionante – do crescimento mundial. Além disso – e, em parte, como consequência dessa evolução –, as análises puramente conjunturais têm vindo a ser complementadas por análises dos factores estruturais que as determinam e que têm de orientar as políticas económicas e as opções dos investidores e dos parceiros sociais que pretendam ter um papel proactivo nas economias em que se inserem.
Tanto no que respeita às previsões como às considerações de política económica, este WEO traz boas notícias para Portugal. No que respeita à economia mundial, embora confirme a já esperada desaceleração do crescimento em 2007, nos Estados Unidos (de 3,3% para 2,2%) e na Zona Euro (de 2,6% para 2,3%), sublinha que, "apesar do recente nervosismo nos mercados financeiros, a economia mundial se mantém numa trajectória de crescimento robusto em 2007/2008, se bem que a um ritmo um pouco mais moderado que em 2006". Não obstante os riscos de curto prazo a que os decisores políticos têm de permanecer atentos, compete a estes "tirar partido do bom desempenho da economia global para intensificarem os esforços destinados a combater os obstáculos estruturais enraizados".
Portugal tem tido, ao longo dos últimos anos, que enfrentar um enorme esforço de reforma estrutural que o crescimento dos anos 90 lhe fez crer ser dispensável, ou poder resumir-se à superfície dos problemas, como foi o caso paradigmático da educação e formação profissional, onde as reformas redundaram em aumentos de gastos sem contrapartida em resultados. Teve de fazê-lo numa conjuntura particularmente desfavorável, tanto no plano interno como externo. Às dificuldades resultantes, a nível interno, da correcção do desequilíbrio orçamental – inicialmente tomada como uma simples questão de cosmética de curto prazo – juntaram-se as de resolver os problemas estruturais postos a nu pela abertura das economias do Leste da Europa e da Ásia. Por si só, esta levou a que a força de trabalho envolvida na produção para o mercado mundial quadruplicasse nas últimas duas décadas. Aliada às transformações tecnológicas que em simultâneo ocorreram, esta evolução teve implicações profundas para as economias mais desenvolvidas, em especial no que respeita a actividades que a tecnologia tornou mais facilmente deslocalizáveis.
Que o esforço empreendido entre nós está a valer a pena demonstra-o o facto de as previsões relativas, tanto ao crescimento como aos desequilíbrios macroeconómicos – em particular, os défices orçamental e externo – terem vindo constantemente a melhorar, o que volta a suceder nesta edição do WEO. A previsão de crescimento para 2007 sobe para 1,8% (1,5% há seis meses), a do défice orçamental desce para 3,3% (3,7% na anterior edição), admitindo para 2008 um valor de 2,6%, e o défice externo reduz-se igualmente para 9,1% do PIB (9,6% na versão de Setº). Estes resultados mostram que o caminho deve ser prosseguido, tanto mais seriamente quanto os obstáculos a superar são ainda muitos, com destaque para os resultantes do envelhecimento da população, fortemente agravado, no nosso caso, pelo estrondoso falhanço das políticas de qualificação empreendidas na década de 80 e prosseguidas até há pouco. Do primeiro resulta o aumento do encargo com pensões e cuidados de saúde, exigindo não só a prossecução das reformas nessas áreas, mas o aumento generalizado de eficiência da economia, tanto a nível público como privado. O segundo tem como consequência a necessidade de requalificação de grande parte dos trabalhadores, começando pelos jovens que agora acedem ao mercado do trabalho.
Nenhum destes problemas se resolve com a negociação com Bruxelas de aumentos da dívida pública, nomeadamente – como tem vindo a ser sugerido – com vista a financiar a rescisão de contratos com funcionários públicos. Sem as reformas de base que estão em curso, estes equivaleriam a tratar um drogado com mais uma dose de alucinogénio que só agravaria a sua dependência. Foi a persistência na busca do ajustamento fácil que nos levou, durante duas ou três décadas, a forçar os aumentos de rendimento sem base no crescimento efectivo da produtividade. Inventar medidas cada vez mais artificiosas para permanecer nessa trajectória só serviria para agravar cada vez as perspectivas de futuro. Os empresários e trabalhadores já o perceberam. É tempo de as "chattering classes" acompanharem esse esforço.