Opinião
Notícias inconvenientes de Verão
Activos disponíveis em aplicações e depósitos bancários no Brasil e no exterior sustentam estas estimativas, tendo em conta a quebra do dólar e a alta de preços das vendas cerealíferas e de minérios, com primazia nos ganhos para os estados do Centro Oeste
É bom partir de férias, mas aqui o elenco noticioso não é do melhor.
Para quem goza férias no trópico
O Brasil conta com 130 mil fortunas milionárias que equivalem a 573 mil milhões de dólares, mais de metade do PIB nacional, segundo uma estimativa da Folha de São Paulo a partir de dados da Receita Federal e The Boston Consulting Group.
Activos disponíveis em aplicações e depósitos bancários no Brasil e no exterior sustentam estas estimativas, tendo em conta a quebra do dólar e a alta de preços das vendas cerealíferas e de minérios, com primazia nos ganhos para os estados do Centro Oeste, Norte e Nordeste, em detrimento de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Manaus surge, em consequência, como o novo maná do investimento imobiliário, mas o tradicional dualismo brasileiro mantém-se de regra.
O grosso do rendimento nacional brasileiro, cerca de 80 por cento, continua privilégio de dez por cento da população. (...)
Entre 850 milhões de pessoas esfomeadas neste mundo, o Programa Alimentar Mundial acorre a pouco mais de 90 milhões.
Provavelmente nenhum dos desvalidos terá tido em conta o alerta de Josette Sheeran.
O PAM gastou cerca de 600 mil milhões de dólares em rações alimentares em 2006, segundo a responsável da ONU, mas este ano a alta de preços leva a considerar que, na ausência de reforços orçamentais, nem sequer será possível assegurar os mínimos de assistência.
O custo das aquisições de milho aumentou 120 por cento no primeiro semestre deste ano e é um indicador da alta dos preços de produtos alimentares, segundo a responsável do PAM.
Uma das causas do défice passa pelo crescente investimento em biocombustíveis que gera a inflação de matérias-primas para alimentação humana e de gado.
O PAM está sem verba para obviar às fomes.
Para quem está de férias a norte
O governo britânico expulsou quatro diplomatas russos depois de Moscovo ter recusado a extradição de um suspeito russo no assassínio em Londres de Alexander Litvinenko.
David Miliband, chefe da diplomacia britânica, classificou as expulsões como um "sinal clara e proporcional", tendo em conta a relevância do caso.
O tom baixo da retaliação contrasta com a atitude tomada em Setembro de 1971 pelo chefe de governo conservador Edward Heath que ordenou a expulsão de 90 diplomatas soviéticos.
Nessa altura tratava-se de espionagem e retaliação pura e dura de parte a parte. Agora, estão em causa marcação de terreno, mínimos de consideração e realismos impúdicos.
No próximo domingo, o Partido de Recep Tayyip Erdogan irá, muito provavelmente, consagrar, pelo menos, uma maioria relativa no parlamento da Turquia.
Se o escrutínio redundar numa maioria que reitere o mandato que Erdogan alcançou em 2002, então o Partido da Justiça e Desenvolvimento terá condições para avançar com um programa político em que as negociações de adesão à União Europeia (cada vez menos entusiasmante para a opinião pública) sustentarão uma causa de desmilitarização e limitação do secularismo anti-islamita das instâncias políticas.
Com a França de Sarkozy à cabeça contra a putativa adesão da Turquia à UE, é de temer que o crescente cepticismo turco em matéria de negociações com Bruxelas venha a alimentar, entre outros malefícios, uma deriva nacionalista muito marcada pela questão curda.
As ameaças reiteradas dos militares turcos contra as guerrilhas curdas acantonadas no norte do Iraque poderão vir a redundar numa intervenção violenta, com apoio tácito do Irão, a muito curto prazo.
O crescendo de atentados no Curdistão iraquiano está para dar e durar.
