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04 de Maio de 2009 às 13:00

Objectivos pouco SMART

Uma das técnicas motivacionais mais conhecidas e disseminadas é a definição de objectivos. Ela encontra-se presente em qualquer organização com um mínimo de sofisticação gestionária numa das suas formas possíveis.

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Uma das técnicas motivacionais mais conhecidas e disseminadas é a definição de objectivos. Ela encontra-se presente em qualquer organização com um mínimo de sofisticação gestionária numa das suas formas possíveis. E a constatação de que nem todos os objectivos são geradores de motivação levou à popularização da ideia de que as organizações precisam não apenas de objectivos, mas de objectivos SMART. O acrónimo inglês refere-se a objectivos específicos, mensuráveis, alcançáveis, recompensados e com prazos definidos.

Abundante investigação, produzida desde os anos 60 por uma comunidade de investigadores liderada por Edwin Locke e Gary Latham, tem mostrado a robustez empírica das previsões da definição de objectivos. Esta técnica funciona porque focaliza a atenção, propicia o aumento do esforço, oferece desafio, proporciona ganhos materiais e permite rever estratégias de actuação que não estão a conduzir na direcção certa.

Uma linha de investigação paralela, todavia, tem considerado o papel potencialmente nefasto da definição de objectivos. O trabalho de um quarteto liderado por Lisa Ordóñez, acabado de publicar na revista "Academy of Management Perspectives", sugere a possibilidade de as consequências negativas do estabelecimento de objectivos serem significativas. Os autores consideram que a presença de objectivos SMART pode:
• Levar as pessoas a centrarem-se exclusivamente nos objectivos, esquecendo tudo aquilo que não contribui directamente para o alcance das metas - mesmo o que possa ser relevante para a organização.
• Reduzir a motivação intrínseca, isto é, o foco nos objectivos por razões estritamente interesseiras.
• Corroer a cultura organizacional, por estimular o alcance do objectivo em detrimento de outros valores culturais tornados menos salientes pela presença destacada das metas.
• Estimular comportamentos fora dos limites éticos. A proximidade do objectivo pode levar a "cortar a direito" aqui e ali, para não deixar de alcançar a meta.
• Inibir a aprendizagem, pois o objectivo, qual eucalipto, pode secar tudo o que existe à sua volta, impedindo novas formas de trabalhar que podem ser positivas a longo prazo, mas que danificam o desempenho no curto prazo.

Os autores ilustram este rol com vários casos, incluindo um que procura responder à pergunta "por que é mais difícil apanhar um taxi em Manhattan num dia de chuva?". Porque a procura aumenta? Certamente. Mas também porque em dias de chuva os taxistas alcançam mais rapidamente o objectivo que estabelecem para si próprios: fazer o dobro daquilo que lhes custa o aluguer do carro para um turno de doze horas. Atingido esse valor, regressam a casa, diminuindo a oferta disponível.

Em conclusão: objectivos SMART são uma ferramenta poderosa, mas podem gerar comportamentos imprevistos e perniciosos. Os objectivos individuais, se não forem articulados com outros resultados organizacionais, limitam o desejo de cooperação, inibem os comportamento de cidadania organizacional e transformam a organização num campo de corredores solitários e individualistas. O que sugere que, sem as devidas cautelas, objectivos SMART podem, afinal, ser menos inteligentes do que parecem.


Referências:
Ordóñez, L.D., Schweitzer, M.E., Galinsky, A.D. and Bazerman, M.: 2009. "Goals gone wild: The systematic side effects of overprescribing goal setting", Academy of Management Perspectives.


Professor associado na Faculdade de Economia, Universidade Nova de Lisboa
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