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19 de Março de 2023 às 21:39

"No domínio da alimentação, o Governo merece ser criticado. Tem-se comportado como agente incendiário e irresponsável"

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre as medidas do Governo para combater a inflação, o risco no setor financeiro, as manifestações em França, entre outros temas.

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IDADE DE REFORMA EM FRANÇA

 

  1. A França está em pé de guerra com a decisão do Governo de aumentar de 62 para 64 anos a idade de acesso à reforma. Compreende-se que ninguém goste de ver aprovadas medidas que mexem com a sua situação. Mas, face ao que se passa na UE, será que os franceses têm razão para protestar? Os números não mentem. No quadro da UE, os franceses são uns privilegiados e não uns injustiçados – têm, em toda a União, a idade mais baixa de acesso à reforma.

 

  1. Vejamos os dados principais dentro da UE:
  • Os dois países com a idade de reforma mais baixa são a França e a Suécia (62 anos). Mas a Suécia vai subir para os 65 anos em 2026. E a Eslováquia também vai aumentar a sua idade de reforma(hoje 63 anos). Mesmo com a mudança para 64 anos em 2030, a França poderá continuar a ser o país com a idade de reforma mais baixa da UE.
  • Os dois países com a idade de reforma mais alta são a Itália e a Grécia (67 anos).
  • A média da UE está nos 65 anos, embora vá subir nos próximos anos, face às mudanças previstas em vários países.
  • Em Portugal, a idade de acesso â reforma está nos 66 anos e 4 meses, tendo-se reduzido em 3 meses, recentemente.
  • Há seis países em que a idade de reforma dos homens é superior à das mulheres, embora vários Países estejam a corrigir a situação.
  • Finalmente, em 11 países, entre os quais Portugal, a idade para a reforma está ligada à esperança de vida. A idade de reforma é mais alta ou menos alta consoante a esperança de vida aumente ou diminua.

 

 

NOVA CRISE NA BANCA?

 

  1. Quando ninguém esperava, eis que regressa o "fantasma" da crise financeira de 2008. Claro que as causas que dão origem aos novos problemas são muito diferentes do passado. E também é verdade que os bancos ocidentais em geral, e europeus em particular, estão hoje mais sólidos e seguros do que estavam antes. Tudo isto é indiscutível.

 

  1. Em qualquer caso, há riscos a ter em atenção:
  • Primeiro: o risco do Crédit Suisse. É um banco demasiado grande para poder cair, mas é um Banco cheio de problemas: tem prejuízos há vários anos; tem problemas graves de reputação; e tem um problema de opacidade que gera muita desconfiança.
  • Segundo: o risco de mais incerteza. Incerteza à escala global já temos que chegue. Mais incerteza nesta área acarreta, pelo menos, três novos problemas: menos crédito às empresas, porque os bancos se tornarão mais conservadores e prudentes; menos investimento no horizonte; menos crescimento económico e menos emprego.
  • Finalmente: o risco da subida ou não das taxas de juro. É um dilema sério. Continuar a subir taxas de juro pode ser um problema para alguns Bancos, que têm muita dívida pública, e que com juros mais altos a vêm desvalorizar. Mas parar a subida de juros com uma inflação alta pode ser o caminho para perpetuar uma inflação elevada anos a fio. O que seria um descalabro para todos: para a economia, as empresas e as pessoas. A inflação, como se vê, é um grande inimigo da coesão social.

Em síntese: não devemos alarmar nem desvalorizar. Mas monitorizar com atenção.

O CUSTO DE VIDA

 

  1. As medidas anunciadas pelo Governo no apoio ao arrendamento e ao crédito à habitação são consensuais e generosas. Merecem ser saudadas. Já no domínio da alimentação, o Governo merece ser criticado. Tem-se comportado como um agente incendiário e irresponsável.
  • Incendiária foi a atitude do Ministro da Economia. Lançou para cima de um sector, sem factos nem provas, as culpas da situação. Anteontem, recuou no seu populismo, mas o mal estava feito. Este Ministro é um erro de casting.
  • Irresponsável, porque o Governo não fez o que já devia ter feito: duas coisas. Primeiro, promover junto de uma entidade independente, tipo Autoridade da Concorrência, a realização de um estudo credível, da produção à distribuição, para ver com solidez onde há falhas. Segundo, promover um acordo com supermercados e hipermercados, como em França, para tentar baixar preços ou limitar a sua subida.
  1. Daqui a poucos dias, o Governo vai anunciar novas medidas de apoio aos mais carenciados. Aqui, o Governo deveria distinguir duas situações:
  2. Por um lado, as famílias mais pobres e vulneráveis. O apoio tem de ser financeiro. Estas famílias mais pobres já não pagam IRS.
  3. Por outro lado, a classe média. O Governo devia melhorar os seus salários por via da redução do IRS, até ao 6º escalão. É fácil de explicar: as famílias estão a perder rendimento e o Estado está a ganhar receita, cobrando mais impostos por causa da inflação. A situação devia ser equilibrada.
  • Se não quer baixar o IVA dos alimentos, por considerar que não gera resultados, então o governo devia baixar o IRS sobre a classe média. Aí o efeito é direto e imediato: melhora o salário das pessoas.

