Opinião
A esquina do Rio
É oficial: o sol, quando nasce, não é para todos. As casas com mais sol serão penalizadas pelo Fisco
Back to basics
Quem tem cera na cabeça não deve andar ao sol.
Benjamin Franklin
E respirar, podemos?
É oficial: o sol, quando nasce, não é para todos. As casas com mais sol serão penalizadas pelo Fisco, por acaso tutelado pelo homem que aceitou viagens à borla a França para ver jogos do Euro, pagas pela Galp, empresa que tem um contencioso fiscal com o Estado superior a cem milhões de euros. Rocha Andrade, o governante em causa, disse à revista Sábado que não via no assunto qualquer incompatibilidade ou conflito ético e que encarava "com naturalidade, e dentro da adequação social, a aceitação deste tipo de convite". O homem foi um dos redactores do código de ética para candidatos a deputados do PS, lançado por António Costa em 2015, e só depois de noticiada a oferenda resolveu dizer que queria reembolsar a Galp da despesa feita. Se o ridículo pagasse imposto, este homem, sozinho, resolvia o problema do país. Vale a pena recordar que esta é a mesma criatura que quer andar atrás dos vendedores de bolas-de-berlim e de gelados na praia, que quer aumentar a tributação das casas que têm vista e por onde o sol entra sem receios. Este homem, que acha natural, sendo Governo, aceitar presentes de quem está em litígio com o Estado que ele representa, é copista de uma medida medieval inglesa, The Window Tax, de 1696, como bem explicou neste jornal Fernando Sobral, recordando uma frase de Charles Dickens: "Nem o ar, nem a luz são grátis." O tema fiscal mereceu esta semana no Facebook várias citações interessantes, que reproduzo. O Professor José Maltez, sobre a matéria, teceu o seguinte comentário: "Ainda ninguém se lembrou do imposto de isqueiro, ou do regresso ao papel selado? Não há alma geringonça capaz de emitir uma simples regra: as avaliações serão feitas conforme os preços do mercado?" Sobre a sanha fiscal, Luís Paixão Martins contou uma história estival: "Como é que tu, paizinho, contribuis para o progresso de Portugal? Orgulho-me de andar nas praias a ver se os ricalhaços das bolas-de-berlim passam factura." Talvez por tudo isto o publicitário Manuel Oliveira se tenha saído com esta: "A minha casa tem vista para S. Bento. Posso considerar que tenho vista para uma ETAR e pedir isenção do IMI?"
Dixit
Lisboa atingiu o máximo cosmopolitismo. Tem um presidente (não eleito) que sabe ser simultaneamente o terramoto e o Marquês de Pombal.
António Homem Cardoso
Semanada
• As exportações para o Brasil caíram 21% desde o início do ano • 80% dos alunos do 5.º ano falham a Matemática • em ano e meio, foram apanhados 13 mil condutores sem carta de condução • há chumbos em quase metade dos exames de código de estrada • entre os políticos portugueses, Marcelo Rebelo de Sousa é o que regista mais menções no Twitter desde o início do ano • os polícias estão proibidos de aceder a redes sociais enquanto estão em serviço • em Custóias, foi assaltada a máquina automática de venda de tabaco que abastecia a prisão • a natalidade em Portugal está a subir pelo segundo ano consecutivo • em Armação de Pêra, há quem vá marcar lugar na praia às sete da manhã com chapéu de sol e toalha • são recebidos 70 pedidos de ajuda por dia no centro de informação antivenenos • os sites de jornais, revistas e de notícias portugueses receberam perto de cinco milhões de visitantes durante o primeiro semestre do ano, segundo os dados do Netpanel da Marktest • mais um recorde nacional: a dívida pública atingiu em Junho os 240 mil milhões de euros - resta saber quem leva a medalha • Rocha Andrade foi o segundo membro deste Governo a propor restituir verbas, apenas depois de ter sido confrontado com factos polémicos.
