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Competitividade fiscal (2): a tendência daEuropa e o exemplo da Eslováquia

Há quinze dias procurei esclarecer de uma vez por todas o enquadramento do «famoso» choque fiscal apresentado na campanha para as eleições legislativas de Março de 2002, ...

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Com o presente artigo concluo o tema iniciado no texto anterior sobre competitividade fiscal. Há quinze dias procurei esclarecer de uma vez por todas o enquadramento do «famoso» choque fiscal apresentado na campanha para as eleições legislativas de Março de 2002, que não se esgota na descida das taxas de IRC (sobretudo) e do IRS, pressupondo igualmente uma simplificação da legislação fiscal e uma redução significativa das isenções, excepções e deduções que hoje tanto dificultam a percepção do contribuinte e dificultam o combate à fraude e evasão fiscais. Os objectivos? (1) um sistema fiscal muito mais «amigo» da competitividade e do investimento; (2) o aumento do «bolo» fiscal pela diminuição da fraude e da evasão; (3) uma mudança da filosofia de redistribuição do rendimento através do sistema fiscal, para ajudas e apoios directos aos grupos da sociedade que se pretende beneficiar.

No texto de hoje abordarei as mais marcantes tendências europeias em termos de competitividade fiscal, até como forma de contribuir para minorar o desconhecimento que em Portugal tanto existe sobre a actual realidade europeia nesta área - o que muito me entristece. Já em ocasiões anteriores me referi abundantemente à descida da tributação directa - e sobretudo da tributação sobre as empresas - levada a cabo desde o final da década passada nos países da Europa de Leste que (nunca me canso de o referir e de o recordar!), ainda no início dos anos 90, eram regimes comunistas totalitários, tendo a maior parte já aderido, em Maio último, à União Europeia (UE). Essa tendência veio conferir, definitivamente, uma importância acrescida ao papel da fiscalidade enquanto factor de atracção de investimento e de promoção de competitividade, o que já tem sido reconhecido em alguns trabalhos de carácter científico - tanto que a influência desta tendência generalizada do leste da Europa sobre a «antiga» UE a 15 começa a tornar-se visível (como referirei mais à frente no texto); porém, existe um caso na Europa que ameaça fazer escola rapidamente e que, do meu ponto de vista, pode vir a ser um verdadeiro case study: o exemplo da Eslováquia, que apresentarei em seguida.

No dia 20 de Janeiro último, o Ministro das Finanças da Eslováquia apresentou em Bruxelas as linhas gerais da reforma fiscal que entrará em vigor ainda este ano (endereço de consulta na internet: www.cfe-eutax.org/pdf_word_documents/events/pfd/Miklos.pdf), com os objectivos de:

- criar uma conjuntura «amiga» do investimento e da competitividade, tanto para empresas como para famílias;

- eliminar as ineficiências e fraquezas do regime fiscal até agora vigente;

- atingir o maior grau possível de justiça fiscal tributando todos os tipos e montantes de rendimento de forma igual;

- mudar a carga fiscal dos impostos directos para os impostos indirectos (onde a fraude e evasão fiscal é menor);

- eliminar as distorções do sistema fiscal enquanto instrumento para atingir objectivos não fiscais (como a redistribuição do rendimento e ajudas directas a determinados grupos da sociedade).

Desta forma, o sistema fiscal eslovaco assentará num número «mágico», 19%, que passará a ser a taxa de IRC, o escalão único de IRS e a taxa única de IVA. Ao mesmo tempo, são eliminadas todas as excepções, deduções e regimes especiais que até agora vigoravam e que em muito complicavam o sistema fiscal, ajudando à fraude e à evasão; são também extintos os impostos sobre dividendos, sucessões, doações e sobre a transferência de propriedades imobiliárias.

Perguntará o leitor: e porquê o número mágico de 19%? Por que não outro número? É que, tal como decidiu implementar esta reforma fiscal, a Eslováquia tem também o objectivo de aderir à União Económica e Monetária já em 2007, pelo que uma mudança deste género teria que ser desenhada com o objectivo de ser neutral em termos de arrecadação de receita fiscal; por isso, foram encomendados estudos (1) ao FMI, (2) ao Instituto de Política Financeira do Ministério das Finanças Eslovaco, (3) a um Comité de Especialistas especificamente criado para o efeito, (4) ao Infostat (o INE da Eslováquia) e (5) à Academia de Ciências da Eslováquia. A cada uma destas entidades foi explicado que objectivos se pretendia atingir, tendo sido depois escolhidas as propostas com estimativas mais conservadoras em termos de receita fiscal, para garantir a não existência de perdas. Foi, pois, assim que se chegou ao «tal» número mágico, os 19%.

E para os mais cépticos, que desconfiem, por exemplo, da não-progressividade da tributação em sede de IRS, basta atentar que até um rendimento de 50% do salário médio da economia eslovaca, ninguém é tributado; a partir desse nível de salário, toda a parcela remanescente é tributada a 19% - o que significa que quanto mais se ganha, maior é a taxa efectiva de imposto (ver gráfico em baixo ), isto é, o sistema é progressivo.

Simples, prática e com objectivos bem delineados - assim posso catalogar esta reforma fiscal eslovaca. E parece que não sou o único a pensar assim. A Áustria - esse país «subdesenvolvido»... - prepara-se para, com as devidas adaptações, «copiar» o que a Eslováquia fez na área fiscal.

Como refere Steve Forbes, dono e director da famosa Forbes Magazine, «(...) a Eslováquia será a próxima Irlanda ou Hong Kong - um pequeno país que se tornará num verdadeiro potentado económico. Poderá despoletar o efeito dominó que transformará o resto da UE num espaço mais livre e empreendedor para as empresas (...)».

E depois das tendências que nesta área Polónia, Estónia, República Checa, Hungria, Rússia, Eslovénia e, agora, Eslováquia trouxeram para a Europa, os anúncios e intenções de Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Espanha, Bélgica, Itália ou Suécia (para além da Áustria) sobre o que pretendem fazer - descer tributação directa, simplificar os respectivos sistemas fiscais e, em alguns casos, aumentar o peso da tributação indirecta - não nos deixam muita margem de manobra.

Aliás, Roménia e Bulgária, que nem sequer ainda pertencem à UE já anunciaram que reduzirão em 2004 / 2005 as respectivas taxas de IRC (de 25% para 19%, e de 23.5% para 15%, respectivamente) e de IRS (só a Roménia, descendo o escalão mais elevado de 40% para 38%, o mesmo acontecendo, em média, aos restantes escalões) de forma a torná-las competitivas, e simplificarão os sistemas fiscais...

Depois de tudo o que acima referi, diga lá caro leitor se o «nosso choque fiscal» não lhe parece adequado? E que copiar - com as devidas ressalvas - o que de bom é feito lá fora não é nenhuma vergonha, muito pelo contrário? Não, definitivamente não percebo por que não aprendemos com os outros. E isto, claro, é válido para qualquer governo, de qualquer sensibilidade política - incluindo o actual que, apesar do ímpeto reformador que tem mostrado, muito ainda tem a fazer (e depressa) nesta área. E, como vimos, nem se trata de ser original...

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