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11 de Maio de 2011 às 08:45

Japão: Tempo de reflectir

Embora os nossos pensamentos continuem a estar com aqueles que foram directamente afectados pelos terríveis acidentes recentemente ocorridos no Japão

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Embora os nossos pensamentos continuem a estar com aqueles que foram directamente afectados pelos terríveis acidentes recentemente ocorridos no Japão, os investidores estão simultaneamente a centrar a sua atenção na avaliação do impacto económico de longo prazo do terramoto, tsunami e crise nuclear. Isto é, claro, um luxo que não se podem permitir os que se encontram no país e, segundo os meus colegas de Tóquio, a atmosfera na capital é de tristeza, reflectindo a crença japonesa de que "todos os cidadãos se abrigam sob a mesma árvore".

Pareceu sempre bastante óbvio que o terramoto teria algum impacto negativo na economia japonesa. Com base na experiência do passado, também sabemos que, no curto prazo, os mercados bolsistas tendem a não ser muito eficientes na avaliação das consequências de tais desastres para a economia e para as empresas. Estes períodos iniciais, que podem ser dominados por excessivo pessimismo, transformam-se muitas vezes em oportunidades muito atractivas para comprar a curto prazo. De facto, desta vez não foi diferente: fazendo uma retrospectiva, um investidor suficientemente corajoso para investir no Nikkei 225 próximo do fecho do dia 15 de Março, teria obtido um retorno de 13% até ao final do mês.

No entanto, embora esta oscilação de curto prazo tenha iludido a maioria, ela pode ainda representar uma oportunidade igualmente boa para avaliar as vantagens de investir no Japão a longo prazo.

É provável que o argumento individual mais poderoso para investir neste momento em acções japonesas seja o facto de elas estarem, segundo algumas medidas, baratas e, segundo outras, extremamente baratas. A Société Générale sublinha que, em termos de PER ciclicamente ajustado (que atenua a volatilidade ao utilizar a média dos lucros em 10 anos), os preços das acções japonesas situam-se no nível mais baixo dos últimos quarenta anos. Também em termos de rácios mais convencionais, tais como o preço/valor contabilístico, o Japão parece estar agora significativamente mais barato que a maioria dos mercados desenvolvidos globais seus homólogos.

Claro que, por si só, as avaliações atractivas não seriam suficientes para convencer alguém, quanto mais não seja porque, em última análise, elas tendem a reflectir perspectivas fracas para os lucros. No entanto, a pergunta que se deve fazer sempre é se a realidade será tão má como o mercado está a descontar. Os problemas de longo prazo do Japão, incluindo os encargos relacionados com o envelhecimento da sua população, o nível extremamente elevado de dívida pública, e uma deflação persistente, são do conhecimento de todos. Além disso, no curto prazo, o crescimento será certamente afectado pelo terramoto e pelos actuais problemas nucleares.

No entanto, uma característica comum de muitos desastres naturais é que estes tendem a ser seguidos de períodos de crescimento significativamente mais rápido, devido ao aumento da actividade de reconstrução por parte do sector público e privado. No caso do Japão, os economistas estão agora a prever um crescimento substancialmente mais lento em 2011, seguido de uma forte recuperação em V em 2012.

No que se refere à política monetária, as condições no Japão já eram extremamente acomodatícias antes do terramoto, com a política de taxas de juro zero e o Banco do Japão a implementar um programa de compra de activos no valor de 5 mil milhões de ienes. Em resposta ao desastre, no entanto, o Banco tornou a sua política ainda menos restritiva, duplicando a sua meta de compra de activos para 10 mil milhões de ienes. E é importante registar que, em contraste com outros bancos centrais, um objectivo claro desta medida foi sempre suportar o preço dos activos de maior risco. Assim, será difícil para o mercado ignorar os esforços concertados do governo e da política monetária.

Para qualquer país exportador, a moeda é essencial no que se refere tanto às perspectivas económicas como empresariais. No caso do Japão, a força do iene constituiu certamente um obstáculo significativo para o sector empresarial. No seguimento do terramoto, o iene registou durante um dia uma valorização notável, devido à expectativa de as empresas japonesas repatriarem dinheiro. Mas, reconhecendo o sério risco que isto implicava, o banco central, com o apoio do G7, interveio de uma forma agressiva no mercado para fazer baixar o valor do iene.
Até agora, esta intervenção concertada provou ter bastante êxito, com o iene a registar não só um recuo em relação aos seus ganhos mas uma queda para um nível muito inferior àquele em que se situava antes do terramoto. Olhando o futuro, alguns analistas do mercado cambial acreditam agora que o iene poderá continuar a desvalorizar pelo facto de outras divisas importantes, tais como o Euro, serem em breve suportadas pelo aumento das taxas de juro. Se a recente fraqueza do iene for sustentada, o impacto positivo nos lucros das empresas exportadoras japonesas poderá ser significativo.

Os problemas actuais do Japão podem somar-se à sua capacidade contínua de decepcionar os investidores desde que o mercado bolsista de Tóquio atingiu o seu nível máximo nos finais de 2008. Apesar disso, ainda é possível encontrar um bom motivo para investir em acções japonesas, com base na recuperação económica prevista relacionada com a reconstrução em 2012, nas avaliações, nos níveis sem precedentes de apoio da política monetária e na possibilidade de um maior enfraquecimento do iene.


*Comentador de investimentos,
Fidelity Iinternational


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