Folhear
A Egoísta é um prazer colectivo - para quem a idealiza e faz e, sobretudo, para quem tem a oportunidade de a folhear, guardar e ir relendo ao passar do tempo. A edição do Verão, publicada no início de Julho, é dedicada a Lisboa - uma Lisboa destruída pelo triunvirato Medina-Salgado-Sá Fernandes. Qualquer semelhança entre a beleza e encanto da cidade e o caos e destruição que se sente na capital são pura coincidência. Pedro Bidarra, na sua coluna semanal no Diário de Notícias, sublinhou que, face a um candidato decente de outra orientação política, "o Medina, o principezinho herdeiro, não teria a mínima hipótese. É que Lisboa não vai com qualquer um." No entretanto, o Medina, que não é da cidade, vai dando cabo dela. Mas adiante, que a Egoísta é o que agora interessa. O facto de esta edição ser dedicada à cidade tem que ver com o facto de o Casino Lisboa estar a celebrar o seu décimo aniversário. E esta é uma bela edição. Desde logo pela capa e as páginas de abertura, que mostram Leonor Poeiras como um corvo, idealizada e fotografada por Carlos Ramos e vestida por Filipe Faísca. Mas há mais na revista: boa prosa de Rui Cardoso Martins, Nuno Miguel Guedes, Patrícia Reis, José Navarro de Andrade ou Teolinda Gersão, ilustrações de Ricardo Cabral (que desenhou o Torel), Rodrigo Saias e André Carrilho, fotografias de Augusto Brázio (Monsanto), Pedro Teixeira Neves (Lisboa) e Pedro Ferreira, para além de uma recolha de trabalhos de Vihls nas paredes da cidade. Uma edição alfacinha.
Gosto
Desta afirmação de João Villalobos: "O sol, quando nasce, é para o imposto."
Não gosto
Do cancelamento da 12.ª edição da exposição World Press Cartoon, que estava agendada para este ano em Cascais.
Ver
Rever "Barry Lyndon" em cópia digital é uma surpresa. Com boa projecção e bom som, o restauro digital que o Cinema Ideal (ao Chiado) exibe até 17 de Agosto permite ter uma ideia clara do que era a luz que Stanley Kubrick quis mostrar. A luz molda as cores - nas paisagens, mas também nos interiores, iluminados apenas por velas e filmados com as lentes especiais da Zeiss que Kubrick utilizou. Após todo este tempo (o filme é de 1975, foi produzido há 41 anos), é impressionante voltar a ver os enquadramentos rigorosos, a reconstituição das cenas de batalhas, o crescendo de emoção desde os primeiros planos do filme, com Redmond Barry, ainda adolescente, a ser seduzido pela prima. Ryan O'Neal tinha 34 anos e Marisa Berenson tinha 28 quando o filme foi estreado. Na altura, houve quem pensasse que era uma obra menor de Kubrick, depois de "2001: A Space Odissey" e de "Clockwork Orange", antes dos seus derradeiros três filmes - "The Shining", "Full Metal Jacket" e "Eyes Wide Shut". Mas hoje fica mais fácil perceber que Kubrick percorreu em Barry Lyndon a sua visão da natureza humana, utilizando um tempo fora do seu próprio tempo para reflectir sobre a evolução dos costumes. Outras recomendações para ver neste mês de Agosto: uma mostra da história dos jogos Majora ao longo dos seus 77 anos, no Espaço Amoreiras, Rua D. João V 24; "Auto Retrato em Solidó", de Ana Jotta, na Galeria Miguel Nabinho, Rua Tenente Ferreira Durão 18; "Sombras, Máscaras e Títeres da Colecção do Museu da Marioneta", obras de António Viana, Francisco Tropa, Jorge Queiroz e Susanne Themlitz, na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional; no Espaço Chiado (Rua da Misericórdia 12), a série "Anatomia do Boxe", de Jorge Molder, criada em 1997, que está na colecção António Cachola, e que é exposta em conjunto em Lisboa pela primeira vez.
Arco da velha
Um estudo recente indica que, dos sete mil milhões de habitantes do planeta, cerca de seis mil milhões têm acesso a telefones móveis, mas apenas 4,5 mil milhões têm acesso a instalações sanitárias domésticas em condições.
