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19 de Março de 2008 às 13:59

A economia portuguesa entre Cila e Caríbdis

A envolvente externa da economia portuguesa tem vindo a degradar-se aceleradamente, criando um contexto difícil para este último (e decisivo) ano do primeiro mandato do actual governo. Aliás, a manter-se o ritmo de degradação das condições da economia int

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Aliás, a manter-se o ritmo de degradação das condições da economia internacional quer a UE, quer o BCE serão obrigados a deixar actuar os estabilizadores automáticos e a moderar a pressão financeira sobre as empresas e os consumidores sob pena de transferir para a Europa uma parte desproporcionada do peso da crise do subprime.

Se, neste caso, a economia europeia parece poder escapar ao “olho do furacão” já dificilmente deixará de ser atingida, em cheio, pela crise de liquidez consequente da forte desvalorização dos activos a que se vem assistindo (sem falar nas consequências devastadoras para o sistema de pensões). A política monetária europeia vai, necessariamente, adaptar-se, já que não é crível que a economia dos países que constituem a UE resista a um euro estabilizado a cerca de dois dólares.

É neste contexto que, acreditando que o deficit orçamental está já controlado, o nosso país se vira, agora, para outras prioridades e, em primeiro lugar, para o desemprego (e para o objectivo anunciado de criação de 150.000 empregos na legislatura).

Num sistema político democrático não é possível manter, em períodos longos, políticas “impopulares”, sobretudo a partir do momento em que a opinião pública se convence (ainda que erradamente) que “o pior já passou”.

De acordo com a sabedoria popular, “tendo evitado que o paciente morresse da doença, há que evitar, agora, que morra da cura”. Isto, sem provocar uma recaída...

O Governo terá de encontrar, rapidamente, resposta a estes anseios. A política económica será, certamente, nos próximos tempos, uma espécie de navegação, perigosa, entre Cila e Caríbdis.

É possível (e necessário) utilizar alguma folga orçamental existente (ou a que derivar da evolução das políticas no seio da UE), evitando as medidas espectaculares, eleitoralistas, mas sem efeito importante na economia – como a baixa indiscriminada dos impostos (medida que, uma vez tomada, é irreversível, mas com limitadas ou nenhumas consequências, pelo menos no nosso país, sobre o emprego, as exportações ou o investimento).

A oportunidade de “avançar” para outra fase do processo de consolidação da economia portuguesa passa por utilizar essa folga orçamental numa combinação virtuosa entre uma redução moderada do IVA, dos encargos sociais das empresas (nomeadamente com a contratação de desempregados ou de jovens), com o relançamento de algum investimento público.

Ao contrário da redução do IRS ou do IRC, que se limitam a reforçar as desigualdades sociais com consequências muito limitadas e apenas mediatas (e, sobretudo, mediáticas) sobre as variáveis estratégicas da economia, a redução do IVA, ainda que moderada, tem efeitos imediatos e reforça quer a posição competitiva das empresas, quer o poder de compra dos salários.

O reforço da posição competitiva das empresas tem a ver com a redução efectiva dos seus custos de produção, especialmente, com os custos de pessoal. Neste caso, uma redução moderada dos encargos sociais, que a “folga” orçamental pode possibilitar, contribui directamente para a redução dos custos unitários de produção, o que não acontecer com a redução do IRC – enquanto a redução dos custos gera competitividade e, portanto, investimento e emprego, os impostos são uma consequência da posição competitiva e a sua redução gera, apenas, e a prazo, maiores transferências para os accionistas (mas, não, maior investimento).

Os alvos prioritários desta actuação são as PME, já que os grandes grupos económicos e o investimento estrangeiro são objecto de modelos contratuais específicos.

A utilização deste instrumento de política como instrumento de apoio ao recrutamento de desempregados e incentivo à criação do primeiro emprego.

Quanto ao investimento público, um importante instrumento utilizado pelo Governo no controlo do deficit, pode agora tornar-se, pela sua reversibilidade e efeitos imediatos, num instrumento importante na fase de recuperação do potencial de criação de valor da economia portuguesa associando criação de emprego e oferta de infra-estrutras ou serviços (isto é, melhoria da competitividade das empresas e do poder de compra salarial).

Neste caso, não deve ser esquecido a eficiência económica do investimento público em Portugal, revelado por diversos estudos. Com o interessante potencial multiplicativo gerado pelas possibilidades oferecidas pelas parcerias público/privado, modelo muito falado mas, até agora, pouco utilizado.

A saúde, o ambiente, a logística, a mudança tecnológica e a qualificação de recursos são áreas de potencial interesse multiplicativo deste investimento. Mas, não os grandes projectos cujo efeito se fará sentir, sobretudo, a médio e longo prazo.

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