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Portugal às fatias

O Governo anuncia novo «pacote» de privatizações. Entre estas, a Companhia das Lezírias, o único espaço português que ainda permite uma agricultura diversa e extremamente rendível.

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O Governo anuncia novo «pacote» de privatizações. Entre estas, a Companhia das Lezírias, o único espaço português que ainda permite uma agricultura diversa e extremamente rendível.

O Governo aliena o que nos dá grandeza e lucro. Dizem os entendidos: aquela larga extensão de terreno será progressivamente posta em causa e, dentro de uma década, a pressão imobiliária dará cabo dela.

Os entendidos são: engenheiros agrónomos, autarcas, professores, lavradores, ganadeiros, ambientalistas, e classificam esta inquietante investida de crime de lesa-pátria.

A privatização é o princípio do universo fechado. Procede de uma estratégia de separação, que cria milhares e milhares de excluídos. Não concebe, apenas, o apartheid urbano; desenvolve-se no campo, num fenómeno que supera a segregação citadina.

As coutadas identificam- se com o ócio dos latifundiários e associam-se às fomes ancestrais. Assistimos, com este Governo, à destruição do gregarismo, e ao estabelecimento de novas categorias de guetos.

O que pretende, com a destruição do maior empreendimento agrícola português, implica-o como réu de nefando delito. Aos poucos, Portugal fica às fatias.

O património territorial, certamente o mais importante, a par do da cultura, está a ser desbaratado, com persistente arrojo e desmedida criminalidade. Um dia destes apenas teremos as ruas livres para passear.´

Mesmo assim, talvez nos façam pagar imposto. As informações chegam-nos tarde e a más horas, na razão directa do facto consumado. Estes e outros semelhantes negócios realizam-se na obscuridade dos gabinetes, nos corredores da intriga, nos bastidores dos grandes interesses económicos.

Raramente sabemos quem são os compradores e, quando os nomes singulares ou os de empresas alcançam o conhecimento público, eles não correspondem, na realidade, aos dos verdadeiros interessados.

As privatizações obedecem a um empreendimento ideológico, cuja matriz é a polarização social e a emergência de uma reduzidíssima casta dominante, que acentuam o aumento das desigualdades.

É o síndroma «nimby» (not in my backyard: «não no meu quintal») o qual, segundo Robert Reich [«L’Économie Mondialisée» - Paris, 1993] interpreta o projecto de segregação mais ferozmente individualista a que as sociedades humanas alguma vez assistiram.

Incapaz de resolver os mais rudimentares problemas económicos, tolhido numa imobilidade exasperante, este Governo promove a dilapidação dos nossos haveres nacionais, colocando-os nas mãos daqueles que entendem não ter o dinheiro pátria.

A venda da Companhia das Lezírias (entre outras, igualmente abomináveis transacções) é feita em nome de que recursos salvatérios?

Precisamos daquele dinheiro - dizem almas piedosas. Então, que destino tomaram (e tomam) os milhões de milhões que a «Europa» tem enviado para os sucessivos Governos?

Estarrece-nos o inventário de inépcias, leviandades, corrupções, nepotismos económicos, tráficos de influências que permanecem sem punição.

O funcionamento das instituições está protegido não só pela natureza dessas instituições como por aqueles que as dirigem - sejam do PSD ou do PS.

As diferenças ocorrem no tratamento das pessoas e nas relações de sociabilidade. De resto, ambos os partidos são semelhantes, até porque apoiam e sustentam todos os que reproduzem as implicações políticas que representam.

A legitimidade do Poder pelo voto não implica a arrogância e a displicência do Governo pelos governados.

Decididamente, este Executivo não serve porque não nos serve - servindo interesses e grupos que de nós se servem.

Proponho aos meus Dilectos um jogo amável: adivinhem a que grupo económico-financeiro pertence a maioria do quadro governamental. Vão ter surpresas. Ou talvez não.

Frases para decorar - «A democracia é o menos mau dos sistemas políticos conhecidos. Mas há sempre maneira de o piorar - Millôr Fernandes.

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