Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes no seu comentário na SIC. O comentador fala sobre Cristina Ferreira e os políticos, os três anos de mandato de Marcelo e a visita do Presidente da República a Angola, Neto de Moura e a violência doméstica, a sondagem SIC/Expresso e a “lei” sobre Tomás Correia.
CRISTINA FERREIRA E OS POLÍTICOS
Três apontamentos:
- Primeiro: não é a primeira vez que dirigentes políticos vão a um programa desta natureza. Já sucedeu, nos anos 90, por exemplo com Herman José.
- Segundo: o grande mérito é de Cristina Ferreira. Para além da sua simpatia, teve o talento de criar um programa de grande audiência.
- Terceiro: não vejo qualquer mal em que os dirigentes políticos participem neste tipo de iniciativas.
- Fazem-no obviamente com o propósito de se tornarem mais populares. Mas isso é normal. Qualquer político procura ser popular.
- Mas, para além disso, estas iniciativas têm uma grande vantagem: humanizam os políticos, estreitam a sua relação com o povo, tornam-nos mais próximos das pessoas e mais afectuosos.
- Nesse plano, acabam por indirectamente ser iniciativas que melhoram a qualidade da democracia e ajudam a combater tentações populistas.
MARCELO – TRÊS ANOS DEPOIS
- Há, sobretudo, quatro conclusões a tirar destes três anos de mandato:
- Primeira: é um Presidente diferente de todos os outros. Diferente de Cavaco Silva, Jorge Sampaio ou Ramalho Eanes. Mas também diferente de Soares, aquele que teve mais semelhanças com Marcelo. É que Mário Soares era uma espécie de Presidente/Rei. Era adorado pelo povo, mas cultivava em relação ao povo uma certa distância. Já Marcelo é o autêntico Presidente do Povo. Está com o povo, procura o povo, mistura-se com o povo.
- Segunda: é um Presidente genuíno. O que Marcelo faz hoje como Presidente já fazia antes de ser Presidente. Já tirava selfies, abraçava as pessoas, era hiperactivo e comunicativo. Isto significa que não se descaracterizou. É igual a si próprio. Um político genuíno e não artificial.
- Terceira: é o Presidente certo no tempo certo. Depois da grave crise que tivemos, com forte austeridade e sacrifícios, a sociedade estava muito crispada e o risco de populismo era grande. Marcelo, com o seu estilo, ajudou a descrispar o ambiente e a combater o populismo. Porque está próximo das pessoas. Porque lhes dá voz e atenção. Porque faz aumentar a sua auto-estima e a confiança nas instituições. Porque faz pedagogia democrática.
- Quarta: Marcelo reequilibrou o nosso regime semi-presidencial. Uns dizem que MRS ultrapassa os seus poderes. Outros afirmam que está a mudar o regime. Nem uma coisa nem outra. Marcelo está a reequilibrar o nosso regime semi-presidencial. O regime estava muito inclinado para o lado do "presidencialismo do PM". Marcelo, com o seu forte intervencionismo, reequilibrou-o. O que é positivo para a democracia e coerente com um PR directamente eleito pelo povo.
- Claro que pode ter um excesso ou outro. É o preço a pagar por este estilo. Mas se não o praticasse o risco poderia ser ainda maior – seria o risco de uma sociedade crispada, dividida e com tentações populistas.
A VISITA DO PR A ANGOLA
- Esta visita foi um enorme sucesso – sucesso político e sucesso popular.
- O sucesso político está traduzido numa expressão muito feliz do Presidente João Lourenço: "As nossas relações estão no pico da montanha".
- O sucesso popular foi o que se viu nas ruas. Simplesmente fabuloso. É aqui que MRS é um Presidente diferente. Qualquer um dos seus antecessores poderia fazer uma visita com idêntico sucesso político. Mas nenhum deles conseguiria o sucesso popular que Marcelo conseguiu. Há, de facto, um "efeito Marcelo" – na empatia, na simplicidade, no afecto, no gosto de estar com o povo, no talento para fazer um discurso diferente do tradicional.
- Concluída esta visita, é tempo de dizer: os políticos (Presidente e Governo) fizeram o seu trabalho e fizeram-no bem. Acabaram com as nuvens negras na relação Portugal/Angola. Agora é a hora dos empresários. É o tempo de os empresários portugueses aproveitarem a auto-estrada que foi criada.
Oportunidades não faltam em Angola:
- Aposta na diversificação da economia;
- Um vasto processo de privatizações a começar;
- Um ambiente de maior transparência e menor corrupção;
- Leis mais favoráveis ao investimento estrangeiro;
- E, no momento em que a economia europeia está a arrefecer, é bom que os empresários portugueses pensem também em diversificar os seus locais de investimento.