 

COSTA RESPONDE A MARCELO

  1. Marcelo acusou Costa de ter uma maioria requentada. Costa respondeu á letra: que não é verdade. Há uma tensão no ar entre PR e PM. Ao contrário do que possa pensar-se, esta tensão é útil ao país. Não se trata de o PR passar a ser oposição. Esse não é o seu papel. Mas, se Marcelo não fizer pressão sobre o Governo, o país afunda-se ainda mais.

 

  1. Vejamos os factos principais:
  • Primeiro: o Governo leva 7 anos de poder. Com exceção da redução do défice e da dívida, não tem obra a apresentar. A Saúde, a Educação, a Habitação ou a Justiça estão pior do que estavam há 7 anos.
  • Segundo: o Governo tem uma maioria absoluta, mas não sabe o que fazer com ela. Não tem um projeto transformador do país. É tudo pontual e casuístico. Verdadeiramente, o que há é navegação à vista.
  • Terceiro: o Governo já desistiu de qualquer ideia reformista. Agora, a sua grande preocupação é a comunicação e a propaganda. Anda a contratar em força profissionais de comunicação. Até o "guru" do sector, Luís Paixão Martins, foi contratado pelo PS. Um Governo que troca a política pela propaganda é um governo em fim de ciclo. É que o problema deste governo não é um problema de comunicação. É um problema político. De falta de ação e de resultados.

 

  1. Neste quadro, se o PR recuar nas críticas e deixar de fazer pressão sobre o Governo, então o país vai afundar-se ainda mais. Os sinais estão todos aí. Não é por acaso que, numa sondagem divulgada este fim de semana, 60% dos portugueses querem que o PR critique mais o Governo e seja mais interventivo.

 

 

 

"CRIMES" DE SÓCRATES PRESCREVEM?

 

  1. A Operação Marquês e o caso José Sócrates estão a transformar-se muito rapidamente numa autêntica bomba-relógio. Daqui a um ano podemos começar a ter prescrições. O país vai indignar-se. A política e a Justiça não vão sair-se bem da situação. É melhor avisar já. Antes que seja tarde. Vejamos:
  • Esta investigação já leva cerca de 10 anos. Começou em 2013 e ainda nem sequer há julgamento marcado. Nem haverá em 2024.
  • De quem é a culpa? Primeiro, da criação de um megaprocesso, o vicio original; depois, de Sócrates, que tem dinheiro para "empatar" os tribunais com manobras dilatórias, beneficiando do facto de termos uma Justiça para ricos e outra para pobres; e, agora, do Governo e da Ministra da Justiça. O Governo falhou inexplicavelmente o prazo para regulamentar uma lei da AR sobre o sorteio eletrónico dos Juízes. Sócrates está a aproveitar-se desta falha. Abusa dos incidentes processuais para fazer adiar o seu processo.

 

  1. Para além desta falha, o Ministério da Justiça está hoje completamente paralisado. A greve dos oficias de justiça é outro exemplo emblemático. Esta greve está a perturbar seriamente os tribunais. A criar dificuldades enormes. O problema não se resolve com pedidos de parecer ao CC da PGR. Os oficiais da justiça têm razão na maior parte das suas exigências. São, no essencial, exigências justas. É preciso que o MJ saiba dialogar, agir e resolver.

 

A INDISCIPLINA NA MARINHA

 

  1. Alguns militares recusaram-se a cumprir ordens superiores e a embarcar no Navio Mondego, da Marinha Portuguesa, alegando que ele oferecia perigo. Este é um ato de indisciplina especialmente grave. Não pode ser tolerado:
  • Primeiro, já não estamos no tempo do PREC, de 1974 e 1975, e da legitimidade revolucionária do pós-revolução;
  • Segundo, esta insubordinação mina a imagem das Forças Armadas e a reputação do país junto dos seus parceiros do NATO;
  • Terceiro, mesmo que houvesse risco, a obrigação dos militares era cumprir a decisão do Comando do Navio. São as regras da vida militar.

 

  1. Perante esta situação, o CEMA foi criticado por excesso na repreensão pública dos militares e por exagero no protagonismo mediático. Mas eu compreendo a sua explicação: se o caso se tornou público, a reafirmação da disciplina também tinha que se fazer de forma pública.

 

  1. O mais preocupante de tudo: a imagem "desgraçada" que o país vai cultivando das suas Forças Armadas. Há uns anos, foi o assalto a Tancos; há meses, foram os Leopard 2 que não podiam ir para a Ucrânia porque estavam inoperacionais; agora, é a indisciplina na Marinha. Como diz Pacheco Pereira, no Público de ontem, os Portugueses já dão pouca relevância às suas Forças Armadas. Acham que não servem para nada. Com estes maus exemplos, passam da pouca relevância para a indiferença total. Nada disto é bom. O País precisa de umas FA com uma dimensão equilibrada, mas muito profissionais e prestigiadas.
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