Opinião
A esquina do Rio
Este é provavelmente o maior fracasso da nossa democracia: depois de entrar na Europa, Portugal não é capaz de responder para onde caminha.
Gosto
Da possibilidade de uma revisão da lei eleitoral que possibilite mais candidaturas independentes, fora dos partidos, nas autárquicas.
Não gosto
Que a candidatura de Assunção Cristas à Câmara Municipal de Lisboa seja anunciada em Oliveira do Bairro, sem apresentar uma ideia para a cidade por onde quer ser eleita.
Arco da velha
A Assembleia da República, maioritariamente constituída por advogados e juristas, pretende que a profissão de advogado fique fora da regulamentação de lobbying junto dos parlamentares.
Back to basics
Um pessimista só tem surpresas agradáveis e um optimista desagradáveis.
Nero Wolfe, via Rex Stout
Dixit
Este é provavelmente o maior fracasso da nossa democracia: depois de entrar na Europa, Portugal não é capaz de responder para onde caminha.
Sérgio Figueiredo
Semanada
Depois da entrevista televisiva do juiz Carlos Alexandre, onde este se queixou de estar a ser vigiado, José Sócrates pediu o afastamento daquele magistrado do seu processo • o PCP foi o partido que mais se insurgiu contra a proposta de facilitar candidaturas autárquicas independentes • Marcelo criticou a baixa taxa de uso dos fundos europeus • em resposta o Governo anunciou que está a preparar o lançamento de concursos de financiamento, no valor global de 527 milhões de euros, mesmo a tempo das próximas eleições autárquicas • os combustíveis representaram um quinto da receita do Estado com Impostos sobre Produtos em 2014, num total de 4.100 milhões de euros e a distância média entre cada bomba de gasolina é de 2,7 kms • a Autoridade da Concorrência traçou como objectivo que 85% das notícias sobre a sua actividade lhe sejam favoráveis • a juíza conselheira Dulce Neto, vice-presidente do Supremo Tribunal Administrativo, afirmou que "a administração fiscal está cega de mais na tentativa de arrecadar receita, deixando empresas e famílias exauridas", criticando o facto de as Finanças arrastarem propositadamente processos tributários com recursos quando, disse, é muito provável que essas acções venham a ser decididas a favor do contribuinte • a Comissão de Proteção de Dados continua a considerar o acesso do fisco aos saldos bancários excessivo e desproporcional • o ministro das Finanças admitiu que os impostos indirectos vão aumentar no próximo Orçamento • a propósito da situação económica do país e da eventualidade de novo resgate, António Costa sugeriu que Passos Coelho fosse caçar pokémons.
Mentiras
A edição da semana passada da revista The Economist tinha por título de capa a frase "A Arte da Mentira" e em vários artigos dedicava-se a explicar como a mentira tinha invadido a política a vários níveis. Segundo a revista, a política da "pós-verdade" é baseada num conjunto de afirmações que "parecem ser verdadeiras" mas não têm qualquer ligação com factos reais. The Economist explica que o expoente desta "post-truth" é Donald Trump e a forma como a sua campanha é conduzida. "Se acreditam que a política devia ser baseada na realidade, esta é uma tendência preocupante" - escreve o editorialista da revista. O uso da mentira na política tornou-se tão habitual que já nem levanta grandes sobressaltos - muito menos entre as auto-proclamadas elites. Na realidade, o que distingue a nova utilização da pós-verdade é o facto de a verdade ser secundarizada em absoluto. O que interessa é o que alguém diz ou, pior ainda, insinua, nomeadamente fora dos media tradicionais. Ao longo dos últimos anos, em Bruxelas, Bona e Lisboa, assistimos a um carrossel de mentiras e insinuações, destinadas a proteger os burocratas da União Europeia e os seus congéneres portugueses - muitas delas simples boatos postos a correr ao mais alto nível para testar reacções. Rumores, intriga, má língua - tudo convenientemente ampliado, se necessário, pelas novas formas de comunicação digital - ajudam a criar este novo fórum político, onde a inverdade é o conteúdo principal. É raro o líder político que não diz mentiras nas campanhas eleitorais, e, nos últimos 20 anos, não há em Portugal nenhum que nas campanhas eleitorais não tenha feito promessas mentirosas que abandona mal chega ao poder. A mentira é o vírus que destrói a confiança nos políticos e que afasta as pessoas da participação política. Os responsáveis por isto estão nos partidos. Em todos.
Folhear
A revista Wallpaper foi criada em 1996, há 20 anos portanto, por Tyler Brûlé que, entretanto, a vendeu e criou a Monocle . No entanto, a Wallpaper manteve-se como uma referência nos campos do design, da arquitectura, da moda, da arte e , como diz o slogan da revista, "The stuff that refines you". Para assinalar este aniversário a Wallpaper fez uma edição especial com mais de 500 páginas, abordando temas como as figuras que marcaram, pelas mudanças que provocaram, estas duas décadas, os grandes acontecimentos que ocorreram e também 20 anos de novas tendências no design. A capa é, desde logo, um desafio aos leitores - foi idealizada para ser cortada e remontada ao gosto de cada um, chamando ao papel uma interactividade que se julgava impossível. Esta Wallpaper transporta-nos também ao futuro numa série de artigos e reportagens que mostram novas tendências, nomeadamente na arquitectura, na recuperação de edifícios históricos ou, ainda, na concepção de novas lojas. Na arquitectura há um destaque para um projecto do arquitecto português Luís Rebelo de Andrade, no Douro, o hotel e spa Longroiva, a 5 kms de Vila Nova de Foz Côa. Nesta edição da Wallpaper é apresentado um incontornável trabalho gráfico, o desdobrável que mostra com palavras e imagens a linha do tempo da evolução do design nestas duas décadas. Outro artigo fundamental é sobre a vídeo instalação "Mary", que o artista Bill Viola concebeu para a catedral de St. Paul, em Londres, e que inaugurou no passado dia 8. A nova instalação vídeo ficou colocada em frente a uma outra, também de Bill Viola, "Martyrs", colocada na catedral há dois anos. Os ecrãs de plasma utilizados em "Mary" evocam um tríptico e o jornal The Guardian descreveu a obra como "um Caravaggio hi-tech que redefine a arte sacra". Mais uma razão para ir a Londres. Obrigado, Wallpaper.
