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Travar a fundo na primeira "yield curve"?

Agradou-me constatar a forma positiva como experientes economistas internacionais veem com bons olhos a recuperação do setor bancário português.

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Estive, na semana passada, à conversa com os economistas Mahmood Pradhan (do FMI) e Peter Grasmann (da Comissão Europeia, FISMA) e com o Presidente da Associação Portuguesa de Bancos, Fernando Faria de Oliveira, num painel sobre a recuperação e os desafios do setor financeiro português no Banco de Portugal. Entre a versão "copo meio cheio" da recuperação portuguesa da última crise financeira global e a versão "copo meio vazio" dos desafios que ainda se sentem, tivemos oportunidade de fazer um bom balanço e de pensar no futuro próximo.

Agradou-me constatar a forma positiva como experientes economistas internacionais veem com bons olhos a recuperação do setor bancário português, em particular no que diz respeito ao aumento dos rácios de capital regulamentar "tier 1 equity" (acima dos 13% em finais de 2018 face a 11% em 2014), na qualidade dos ativos, refletida num rácio descendente de "nonperforming loans" (NPL, de cerca de 17% dos empréstimos em 2014 para 11% mais recentemente), no crescente rácio de cobertura de imparidades e numa maior estabilidade de rendibilidade contabilística (ROE) no último ano.

 

Não deixaram, porém, de ser mencionadas as fragilidades que ainda se sentem. Um bom exemplo é o rácio de NPL, ainda considerado elevado em termos absolutos, assim como o facto de as taxas de juro na Zona Euro estarem em níveis muito baixos (igualmente em termos absolutos), o que tem trazido desafios acrescidos ao sistema bancário, para além das novas formas de concorrência e dos novos concorrentes que têm surgido na prestação de serviços financeiros, muitas vezes agrupados numa classe de "fintech". Portugal também não é exceção na Europa no que diz respeito ao chamado fenómeno de "home bias", havendo uma significativa concentração dos balanços dos bancos em dívida soberana nacional e no setor imobiliário.

 

Reconhecidos os desafios, o ponto que mais gostaria de salientar deste debate foi a forma como os diversos intervenientes se mostraram convictos da maior robustez do sistema financeiro em 2019 para enfrentar um eventual abrandamento da economia europeia, quando comparado com o cenário de há dez anos, em 2009

(https://www.bportugal.pt/en/evento/joint-banco-de-portugal-and-imf-conference-portugal-reform-and-growth-within-euro-area). Esta possibilidade de abrandamento deve ser hoje levada a sério, especialmente quando surgem sinais algo inesperados que, historicamente, estão associados a recessões.

 

A "yield curve" das obrigações do Tesouro americanas apresentou, nos últimos dias, um comportamento com alguns elementos de "inversão". Ou seja, em vez do comportamento mais habitual em que as taxas de juro de longo prazo se situam acima das taxas de juro de curto prazo ("yield curve" conhecida como "normal"), observa-se, para um dado conjunto de maturidades, que a taxa de juro das maturidades mais longas é inferior à "yield" associada a obrigações com maturidade mais curta. O significado das expectativas associadas a este comportamento não é consensual; porém, a observação empírica de dados históricos revela que a uma inversão da "yield curve" se tem seguido um período de recessão económica. Assim sucedeu em 2000, uns meses antes da recessão de 2001, e assim sucedeu em 2006-2007, antes da recessão de 2007-2009 (dados oficiais da economia dos Estados Unidos).

 

Será precipitado concluirmos que vem aí uma recessão ao virar da curva, até porque a "yield curve" ainda não tem o formato de uma verdadeira inversão. Mais concretamente, nesta fase, é apenas nas maturidades mais curtas, até aos 3 anos (aproximadamente), que se verifica a curva descendente e verificamos que as taxas a 10 anos se encontram acima das de curto prazo. Contudo, há que acompanhar a evolução destes dados e tentar perceber o que justifica as expectativas de investidores que parecem analisar um horizonte de curto-médio prazo de forma diferente de um horizonte mais longo. A persistir e a acentuar-se o efeito de inversão, teremos motivos de preocupação. No caso da Zona Euro, temos o desafio adicional de vivermos com "yields" negativas no curto prazo - se é certo que toda a lógica de estímulo ao investimento com taxas mais baixas é bem compreendida por todos, não deixa de ser surpreendente que continuemos a viver com um sinal menos atrás. Parecemos já estar habituados, mas a verdade é que as taxas de crescimento não têm sido eufóricas. Vamos continuar o caminho e ver o que virá a seguir à curva.

 

Dean do ISEG - Lisbon School of Economics & Management

Universidade de Lisboa

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