Provar
Se nestes dias quentes quiserem uma esplanada, não vão à Champanheria do Saldanha. Na realidade, a utilização do termo champanheria no nome deste restaurante é um equívoco porque a bebida - e sobretudo o seu equivalente português, o espumante - não têm ali qualquer favorecimento. É, por exemplo, incompreensível que não haja uma selecção de champanhes e espumantes servidos à flute e é ainda menos compreensível que, quando se pede uma garrafa de espumante (da reduzida selecção existente), se coloquem na mesa copos de vinho em vez de flutes. A coisa piora quando, feita a observação, a empregada fica a olhar para nós com ar de caso e responde que vai ver o que é possível. Passado um bom bocado, lá acabou por arranjar umas flutes publicitárias de uma marca francesa. A chegada ao local fica, pois, assim descrita. O restaurante tem uma esplanada no pátio interior do prédio, com a maioria das cadeiras desconfortáveis e mesas pequenas, em contraste, aliás, com o cuidado da decoração do interior. O sítio podia ser ameno se não existisse um som despropositadamente alto, a sair de colunas instaladas demasiado perto das mesas. Em resumo, a esplanada tinha tudo para ser simpática, o serviço é completamente antipático e a comida é mediana. As lascas de bacalhau em tempura estavam demasiado oleosas, o tártaro de atum sabia mais aos condimentos do que ao atum e tinha como acompanhamento apenas tostas industriais, sem qualquer vestígio de salada. Os goujons de dourada salteada com legumes acabaram por ser a escolha mais acertada de uma noite que podia ter sido simpática e ficou aquém das expectativas. E o preço? A relação qualidade/serviço/preço merece nota negativa. Muito negativa. São preços desajustados para a oferta produzida.
Ouvir
Lou Rhodes é uma cantora oriunda de Manchester e tornou-se conhecida por ser, digamos, metade dos Lamb. Com utilização apenas ocasional de sonoridades contemporâneas e essencialmente baseada em soluções acústicas, a carreira a solo de Lou Rhodes vai já no seu quarto disco. Este "Theyesandeye" conjuga canções de amor com baladas que manifestam recorrentes preocupações ambientais, tudo cantado com uma voz etérea, carregada de sedução e sentimento. A sua voz é envolvente e tem um timbre provocante e sedutor. O The Guardian diz que ela evoca Nick Drake, outras vezes Carole King e até Alanis Morissette. Os arranjos das 11 canções são exemplares e a sonoridade de instrumentos acústicos, como a harpa, ajudam a criar um ambiente musical especial, que está reduzido ao essencial, deixando amplo espaço para a voz e as palavras. Numa época em que as sonoridades se repetem, este disco de Lou Rhodes aparece como uma pedrada no charco. O facto de ela, a solo, ter evoluído num caminho completamente diferente das sonoridades dos Lamb mostra também como Rhodes se preocupa em fazer algo de novo e original na sua carreira. Mesmo que para isso recorra a princípios básicos, musicais e temáticos, do folk. "Theyesandeye", CD Nude Records, no Spotify.
Quem tem cera na cabeça não deve andar ao sol.
Benjamin Franklin
E respirar, podemos?
É oficial: o sol, quando nasce, não é para todos. As casas com mais sol serão penalizadas pelo Fisco, por acaso tutelado pelo homem que aceitou viagens à borla a França para ver jogos do Euro, pagas pela Galp, empresa que tem um contencioso fiscal com o Estado superior a cem milhões de euros. Rocha Andrade, o governante em causa, disse à revista Sábado que não via no assunto qualquer incompatibilidade ou conflito ético e que encarava "com naturalidade, e dentro da adequação social, a aceitação deste tipo de convite". O homem foi um dos redactores do código de ética para candidatos a deputados do PS, lançado por António Costa em 2015, e só depois de noticiada a oferenda resolveu dizer que queria reembolsar a Galp da despesa feita. Se o ridículo pagasse imposto, este homem, sozinho, resolvia o problema do país. Vale a pena recordar que esta é a mesma criatura que quer andar atrás dos vendedores de bolas-de-berlim e de gelados na praia, que quer aumentar a tributação das casas que têm vista e por onde o sol entra sem receios. Este homem, que acha natural, sendo Governo, aceitar presentes de quem está em litígio com o Estado que ele representa, é copista de uma medida medieval inglesa, The Window Tax, de 1696, como bem explicou neste jornal Fernando Sobral, recordando uma frase de Charles Dickens: "Nem o ar, nem a luz são grátis." O tema fiscal mereceu esta semana no Facebook várias citações interessantes, que reproduzo. O Professor José Maltez, sobre a matéria, teceu o seguinte comentário: "Ainda ninguém se lembrou do imposto de isqueiro, ou do regresso ao papel selado? Não há alma geringonça capaz de emitir uma simples regra: as avaliações serão feitas conforme os preços do mercado?" Sobre a sanha fiscal, Luís Paixão Martins contou uma história estival: "Como é que tu, paizinho, contribuis para o progresso de Portugal? Orgulho-me de andar nas praias a ver se os ricalhaços das bolas-de-berlim passam factura." Talvez por tudo isto o publicitário Manuel Oliveira se tenha saído com esta: "A minha casa tem vista para S. Bento. Posso considerar que tenho vista para uma ETAR e pedir isenção do IMI?"
