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27 de Junho de 2006 às 13:59

Contas são contas

Longe vão os dias em que os ecos de Pequim chegavam a Luanda, com a face de Jonas Savimbi, quando a UNITA encontrava na China a espinha dorsal do seu apoio externo.

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Contas são contas - o resto é poesia
Longe vão os dias em que os ecos de Pequim chegavam a Luanda, com a face de Jonas Savimbi, quando a UNITA encontrava na China a espinha dorsal do seu apoio externo. Hoje, a «cidade dos mil cheiros» hipoteca cada vez mais o seu futuro num casamento de interesses com a explosão industrial chinesa.

A finar a semana passada, enquanto a atenção dos media portugueses se dividia entre o «Mundial» da Alemanha e os habituais secadores da política local, a China abria «anónima« uma linha de crédito a Angola no valor de dois mil milhões de dólares.

Um alheamento tornado ainda mais estranho quando enquadrado em constatação feita semanas antes, de que Angola se tornara - desde o início do ano – o maior fornecedor de crude à China.

Tudo muito distante. Geograficamente e na lista de prioridades das nossas vidas, ordenada por quem as interpreta diariamente nos alinhamentos noticiosos.

Tudo muito distante, apesar de o explodir industrial da China já nos varrer o dia-a-dia, ir fazê-lo de forma cada vez mais presente e de o disparo das exportações petrolíferas para Pequim ser a contrapartida de empreitadas, assim afastadas dos sonhos de empresas de construção civil portuguesas, que ali permaneceram durante décadas guerra em Angola.

Respigo luzes de um livro desbravado na minha adolescência («Quando a China acordar»). Já não o encontro na prateleira de casa e, por isso, teclo o nome nas buscas do »google». Na «premonição» não se fala de Angola, mas credita-se ao Imperador francês Napoleão Bonaparte o copyright da frase «a China é um gigante adormecido que fará tremer o Mundo quando acordar».

Regresso ao meu varrer diário dos media mundiais. A agencia Xinhua escreve que a China projecta gastar mais de 20 mil milhões de euros, durante os próximos cinco anos, a construir outras tantas refinarias de petróleo, semelhantes ao nosso megaprojecto de Sines.

Uma sede chinesa de energia a que Angola correspondeu ultrapassando nos últimos meses o Irão e a Arábia Saudita, no topo da lista de fornecedores de crude a Pequim.

A agencia Petromatrix indica que só em Janeiro e Fevereiro, entrou diariamente na China uma média de 456 mil barris de petróleo angolano e a tendência é para aumentar.

A Wood Mackenzie (consultora britânica especializada) projecta uma duplicação da produção de petróleo angolano durante os próximos três anos, até um alvo de três milhões de barris diários. E isto também graças a uma injecção chinesa de três mil milhões de dólares na exploração de crude angolano em águas profundas.

Uma trajectória  de interdependência mutuamente benéfica que deverá reforçar ainda mais o relacionamento entre os dois países. Angola ganha assim uma rede infra-estrututural indispensável à reconstrução socioeconómica do pais.

A China, assegura o pulmão energético necessário ao salto industrial que já começou a descolar.

Se a celebração destes contratos poderá ser criticada como pouco transparente sob parâmetros ocidentais, o facto é que constitui um progresso notável (mesmo que ainda longe do ideal) no reverter para o Estado angolano da exploração dos recursos naturais do país.

Incontornáveis e indiscutíveis, mesmo para os mais cépticos, já estão a ser os prognósticos napoleónicos do acordar da China, que se voltou para África com um pragmatismo e uma eficácia orientais. Onde contas são contas e o resto é poesia.

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