Opinião
Mudam-se os tempos, mudam-se as exportações
As exportações têm sido o motor da economia portuguesa nos últimos anos. Como o consumo privado foi estrangulado pelo endividamento das famílias e pelo aumento do desemprego, assim como o consumo e o investimento públicos se viram fortemente condicionados
Daí que a recente valorização do euro face ao dólar e as previsões de abrandamento das economias de alguns dos nossos principais mercados compradores – como a Espanha, a França e a Alemanha, por exemplo, que absorvem mais de metade das vendas para o exterior – possam ensombrar as perspectivas para 2008 do sector exportador português e, consequentemente, o bom desempenho da economia nacional.
Em 2006, as exportações cresceram 12,4%, atingindo os 34,5 mil milhões de euros. E, de Janeiro a Julho de 2007, as vendas para o exterior aumentaram 10,0%, gerando 22,2 mil milhões de euros. Assim sendo, as exportações estão a crescer muito acima do PIB em dois anos consecutivos. Além disso, conforme defende o professor Manuel de Herédia Caldeira Cabral, parece inequívoca uma alteração do padrão exportador. Segundo este docente da Universidade do Minho, entre 2003 e 2006, verificou-se um crescimento das exportações em sectores tradicionalmente importadores, ao mesmo tempo que as vendas para o exterior diminuíram em alguns dos sectores exportadores tradicionais. Por outro lado, houve um aumento da intensidade tecnológica das exportações portuguesas, registando-se importantes ganhos de quota de mercado nos sectores de alta tecnologia e de tecnologia média/alta. A estas tendências deve ainda acrescentar-se a diversificação dos mercados de destino.
Confirma-se, pois, que Portugal está, aos poucos, a abandonar a exportação de produtos com baixo valor acrescentado para começar a privilegiar as vendas para o exterior de produtos situados no topo da cadeia de valor e caracterizados por uma maior intensidade tecnológica. Não por acaso, em 2006, o sector das máquinas e aparelhos (32%) liderava destacado o “top” das exportações portuguesas, seguido pelos produtos refinados (13,5%), pelos têxteis/vestuário (8%) e pelos alimentos (6,4%). Mas mais do que uma orientação governamental, como por vezes nos querem fazer crer, esta mudança do perfil dos produtos exportadores resulta, isso sim, das contingências ditadas pelos mercados e do reposicionamento estratégico dos empresários portugueses.
Até há pouco tempo, Portugal exportava essencialmente produtos muito expostos à concorrência global, revelando um défice de competitividade em termos de custos face aos países do Leste Europeu e da Ásia. Havia, portanto, que apostar não apenas em novos sectores mas também na subida na cadeia de valor dos produtos dos sectores tradicionais, como os têxteis/vestuário ou o calçado, que evoluíram da subcontratação por multinacionais para a produção com marca própria, design cuidado e distribuição expedita. De resto, as exportações totais de têxteis, vestuário e calçado aumentaram, apesar da diminuição do seu peso relativo no sector exportador. Existe, portanto, um esforço notório para ultrapassar as adversidades desenvolvido pelos empresários e associações do sector, bem como por iniciativas como o Portugal Fashion.
Relativamente ao destino final das exportações, foi igualmente a necessidade a aguçar o engenho, mais do que as campanhas promocionais – louváveis, é certo – do Governo em alguns mercados externos. Os empresários portugueses perceberam que havia que encontrar mercados alternativos aos tradicionais, pois estes apresentavam ritmos de crescimento mais lentos. Daí que as exportações estejam a crescer mais para mercados com maior expansão, em detrimento da Europa comunitária, por exemplo. Verifica-se um interesse crescente pelos chamados BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), bem como por países como Angola, EUA, México e até mesmo Singapura. Por conseguinte, parece natural que este último mercado asiático esteja nas prioridades da AICEP?
Em 2006, e apesar da substancial importância que o mercado comunitário, particularmente Espanha, assumia para o nosso sector externo, o mercado extra-comunitário já representava 23% do total das exportações, tendo as vendas para fora da UE crescido, em termos nominais, quase 27%, contra 7% em 2005. E, até Maio deste ano, as exportações extracomunitárias voltaram a subir 27%, destacando-se os combustíveis e os automóveis. É inegável que a subida do preço e da procura do petróleo tem dado um forte impulso a esta tendência, pois representa uma oportunidade para Portugal aumentar as vendas de produtos refinados para fora da UE. Ainda assim, não se deve subestimar a paulatina alteração do destino final das exportações.
Pode-se sempre argumentar que o novo perfil exportador tem mais a ver com efeitos de volume do que com ganhos reais de competitividade, que o comportamento das exportações nacionais está ainda muito dependente da conjuntura europeia ou que a penetração em mercados externos se encontra limitada pelos baixos índices de produtividade do país. Mas é já iniludível uma tendência para os empresários apostarem mais nos bens intangíveis e em tecnologias de ponta, mostrando-se igualmente dispostos a proceder ao “upgrading” dos produtos tradicionais. Ora, isto significa que vão no bom caminho. Haja esperança, portanto, tanto mais que os períodos de aumento da capacidade exportadora antecedem habitualmente os períodos de convergência de Portugal com a UE.