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06 de Janeiro de 2010 às 11:45

A tragédia grega do euro

Quando o euro foi introduzido, em 1999, os países europeus concordaram que a disciplina orçamental era essencial para a sua estabilidade. Apesar da moeda comum ter beneficiado todos os países que a adoptaram - entre outras coisas, como âncora na actual crise...

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Quando o euro foi introduzido, em 1999, os países europeus concordaram que a disciplina orçamental era essencial para a sua estabilidade. Apesar da moeda comum ter beneficiado todos os países que a adoptaram - entre outras coisas, como âncora na actual crise económica -, o incumprimento do acordo por parte dos países da Zona Euro pode transformar o euro num desastre.

De facto, muitos países comportam-se como se não existisse Pacto de Estabilidade e Crescimento. O estado das finanças públicas gregas, por exemplo, é "uma preocupação para toda a Zona Euro", segundo o Comissário Europeu dos Assunto Económicos, Joaquin Almunia. O défice grego deverá alcançar os 12,7% do PIB, excedendo largamente os 3% definidos no PEC.

Naturalmente, todos os países da Zona Euro excederam o limite do défice definido no PEC em resultados da actual crise. Mas olhemos para o caso da Holanda, que excedeu o limite do défice pela segunda vez desde 1999. Quando a Holanda superou o limite definido no PEC pela primeira vez - por apenas 0,1% do PIB -, o governo adoptou medidas imediatas e rigorosas para baixar o défice. Esses países já estão a tomar medidas para reduzir o actual défice o mais depressa possível.

No sul da Europa, as coisas são diferentes. Exceder o limite do défice definido no PEC é a regra, e não a excepção. De facto, durante a primeira década do euro, a Grécia conseguiu manter o seu défice dentro dos limites do PEC apenas uma vez, em 2006 (e por uma margem muito ligeira).

Além disso, o governo grego deixou de ser digno de confiança. Em 2004, a Grécia admitiu que tinha mentido sobre a dimensão do défice desde 2000 - precisamente os anos que foram usados para avaliar se o país tinha condições para aderir à Zona Euro. Por outras palavras, a Grécia qualificou-se porque fez batota. Em Novembro de 2009, parece que o governo grego voltou a mentir, desta vez sobre o défice 2008 e o défice estimado para 2009.

A Itália também tem uma longa de história de negligência das regras orçamentais europeias (como Portugal e França). Tal como a Grécia, a Itália foi admitida na Zona Euro apesar de estar a anos-luz de cumprir todos os critérios. A dívida pública dos dois países estava bem acima dos 100% do PIB, quando o PEC definia um limite de 60% do PIB. A Itália também não cumpriu outro critério, já que a sua moeda nacional, a lira, não permaneceu os dois anos obrigatórios do Mecanismo Europeu de Taxas de Câmbio.

Dez anos mais tarde, parece que o tempo parou no sul da Europa. A dívida pública da Grécia e da Itália permanecem praticamente inalteradas, apesar dos dois países serem dos que mais beneficiam com o euro, já que as suas taxas de juro de longo prazo desceram para os níveis das alemãs após a entrada no euro. Só isso rendeu um benefício inesperado de dezenas de milhões de euros por ano. Mas isso não provocou praticamente nenhuma redução nas suas dívidas nacionais, o que significa apenas uma coisa: enorme desperdício.

Isso é evidente nos "ratings" da dívida. A Grécia tem, de longe, o "rating" da dívida mais baixo da Zona Euro. A Standard & Poor's colocou o já baixo "rating" A- sob revisão, para possíveis revisões em baixa. A Fitch Ratings cortou o "rating" da dívida grega para BBB+, o terceiro nível de investimento mais baixo. De facto, esta classificação significa que a Grécia tem uma capacidade de crédito muito inferior, por exemplo, ao Botswana ou a Malásia, que têm um "rating" de A+.

E se a situação na Grécia se complica tanto que o país não tem condições para honrar a sua dívida? Não é uma situação impossível. De acordo com os cálculos do Morgan Stanley, com taxas de juro de longo prazo relativamente baixas, a Grécia precisa de um excedente primário de pelo menos 2,4% do PIB para estabilizar a sua dívida nacional nos 118% do PIB.

As actuais regras proíbem outro país europeu ou a própria União Europeia de ajudar a Grécia. Mas a história recente mostra-nos que a regras europeias foram feitas para serem quebradas. Há já muitos (antigos) políticos e economistas (não se concede prémio a quem adivinhar de onde são) que sugerem que a União Europeia deve emitir a sua própria dívida soberana, o que poderia aliviar os problemas de países como a Grécia e a Itália.

Mas este plano teria um custo elevado. Castigaria os governos prudentes em questões orçamentais, já que as taxas de juro iriam subir em países como a Holanda ou a Alemanha. Um aumento de apenas 0,1% nos custos de endividamento significaria centenas de milhões de euros de pagamentos suplementares do serviço da dívida por ano.

Além disso, mesmo que nunca seja constituída uma dívida soberana da União Europeia, os países mais prudentes da Zona Euro vão enfrentar custos de endividamento mais elevados. À medida que a integração financeira aumenta, a falta de disciplina orçamental em um ou mais países da Zona Euro vai provocar um aumento das taxas de juro em toda essa zona monetária.
De acordo com as regras actuais, um membro da Zona Euro não pode ser expulso, o que permite a países como a Grécia manipular, fazer chantagem e receber mais e mais fundos da União Europeia. No longo prazo, isto vai ser desastroso para uma maior cooperação europeia, já que o apoio público diminuirá.

Assim, a Europa deve considerar a possibilidade de suportar os custos de curto prazo de alterar as regras do jogo. Se expulsar um membro puder estabelecer um mecanismo mais credível para garantir a disciplina fiscal na Zona Euro do que o PEC e as multas financeiras, o preço a pagar seria mais do que justo.


Edin Mujagic é economista monetário na Universidade de Tilburg University e conselheiro de assuntos monetários europeus para a ECR Research Ltd.


© Project Syndicate, 2009.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

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