Até ao final do ano, deverá ter lugar o referendo sobre o estatuto da cidade de Kirkuk.
A Jerusalém curda, disputada por árabes, curdos e turcomenos, rica de petróleo, é um dos fulcros de conflito no Iraque. O Curdistão será um dos alvos preferenciais de atentados a curto prazo.
Uma série de dados soltos e contraditórios do Pentágono têm vindo a indicar, por sua vez, que militantes sauditas, egípcios e outros devotos sunitas, infiltrados através da Síria, são os principais responsáveis estrangeiros por ataques suicidas no Iraque.
A grande maioria dos detidos por acções terroristas consta, no entanto, de iraquianos e o apuro mantém-se óbvio: a insurreição e o terrorismo no Iraque são de origem local.
A guerra civil só poderá ser apaziguada através de uma concertação política que envolva os sunitas.
Não existem sinais positivos nesse sentido.
Os candidatos democráticos à presidência estão notoriamente à frente na longa e caríssima maratona para a Casa Branca a julgar pelo dinheiro que conseguiram angariar para as suas campanhas.
Em Junho, o senador do Illinois Barack Obama tinha no banco quase 33 milhões de dólares. Hillary Clinton somava 27 milhões para a campanha de nomeação pelo partido democrático que terá lugar entre Janeiro e Junho do próximo ano.
Hillary vai à frente nas sondagens e Obama é segundo entre os eleitores democratas. Nenhum outro democrata tem hipóteses de ser nomeado candidato pelo partido.
Na frente republicana, Rudolph Giuliani, antigo presidente da câmara de Nova Iorque, tem em caixa 17 milhões e meio de dólares. O mórmon Mitt Romney labuta com 14 milhões. São, de longe, os dois candidatos melhor colocados entre os eleitores republicanos nas sondagens e na angariação de fundos.
Romney, com o estatuto de bem-sucedido governador do Massachusetts, tem a vantagem de ser milionário e poder contar com o seu próprio dinheiro. Contra Romney joga o facto de ser de religião mórmon.
Do lado republicano, o quadro ganha, assim, contornos claros.
Salvo imprevisto de maior, teremos Giuliani ou Romney na sucessão de Bush. Depois será preciso negociar os tickets: as parcerias de candidatos à presidência e candidatos à vice-presidência.
Nas bolsas de apostas, considerando o dinheiro angariado para campanha e o balanço das sondagens, podem já apontar-se os grandes favoritos.
Hillary Clinton tem excelentes hipóteses de ser a candidata do partido democrata. Rudolph Giuliani é o favorito à nomeação republicana.
O imprevisto é o sal da campanha eleitoral, mas esta é a grelha de partida para a votação.
Para quem vai de férias em Bruxelas
Sério como uma pedra, o ministro Mário Lino confundiu na primeira investida em Bruxelas a Eslovénia, a defunta Checoslováquia e outros mundos olvidados do seu cadastro comunista ao debitar prosa sobre as vantagens das presidências de estados ditos menores.
Pedro Silva Pereira, clone putativo de excelência maior, abalançou-se, por sua vez, a tiradas mais grandiloquentes e saiu-se com isto: "Chegou uma presidência com uma orientação política, com prioridades claras."
Antes de Pereira e dos seus não havia nada ao que cumpre presumir, deduzir, induzir ou suspirar.
Depois, mesmo descontando um momento mau do tendencialmente mais ponderado ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, demos com isto.
O chefe da diplomacia portuguesa ora fez que rubricava, ora mandou dizer que não subscrevia uma missiva diplomática sobre pretensões de certos estados europeus na mediação israelo-palestiniana em prol do recém-nomeado enviado do Quarteto, o impoluto Tony Blair.
Muito sobra para temer que falhe o discernimento às gentes menores ao serviço doutros presumíveis estadistas e, quanto a esses, melhor será guardar tempo e recato para ver os trunfos que se propõem jogar.