- A verdade é esta: Angola precisa de Portugal para a sua recuperação económica; e Portugal precisa de Angola para a internacionalização da sua economia. Ambos podem fazer uma parceria estratégica de largo alcance.
A "LEI" SOBRE TOMÁS CORREIA
- Boa notícia – O Governo aceitou a sugestão para alterar a lei (Código Mutualista) sobre a questão da idoneidade dos gestores. Não tinha grande alternativa. Mas ainda bem. Esperemos, agora, que faça a alteração como deve ser – no plano da idoneidade e do registo. E não volte a ser equívoco.
- Má notícia – Tomás Correia e outros antigos gestores do Montepio foram condenados pelo Banco de Portugal a pagar um conjunto de multas.
- A questão indecorosa é que quem vai pagar estas multas e outras despesas dos processos não são os gestores condenados mas sim o Banco Montepio.
- Porquê? Porque Tomás Correia fez aprovar essa obrigação para o Banco numa AG, meio à socapa.
- Isto é, na prática, uma fraude. Condena-se um gestor mas quem paga não é o gestor. É a instituição.
- É caso para dizer que Ricardo Salgado deixou muitos discípulos!!
NETO DE MOURA E A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
- As insensatas e inacreditáveis considerações do Juiz Neto de Moura fizeram provavelmente mais pela causa do combate à violência doméstica que muitos discursos, campanhas e manifestações. Porquê? Primeiro, porque acordaram a sociedade; depois, porque indignaram os cidadãos; finalmente, porque mobilizaram o país, de norte a sul, em favor de uma causa urgente e nacional. Foi extraordinário.
- Fica mesmo a sensação de que também o Governo e os partidos estavam adormecidos e que só anunciaram agora um conjunto de medidas como resposta à mobilização que existiu na opinião pública. Em qualquer caso, convém ter em atenção duas questões:
- Primeiro: espera-se que não haja precipitações nas novas medidas a aprovar. Decidir a quente e em cima do joelho normalmente dá asneira.
- Segundo: espera-se ainda que, passado este frenesi mediático, o tema não seja esquecido. Como alguém disse, um dia de luto é simbolicamente importante, mas um ano inteiro de luta é absolutamente essencial.
- No meio de tanta insensatez, merece uma palavra de elogio o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, Nuno Ataíde das Neves. Foi um exemplo de sensatez e de equilíbrio:
- Primeiro, ao transferir o Juiz Neto de Moura da secção criminal para a secção cível. Bom para o Juiz e para a credibilidade da justiça.
- Depois, ao explicar que muitas das considerações que geraram uma maré de indignação eram dispensáveis. Tem toda a razão.
- Finalmente, ao aconselhar Neto de Moura a não avançar com processos judiciais contra os que o criticaram. É outra tontaria que o Juiz, apesar de ter esse direito, devia evitar.
A SONDAGEM SIC/EXPRESSO
- Os indicadores desta sondagem são: bons para o PCP (igual ao resultado de 2015); aquém das expectativas para o BE e o CDS (desejam mais); maus para o PSD (25% é dos piores resultados de sempre); bons mas não brilhantes para o PS (ganha as eleições mas longe da desejada maioria absoluta).
- Em termos de acção, constata-se que o Governo está a tentar reganhar iniciativa política. Estava a perder o pé à situação e vê-se que quer voltar a agir e liderar a esquerda. Arrumou rapidamente o dossier dos professores, porque era incómodo. Vai iniciar negociações com os enfermeiros, para evitar novo calcanhar de Aquiles. O PM vai fazer um roteiro pelo país dedicado à saúde. Tentou liderar a causa do combate à violência doméstica. São tudo exemplos de uma nova postura do Governo, mais ofensiva e não só reactiva.
- Difícil de compreender é o PSD – está parado quando devia estar activo.
- O PSD tem, neste momento, duas realidades importantes a seu favor: primeiro, desapareceram as guerras internas; depois, o Governo atravessa o período de maiores dificuldades do seu mandato.
- O PSD devia estar a aproveitar esta oportunidade. Rui Rio devia estar a fazer uma volta pelo país como candidato a PM, ouvindo as pessoas, apresentando as suas ideias e mobilizando o eleitorado; e o Partido devia estar a ter iniciativa, a apresentar as suas alternativas sectoriais, a definir as suas causas essenciais. Apesar disso, está muito parado.
- Ou seja: se o PSD, quando o Governo está no seu pior momento, não vai a jogo, não chuta à baliza, não faz golo, então quando é que vai recuperar os 12 pontos de atraso que tem para o PS? Depois das Europeias pode ser tarde: se o resultado for mau, o PSD fica abalado política e animicamente e parte derrotado para as Legislativas.