Lisboa atingiu o máximo cosmopolitismo. Tem um presidente (não eleito) que sabe ser simultaneamente o terramoto e o Marquês de Pombal.
António Homem Cardoso
Semanada
• As exportações para o Brasil caíram 21% desde o início do ano • 80% dos alunos do 5.º ano falham a Matemática • em ano e meio, foram apanhados 13 mil condutores sem carta de condução • há chumbos em quase metade dos exames de código de estrada • entre os políticos portugueses, Marcelo Rebelo de Sousa é o que regista mais menções no Twitter desde o início do ano • os polícias estão proibidos de aceder a redes sociais enquanto estão em serviço • em Custóias, foi assaltada a máquina automática de venda de tabaco que abastecia a prisão • a natalidade em Portugal está a subir pelo segundo ano consecutivo • em Armação de Pêra, há quem vá marcar lugar na praia às sete da manhã com chapéu de sol e toalha • são recebidos 70 pedidos de ajuda por dia no centro de informação antivenenos • os sites de jornais, revistas e de notícias portugueses receberam perto de cinco milhões de visitantes durante o primeiro semestre do ano, segundo os dados do Netpanel da Marktest • mais um recorde nacional: a dívida pública atingiu em Junho os 240 mil milhões de euros - resta saber quem leva a medalha • Rocha Andrade foi o segundo membro deste Governo a propor restituir verbas, apenas depois de ter sido confrontado com factos polémicos.
Folhear
A Egoísta é um prazer colectivo - para quem a idealiza e faz e, sobretudo, para quem tem a oportunidade de a folhear, guardar e ir relendo ao passar do tempo. A edição do Verão, publicada no início de Julho, é dedicada a Lisboa - uma Lisboa destruída pelo triunvirato Medina-Salgado-Sá Fernandes. Qualquer semelhança entre a beleza e encanto da cidade e o caos e destruição que se sente na capital são pura coincidência. Pedro Bidarra, na sua coluna semanal no Diário de Notícias, sublinhou que, face a um candidato decente de outra orientação política, "o Medina, o principezinho herdeiro, não teria a mínima hipótese. É que Lisboa não vai com qualquer um." No entretanto, o Medina, que não é da cidade, vai dando cabo dela. Mas adiante, que a Egoísta é o que agora interessa. O facto de esta edição ser dedicada à cidade tem que ver com o facto de o Casino Lisboa estar a celebrar o seu décimo aniversário. E esta é uma bela edição. Desde logo pela capa e as páginas de abertura, que mostram Leonor Poeiras como um corvo, idealizada e fotografada por Carlos Ramos e vestida por Filipe Faísca. Mas há mais na revista: boa prosa de Rui Cardoso Martins, Nuno Miguel Guedes, Patrícia Reis, José Navarro de Andrade ou Teolinda Gersão, ilustrações de Ricardo Cabral (que desenhou o Torel), Rodrigo Saias e André Carrilho, fotografias de Augusto Brázio (Monsanto), Pedro Teixeira Neves (Lisboa) e Pedro Ferreira, para além de uma recolha de trabalhos de Vihls nas paredes da cidade. Uma edição alfacinha.
Gosto
Desta afirmação de João Villalobos: "O sol, quando nasce, é para o imposto."
Não gosto
Do cancelamento da 12.ª edição da exposição World Press Cartoon, que estava agendada para este ano em Cascais.