Ouvir
Foi há mais de 50 anos que os Beatles actuaram no célebre Hollywood Bowl, o mítico auditório da capital do cinema norte-americano. Coincidindo com o lançamento de um novo documentário, de Ron Howard, sobre os primeiros anos da carreira dos Beatles, "Eight Days A Week - The Touring Years", foi lançada uma nova versão, remasterizada e com inéditos, das gravações ao vivo dos concertos dos Beatles no Hollywood Bowl, realizados a 23 de Agosto de 1964 e a 29 e 30 de Agosto de 1965. Na prática, a edição é apresentada como uma espécie de banda sonora do filme de Howard, que estreou em Lisboa esta semana. Para além de temas daquela fase da carreira da banda, como "Twist And Shout", "Ticket To Ride", "She Loves You" ou "Help", entre outros, esta nova edição inclui quatro gravações inéditas de temas também célebres como " I Want To Hold Your Hand" ou "Everybody's Trying To Be My Baby". Ao todo são 17 canções, todas remasterizadas pelo filho de George Martin, Giles Martin. As gravações, recorde-se, foram feitas no auge da beatlemania nos Estados Unidos e captam a excitação do público nessa época, assim como a energia do grupo. Em 1977 havia sido editada a primeira versão de "The Beatles At The Hollywood Bowl", com base nas mesmas gravações, mas com um alinhamento diferente e menos material. Nesta edição, destaque para a boa remasterização que proporciona som mais limpo e inclui pequenas variações na mistura e níveis de som, e também gritos mais atenuados da assistência. O novo CD (e vai também ser lançada uma edição em vinil) inclui um booklet de 24 páginas com texto de David Fricke, jornalista da revista norte americana Rolling Stone, a reprodução de uma reportagem dos concertos no Los Angeles Times e as notas da edição original em vinil, por Sir George Martin. CD Apple Music/ Universal já disponível em Portugal.
Ver
Como pode a imprensa jogar com a memória e ser a matéria-prima de um artista plástico? - A resposta está na exposição de Nuno Nunes-Ferreira que a Baginski, Galeria/Projectos apresenta até 22 de Outubro. A partir de recortes cuidadosamente seleccionados de jornais e revistas, alguns com mais de meio século, Nunes-Ferreira revisita o nosso passado colectivo, desde a época colonial até anos mais recentes, escolhendo títulos, frases, fotografias, capas, publicidade. Há obras com recortes de imagens de futebol, outras só com recortes de necrologia, outras ainda com declarações de Maio de 1974, transcrevendo certificados da Junta de Salvação Nacional, atestando que fulano não era da PIDE, até anúncios de cavalheiros à procura de senhoras e vice-versa, ou capas dos jornais dos dias seguintes ao 25 de Abril, tudo devidamente recortado e apresentado como numa colagem. As imagens mais contemporâneas estão alojadas em gavetas de móveis tipográficos antigos, que fazem também parte da exposição. No tempo digital, esta exposição é uma redescoberta da imprensa e uma perspicaz observação de vários momentos da sociedade portuguesa e da marca que esses momentos deixaram em papel. Num dos cantos da galeria, discretamente, está um desenho, reproduzindo uma capa de jornal, sem nenhum conteúdo, e que dá pelo nome de "Não Há Notícias". Baginski, Rua Capitão Leitão 51, ao Beato.
Provar
Qualquer novo restaurante que se preze precisa de uns meses para ser afinado. Quando se carrega no nome uma tradição, como acontece no caso do Pap'Açorda, a coisa é ainda mais verdadeira, sobretudo quando se dá a transição de um espaço icónico, como o que existia no Bairro Alto, para uma Disneylândia da comida, como é o Mercado da Ribeira hoje em dia. Esta transição foi uma aposta arriscada mas agora, uns meses depois da abertura, tudo começa a estar no seu lugar, até mesmo alguns dos clientes antigos. Esta semana tive oportunidade de provar uma salada de garoupa com vinagrete, umas tiras de chocos bem cozinhadas acompanhadas de grelos salteados e, sobretudo, um delicioso polvo estufado em vinho tinto, temperado com anis, cravinho, gengibre e canela, acompanhado de uma esmagada de batata doce. O restaurante vai ganhando personalidade própria, não abdicando da sua memória - como se vê nas entradas com os pequenos pastéis de massa tenra ou os peixinhos da horta, e nas sobremesas, com a incontornável mousse de chocolate. O serviço funciona bem, atento e simpático, e o comandante das operações, Ricardo Fernandes, está permanentemente vigilante à sala e sempre disponível. Aqui está um restaurante que soube mudar e crescer, sem perder alma nem encanto. Av. 24 de Julho, Mercado da Ribeira, das 12h às 24h, todos os dias, menos segunda-feira. Telefone 213 464 811.