Opinião
Petróleo, geopolítica e inflação
A descida do preço do petróleo terá várias implicações importantes para os investidores. Em primeiro lugar, a volatilidade é um facto na vida dos mercados financeiros, e o ano de 2015 tenderá a ser mais instável do que 2014.
A queda abrupta do preço do petróleo que se tem vindo a verificar desde meados do ano passado está novamente no centro das preocupações sobre a economia mundial nestas últimas semanas. Embora a redução do preço do petróleo devesse constituir um claro estímulo para o desempenho económico, o ritmo desta descida é preocupante e já levou alguns analistas a questionarem se a economia global não estará a enveredar por um mau caminho. Neste artigo, vamos descrever alguns dos efeitos da queda do preço do petróleo nos mercados mundiais, bem como as suas consequências a nível político, e referiremos algumas oportunidades de investimento propiciadas pelas recentes mexidas do mercado.
Volatilidade e avaliação
A redução do preço do petróleo teve um impacto particularmente dramático na Rússia, que já se encontrava numa situação complicada devido às sanções impostas pelo Ocidente. O colapso do rublo, bem como as medidas cada vez mais desesperadas para desacelerar a queda da moeda, poderá causar ainda mais volatilidade, particularmente na conjuntura actual, em que não se prevê um fim nesta tendência de queda do preço do petróleo.
Tendo em conta a forte dependência do petróleo e os inúmeros problemas estruturais com que se debate, bem como o alto nível das taxas de juro que se verifica actualmente, é quase certo que a Rússia irá entrar em recessão. As tensões geopolíticas acerca da questão ucraniana, bem como as consequentes sanções, estão a prejudicar a economia russa e a aumentar a relutância do banco central em usar as suas reservas para estabilizar a moeda.
Outro efeito colateral indesejável da queda do preço do petróleo tem sido a acentuada queda das previsões relativas à inflação da Zona Euro. Embora a tendência de queda já se tivesse manifestado, as estimativas de inflação caíram ainda mais, aumentando a probabilidade de um cenário de deflação (na Zona Euro, os preços no consumidor foram negativos em Dezembro, pela primeira vez em cinco anos), caso não se verifique qualquer intervenção do banco central.
Conjugada com o fraco nível de alguns indicadores económicos, a queda das estimativas de inflação levou os investidores a desejar que o Banco Central Europeu (BCE) começasse a comprar obrigações de dívida pública, provavelmente logo após a sua próxima reunião, agendada para o dia 22 de Janeiro. As expectativas quanto a uma eventual vaga de flexibilização quantitativa (FQ) levaram o euro a atingir níveis históricos de nove anos em relação ao dólar, o que deverá fomentar a exportação da Zona Euro.
Resta saber se o BCE irá superar os obstáculos levantados à QE e satisfazer as expectativas do mercado. No entanto, o banco central não poderá ir além de um estímulo à economia da Zona Euro. A resolução do problema do elevado nível de desemprego em toda a região e a criação de condições para um crescimento sustentável a longo prazo exigirá igualmente o envolvimento dos governos da Zona Euro, no sentido de reformarem os mercados de trabalho e reduzirem o nível de endividamento. Tendo em vista o crescente apoio às propostas anti-austeridade apresentadas pelos partidos populistas em vários países, este cenário constituirá porventura o maior desafio.
Apesar destas genuínas preocupações sobre a capacidade de crescimento das economias europeias, as empresas europeias estão fortes e recentemente demonstraram a sua capacidade de aumentar as receitas incrementando a sua margem de lucro. Atendendo à saúde financeira do sector empresarial e à maior diferença negativa em relação às acções norte-americanas resultante da recente volatilidade do mercado, poderá tratar-se de uma boa porta de entrada para as acções europeias no caso de investidores com um horizonte temporal alicerçado no longo prazo.
Rentabilidades das obrigações de dívida pública: qual o limite mínimo?
Ao mesmo tempo que crescem as preocupações relativas à deflação, e à medida que se torna cada vez mais provável a introdução de mecanismos de flexibilização quantitativa na Europa, as rentabilidades das obrigações de dívida pública baixaram ainda mais. Embora possa parecer pouco habitual que um país como a Espanha seja capaz de se financiar a uma taxa de juro mais baixa do que os Estados Unidos, as perspectivas de deflação vão continuar a manter as rentabilidades em baixo. O mercado parece estar a empurrar o Reino Unido para o campo europeu: o "spread" entre os títulos do tesouro norte-americano a 10 anos e os do tesouro britânico ronda agora os 30 pontos base, o valor mais elevado desde 2006.
A quebra dos preços do petróleo não tem impacto apenas nos mercados de acções e nas rentabilidades das obrigações soberanas, pois os mercados de crédito também estão a ser afectados. Este ano, as empresas de energia foram responsáveis por mais de 18% da emissão de obrigações de elevado rendimento nos Estados Unidos, um valor superior aos 6% verificados em 2008. As preocupações relativas à situação financeira destas empresas, numa conjuntura caracterizada pela queda do preço do petróleo, têm contribuído para a redução dos preços das obrigações e para a subida das rentabilidades. A relativamente baixa exposição à energia no crédito europeu de elevado rendimento contribuiu para que a Europa superasse os Estados Unidos durante a queda do preço do petróleo.
Implicações a nível de investimento
A descida do preço do petróleo terá várias implicações importantes para os investidores. Em primeiro lugar, a volatilidade é um facto na vida dos mercados financeiros, e o ano de 2015 tenderá a ser mais instável do que 2014. Os investidores deverão ficar atentos às oscilações de curto prazo dos mercados e manter o nível de investimento, para beneficiarem da tendência de alta dos lucros das empresas, a qual provavelmente vai ocorrer tanto na Europa como nos Estados Unidos. A Europa, nomeadamente, poderá oferecer oportunidades de investimento, apesar da difícil conjuntura de crescimento, dado o potencial de crescimento de lucros das empresas europeias e as avaliações inferiores, comparativamente ao mercado norte-americano.
Em segundo lugar, embora as rentabilidades das obrigações apresentem valores incrivelmente baixos em termos históricos, a verdade é que o peso dos activos disponíveis para investimento em busca de um retorno seguro, a inflação mais baixa que alguma se viu e as contínuas tensões geopolíticas poderão levar a novos decréscimos. Um portefólio equilibrado proporciona alguma protecção contra a exposição a obrigações, mas a diversificação de obrigações continuará a ser fundamental.
Por fim, a exposição à energia tem afectado negativamente o crédito de elevado rendimento nos Estados Unidos. Os mercados de elevado rendimento da Europa, pelo contrário, têm muito pouca exposição à energia. As obrigações de elevado rendimento constituem um excelente instrumento para mostrar a força do sector empresarial europeu sem aumentar a exposição a acções. Além disso, tendo em conta que o "spread" das obrigações de dívida pública europeia atingiu um novo máximo, esta poderá ser, neste momento, uma excelente porta de entrada para este sector tão interessante dos mercados de obrigações.