Ver
Rever "Barry Lyndon" em cópia digital é uma surpresa. Com boa projecção e bom som, o restauro digital que o Cinema Ideal (ao Chiado) exibe até 17 de Agosto permite ter uma ideia clara do que era a luz que Stanley Kubrick quis mostrar. A luz molda as cores - nas paisagens, mas também nos interiores, iluminados apenas por velas e filmados com as lentes especiais da Zeiss que Kubrick utilizou. Após todo este tempo (o filme é de 1975, foi produzido há 41 anos), é impressionante voltar a ver os enquadramentos rigorosos, a reconstituição das cenas de batalhas, o crescendo de emoção desde os primeiros planos do filme, com Redmond Barry, ainda adolescente, a ser seduzido pela prima. Ryan O'Neal tinha 34 anos e Marisa Berenson tinha 28 quando o filme foi estreado. Na altura, houve quem pensasse que era uma obra menor de Kubrick, depois de "2001: A Space Odissey" e de "Clockwork Orange", antes dos seus derradeiros três filmes - "The Shining", "Full Metal Jacket" e "Eyes Wide Shut". Mas hoje fica mais fácil perceber que Kubrick percorreu em Barry Lyndon a sua visão da natureza humana, utilizando um tempo fora do seu próprio tempo para reflectir sobre a evolução dos costumes. Outras recomendações para ver neste mês de Agosto: uma mostra da história dos jogos Majora ao longo dos seus 77 anos, no Espaço Amoreiras, Rua D. João V 24; "Auto Retrato em Solidó", de Ana Jotta, na Galeria Miguel Nabinho, Rua Tenente Ferreira Durão 18; "Sombras, Máscaras e Títeres da Colecção do Museu da Marioneta", obras de António Viana, Francisco Tropa, Jorge Queiroz e Susanne Themlitz, na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional; no Espaço Chiado (Rua da Misericórdia 12), a série "Anatomia do Boxe", de Jorge Molder, criada em 1997, que está na colecção António Cachola, e que é exposta em conjunto em Lisboa pela primeira vez.
Arco da velha
Um estudo recente indica que, dos sete mil milhões de habitantes do planeta, cerca de seis mil milhões têm acesso a telefones móveis, mas apenas 4,5 mil milhões têm acesso a instalações sanitárias domésticas em condições.
Provar
Se nestes dias quentes quiserem uma esplanada, não vão à Champanheria do Saldanha. Na realidade, a utilização do termo champanheria no nome deste restaurante é um equívoco porque a bebida - e sobretudo o seu equivalente português, o espumante - não têm ali qualquer favorecimento. É, por exemplo, incompreensível que não haja uma selecção de champanhes e espumantes servidos à flute e é ainda menos compreensível que, quando se pede uma garrafa de espumante (da reduzida selecção existente), se coloquem na mesa copos de vinho em vez de flutes. A coisa piora quando, feita a observação, a empregada fica a olhar para nós com ar de caso e responde que vai ver o que é possível. Passado um bom bocado, lá acabou por arranjar umas flutes publicitárias de uma marca francesa. A chegada ao local fica, pois, assim descrita. O restaurante tem uma esplanada no pátio interior do prédio, com a maioria das cadeiras desconfortáveis e mesas pequenas, em contraste, aliás, com o cuidado da decoração do interior. O sítio podia ser ameno se não existisse um som despropositadamente alto, a sair de colunas instaladas demasiado perto das mesas. Em resumo, a esplanada tinha tudo para ser simpática, o serviço é completamente antipático e a comida é mediana. As lascas de bacalhau em tempura estavam demasiado oleosas, o tártaro de atum sabia mais aos condimentos do que ao atum e tinha como acompanhamento apenas tostas industriais, sem qualquer vestígio de salada. Os goujons de dourada salteada com legumes acabaram por ser a escolha mais acertada de uma noite que podia ter sido simpática e ficou aquém das expectativas. E o preço? A relação qualidade/serviço/preço merece nota negativa. Muito negativa. São preços desajustados para a oferta produzida.
Ouvir
Lou Rhodes é uma cantora oriunda de Manchester e tornou-se conhecida por ser, digamos, metade dos Lamb. Com utilização apenas ocasional de sonoridades contemporâneas e essencialmente baseada em soluções acústicas, a carreira a solo de Lou Rhodes vai já no seu quarto disco. Este "Theyesandeye" conjuga canções de amor com baladas que manifestam recorrentes preocupações ambientais, tudo cantado com uma voz etérea, carregada de sedução e sentimento. A sua voz é envolvente e tem um timbre provocante e sedutor. O The Guardian diz que ela evoca Nick Drake, outras vezes Carole King e até Alanis Morissette. Os arranjos das 11 canções são exemplares e a sonoridade de instrumentos acústicos, como a harpa, ajudam a criar um ambiente musical especial, que está reduzido ao essencial, deixando amplo espaço para a voz e as palavras. Numa época em que as sonoridades se repetem, este disco de Lou Rhodes aparece como uma pedrada no charco. O facto de ela, a solo, ter evoluído num caminho completamente diferente das sonoridades dos Lamb mostra também como Rhodes se preocupa em fazer algo de novo e original na sua carreira. Mesmo que para isso recorra a princípios básicos, musicais e temáticos, do folk. "Theyesandeye", CD Nude Records, no Spotify.
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