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04 de Setembro de 2012 às 23:30

A crise da Europa vai para tribunal

Por toda a Europa e mais além, os economistas debatem possíveis soluções para a crise da dívida europeia.

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Por toda a Europa e mais além, os economistas debatem possíveis soluções para a crise da dívida europeia. Mas essas discussões muitas vezes negligenciam, ou pelo menos minimizam, um elemento crucial de qualquer resolução: o Tribunal Constitucional alemão (Bundesverfassungsgericht), em Karlsruhe, que é responsável por determinar se as medidas tomadas pelos líderes europeus são legais à luz da lei alemã.

No dia 12 de Setembro, o tribunal vai determinar se o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), o fundo de emergência permanente da Europa, está em conformidade com a Constituição da Alemanha. Embora os responsáveis políticos alemães tenham apoiado o MEE em Junho, a sua ratificação está pendente até à decisão do Tribunal Constitucional.


Embora outros países da Zona Euro tenham tribunais semelhantes, estes têm uma influência significativamente menor. O Supremo Tribunal da Irlanda, por exemplo, remeteu essas questões para o Tribunal de Justiça Europeu. E a recente decisão da mais alta instância judicial francesa de que o MEE está em conformidade com a Constituição do país recebeu pouca atenção da comunicação social, o que destaca a sua relativa insignificância.

O tribunal da Alemanha é muito mais poderoso, tornando-se um elemento decisivo na determinação da agenda europeia. E, dado que o veredicto do tribunal sobre a constitucionalidade do MEE é crucial para a sobrevivência da Zona Euro, a sua autoridade estende-se para além do domínio jurídico, chegando à política e à economia.

Os argumentos sobre a crise do euro que ignoram o “factor Karlsruhe” contribuem para pouco mais do que um debate intelectual estéril. Por exemplo, a maioria das propostas envolve algum tipo de união fiscal, o que implicaria a transferência parcial de soberania fiscal dos governos nacionais para a União Europeia. Mas é o tribunal, e não os responsáveis políticos alemães, quem tem a palavra final sobre uma maior integração fiscal.

Recentemente, alguns economistas e políticos começaram a aperceber-se do factor Karlsruhe mas, erradamente, a maioria deles espera que o tribunal crie regras para resolver a crise. De facto, foram estabelecidas directrizes em Setembro passado, quando o tribunal decidiu que aspectos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) – precursor do MEE – eram inaceitáveis, e estabeleceu critérios que qualquer solução potencial deve atender.

Por exemplo, o tribunal determinou que o parlamento alemão teria de ser consultado cada vez que um país pedisse assistência financeira, afirmando que a soberania fiscal constitui o núcleo da soberania nacional. Caso contrário, os eleitores alemães seriam impotentes, constituindo uma violação da Constituição alemã.

Da mesma forma, o tribunal proibiu a criação de um mecanismo europeu de estabilidade permanente, que implique obrigações financeiras sobre as quais o parlamento alemão não tenha controlo directo. Como resultado, as decisões tomadas pelos responsáveis europeus durante as reuniões regulares ou de emergência podem ser reversíveis, especialmente se minarem a autoridade fiscal do parlamento alemão.

Seria um erro pensar que o governo da Alemanha poderia ignorar ou contornar a decisão do Tribunal Constitucional. Dado o forte apoio público ao Tribunal Constitucional, nenhum político alemão ousaria desafiar o seu veredicto. Uma decisão contra o Mecanismo Europeu de Estabilidade, a 12 de Setembro, iria solidificar ainda mais o papel central do tribunal na determinação do futuro da Europa.

Os juízes alemães não ultrapassaram os seus limites, definindo quais as medidas que a Alemanha deve tomar. Em vez disso, estabeleceram parâmetros dentro dos quais os políticos alemães – e portanto, europeus – são obrigados a permanecer. Simplificando, todas as soluções propostas para a crise do euro devem ser avaliadas de acordo com as decisões do tribunal.

Além disso, o tribunal decidiu há muito tempo que só o público alemão – não o governo – pode transferir a soberania fiscal para Bruxelas. Nem a chanceler Angela Merkel nem o parlamento podem decidir; cada proposta viável deve ser submetida a um referendo popular.

Em vez de perderem tempo a debater propostas que não têm hipótese nenhuma de serem aprovadas, os economistas e políticos deveriam estar a trabalhar dentro dos parâmetros estabelecidos pelo tribunal alemão. Na verdade, salvar o euro vai exigir uma solução abrangente que não só corresponda aos padrões do tribunal, mas que conte também com o apoio dos alemães.


Sylvester Eijffinger é professor de Economia Financeira na Universidade de Tilburg, na Holanda. Edin Mujagic é um economista da área monetária da Universidade de Tilburg.



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