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Dedo na ferida nos “Suecos do Sul”

O número “oficial” de infetados só teria uma relação direta com o desempenho do sistema de saúde se fosse “testada” toda a população, e a métrica fosse um valor relativo em percentagem da população, porque o número absoluto pouco ou nada transmite.

Já não é novidade a solidariedade entre os países do Sul da Europa, que a covid-19 fortaleceu, especialmente entre Portugal e Espanha. Cenário diferente, mas também que não é novidade, se avaliarmos a solidariedade entre o Sul da Europa e o Norte da Europa. Procurando elogiar o combate à pandemia pelas autoridades portuguesas, o jornal El País referiu-se a Portugal como os "Suecos do Sul". Apesar da boa intenção, é quase como comparar e encontrar semelhanças entre as ideologias do André Ventura e as ideologias da Catarina Martins.

 

A Suécia adotou uma política de combate à pandemia tendo por base não o recolhimento em casa, mas exatamente o contrário, defendendo a "imunidade de grupo", optando por não paralisar a atividade económica e social corrente. Políticas de saúde diametralmente opostas, em países em que a única semelhança será ter aproximadamente uma população idêntica à portuguesa, cerca de 10 milhões de habitantes, e com registos epidemiológicos não muito diferentes no que concerne à covid-19: a Suécia com cerca 12 mil infetados e 1.200 mortes; Portugal tem cerca de 18 mil infetados e 600 mortes.

 

Países como a Áustria ou a Hungria, também com população relativamente idêntica, em número, à portuguesa, mas geograficamente também perto dos grandes focos de contágio na Europa, nomeadamente Itália e Espanha, têm registado igualmente um número de infetados e de mortos que permite concluir, com o mesmo método, que há um desempenho sanitário também muito eficiente.

 

No entanto, os números de infetados e de mortos não têm uma relação direta com o desempenho do sistema de saúde, sem equacionar tantas outras variáveis. Por esta leitura, existem países pobres, com população de vários milhões de habitantes, como se observa em África, com meia dúzia de infetados e praticamente sem mortes associadas à covid-19. Será que têm um sistema de saúde excelente?

 

O número "oficial" de infetados só teria uma relação direta com o desempenho do sistema de saúde se fosse "testada" toda a população, e a métrica fosse um valor relativo em percentagem da população, porque o número absoluto pouco ou nada transmite.

 

Os suecos nada têm em comum com os portugueses, nem sequer em políticas de saúde. Esta é uma altura crítica em que devemos estar unidos, mas se formos rigorosos, muitas críticas podiam ser feitas à Direção-Geral da Saúde em Portugal, desde afirmações em que a probabilidade de o vírus chegar a Portugal seria muito baixa, que não se transmite facilmente de pessoa para pessoa, as dificuldades com as linhas da Saúde 24, a utilização generalizada ou não das máscaras, até à decisão do Conselho Nacional de Saúde ter concluído, em plena pandemia, não haver necessidade de encerrar as escola, na véspera de o Governo ter decidido pelo seu encerramento, entre ouros episódios e comportamentos menos felizes.

 

A única semelhança com a política de saúde sueca, que se não fosse triste, seria risível, foi o exemplo dado por alguns gabirus e energúmenos, antes de as autoridades imporem limitações à circulação, a invadir as praias, talvez, em busca da "imunidade de grupo".

 

De facto, por muito que procure, não há semelhanças entre suecos e portugueses. Os suecos são reconhecidos pela indústria do plástico, tiveram os Abba e a Volvo. Nós temos a cortiça, tivemos As Doce e a indústria dos moldes. Eles (e elas) são louros, altos e de olhos azuis. Nós somos morenos, baixos e de olhos castanhos. Não é melhor nem é pior, mas, seguramente, diferente. Eles tiveram o Olof Palme a querer acabar com os pobres e nós tivemos o Otelo Saraiva de Carvalho a querer acabar com os ricos, a acreditar numa conversa entre ambos a seguir ao 25 de Abril.

 

De facto, nem sequer a social-democracia sueca é parecida com o socialismo português…  

 

Diretor do ISG

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