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Amaro de Matos 08 de Março de 2012 às 23:30

O imposto mais estúpido

Os cobradores de impostos não resistem ao "luzimento"do dinheiro onde quer que o encontrem. O Estado deveria comprometer-se claramente com um calendáriode redução, ou mesmo eliminação, do IRC.

A capacidade do nosso País para atrair investimento (nacional ou estrangeiro) depende de muitos factores que têm sido abundantemente falados. Outros, e muito importantes, nem por isso. O nível da fiscalidade cabe nestes últimos. Que eu tenha dado por isso, só Miguel Frasquilho o tem referido

Todos os países cobram impostos sobre os lucros obtidos pelas empresas. As taxas respectivas variam consideravelmente, a partir dos 10%. Com os valores mais elevados na Bélgica e em França (33,3%), aliás perto dos praticados pela Alemanha, considerando as taxas locais. E se houver distribuição de lucros pelos sócios, cobram adicionalmente de acordo com a sua prática de cobrança sobre rendimentos pessoais.

Claro que países com taxas menores detêm uma vantagem competitiva. A Irlanda mantém uma taxa de 12,5%, mas teve de a defender contra as pressões da UE durante a discussão do seu programa de ajuda. As taxas de IRC em Portugal atingem os 27,5% para lucros superiores a 2 milhões de euros. Daí para baixo, 25%. A adicionar ainda uma derrama municipal. Estou desconsiderando a taxa de 12,5% para lucros inferiores a 12.500 euros, que, evidentemente, não vêm a propósito ao tratar da captação de investimentos.

No OE, o IRC representa aproximadamente 13% da receita fiscal, 6% da receita total. Em termos comparativos, é cerca de metade do IRS, um terço do IVA e o dobro do ISPE.

Não parece racional a cobrança de um imposto sobre os lucros de uma sociedade na parte em que eles permanecem financiando a actividade e não são distribuídos. E julgo que a generalização desta prática só se explica pela avidez também generalizada dos cobradores de impostos, que não resistem ao "luzimento" do dinheiro onde quer que o encontrem. O facto de ser comum a todos os países não faz aumentar o respeito pelo fenómeno. Torna apenas mais credível a explicação atrás.

Lógico seria que os empreendedores que investiram - naturalmente para obter um proveito - fossem tributados apenas quando se apropriassem de uma parte ou da totalidade dos lucros. Convertidos em rendimento pessoal. Hoje, esse rendimento pessoal custa ao investidor para o realizar o que foi pago em IRC (25 ou 27,5%) adicionado de uma taxa liberatória (25%). Ou seja, mais do dobro do que pagaria para converter em rendimento pessoal os juros provenientes de um investimento financeiro eventualmente sem risco (25%). Decorre daqui que na comparação entre investir numa empresa ou no mercado financeiro, à ponderação dos riscos (normalmente maiores para a empresa) há que adicionar ainda a consideração do custo (a dobrar no caso de investimento empresarial) de apropriação dos respectivos rendimentos. O que conduz a que só investimentos empresariais com rentabilidades muito elevadas podem competir com o tranquilo e pacato investimento financeiro.

Mantendo-nos no caso português. Não é, evidentemente, possível reduzir impostos até à estabilização da situação financeira do Estado. Mas, mesmo depois, deve continuar a pressão no sentido da redução da despesa pública para que impostos que têm – como o IRC – influência negativa sobre o investimento possam vir a ser concomitantemente reduzidos e de uma maneira geral. Não apenas para certos grandes investimentos estrangeiros no termo de negociações intermináveis. O Estado deveria comprometer-se claramente com um calendário de redução, ou mesmo eliminação, do IRC e – para evitar dúvidas sobre a sua realização – disponibilizar-se até a contratualizá-lo com quaisquer novos investidores. Esse calendário, devidamente comunicado, seria peça importante na apresentação indispensável para motivar investidores nacionais ou estrangeiros.

A redução a zero do IRC traria vantagens de simplificação enormes. A perda de receita fiscal é do mesmo montante que a redução de 11 pontos percentuais da TSU e o seu efeito estruturante talvez bem superior. Acabaria o "lucro tributável", só compreensível por iniciados e curiosamente distinto do "lucro". Deixaria de ser necessária uma fiscalização difícil, penosa e pouco produtiva por parte do fisco. A tributação autónoma poderia ser convertida em tributação em IRS dos beneficiários. O valor correspondente à eliminação do IRC, na parte em que a redução de despesa não bastasse, poderia em parte ser compensado na taxa liberatória mantendo-a como foi fixado para 2012. E talvez em alguns acertos noutros impostos.

A racionalização fiscal necessária, com vista a não prejudicar, antes beneficiar, a actividade empresarial, vital para a recuperação e crescimento do País, não termina evidentemente aqui. O ISPE que tributa um factor de produção das empresas devia também ser trabalhado de forma a não prejudicar a competitividade.


Economista

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