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A nova vida dos fundos de investimento em Portugal

Não terá passado completamente despercebido, mas provavelmente não lhe terá sido também dada a devida importância. Desde o passado dia 1 Julho, o regime de tributação dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC), mais vulgarmente conhecidos por fundos de investimento, mudou.

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Não terá passado completamente despercebido, mas provavelmente não lhe terá sido também dada a devida importância. Desde o passado dia 1 Julho, o regime de tributação dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC), mais vulgarmente conhecidos por fundos de investimento, mudou. E mudou para melhor. Para a indústria e sobretudo para os participantes.

Na sequência da publicação do Decreto-lei nº7/2015, de 13 de Janeiro, os fundos passaram a estar praticamente isentos de impostos podendo desde logo apresentar rendibilidades comparáveis aos seus congéneres europeus. Recordemos que até à entrada em vigor deste decreto-lei a carga fiscal incidia sobre os rendimentos e mais-valias do próprio fundo, sendo as rendibilidades apresentadas já líquidas de impostos. Com o novo regime, a carga fiscal incidirá sobre os rendimentos do participante tornando o processo mais transparente para todos, extinguindo-se a iniquidade fiscal entre fundos domiciliados em Portugal e fundos domiciliados internacionalmente. Em resumo, mais não se fez do que transpor uma moldura fiscal já consolidada nos restantes países europeus, o que aumenta a competitividade dos fundos de investimento portugueses e posiciona-os num patamar de quase igualdade fiscal com a indústria internacional, embora ainda aquém daquilo que se passa na Irlanda, Luxemburgo e mesmo na vizinha Espanha. Foi bom, mas não chega. E já voltaremos ao tema.

A indústria de fundos de investimento nacional é razoavelmente competitiva ao nível dos recursos humanos que emprega e dos resultados que obtém. A generalidade dos profissionais tem formação acima da média de qualquer outra indústria e as novas gerações tendem a ser cada vez melhores. Os fundos de investimento são provavelmente o produto financeiro que oferece maiores garantias de proteção aos investidores. As unidades de participação são património de cada investidor. São totalmente segregadas do património das gestoras ou do banco onde estão depositadas. As sociedades gestoras são auditadas e reguladas, assim como os próprio OIC, e são obrigadas a desenvolver e a dedicar uma apreciável e exigente quantidade de recursos humanos e materiais de modo a assegurar que os participantes estão devidamente protegidos. E bem, diga-se, já que a responsabilidade fiduciária das sociedades gestoras é enorme. Os fundos de investimento podem e devem por isso ser um veículo privilegiado de captação de poupança.

Além da proteção que é dada aos participantes, os fundos de investimento permitem o acesso a carteiras otimizadas na sua função de retorno ajustado ao risco e devidamente diversificadas por regiões e classes de activos, com custos de transação baixos, aos quais o investidor individual não tem normalmente acesso. De forma muito simples, podemos dizer que existem fundos de investimento para praticamente todos os objetivos de investimento e perfis de risco. Por exemplo, num evento remoto de contágio da crise grega e redenominação cambial, um fundo de investimento multi-activo sem restrições geográficas seria provavelmente o instrumento que melhor protegeria o património financeiro dos investidores pois os ativos subjacentes estariam imunizados a qualquer tipo de conversão forçada.

A indústria de fundos de investimento, ao contrário de outras indústrias, não precisa nem de subsídios, nem de incentivos e muito menos de "bail-outs" ou "bail-ins" para sobreviver ou crescer. O que a indústria precisa é de investimento na promoção da literacia financeira e estímulos sérios à poupança de longo prazo. E esta é uma responsabilidade séria do Estado, seja ele de que cor for. Esse estímulo passa pela diluição do "gap" de enquadramento destes instrumentos face às melhores práticas europeias.

O país precisa de poupança a longo prazo para enfrentar os desafios que se avizinham e os portugueses precisam de poupar para financiar os encargos futuros que o estado social não poderá continuar a prover (reforma, saúde, educação…). Aprendemos isso com a crise, e por isso os fundos de investimento nacionais deveriam ser enquadrados num regime fiscal que apenas ativasse a tributação à saída deste veículo de investimento e não dos OIC individualmente, aliás, à semelhança do que acontece na vizinha Espanha com o "trespasso". Talvez em próximas legislaturas cheguemos a este patamar.

Entretanto, iremos continuar a assistir, por boas razões, à gradual separação da indústria de gestão de ativos de grupos onde a principal atividade é a banca comercial. Sugiro que se consulte sobre este tema o excelente trabalho do Professor Doutor Miguel Almeida Ferreira, "Asset Management within Commercial Banking Groups: International Evidence". Resta-nos continuar a trabalhar no fomento de uma indústria independente de espírito e de conteúdo, como eu tenho a certeza que será hoje uma realidade, mas também uma indústria independente na forma e onde a única afiliação seja a afiliação com o participante, ou seja, o investidor.


Este artigo foi redigido ao abrigo do novo acordo ortográfico.

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