Opinião
A esquina do rio
Bruxelas pediu mais austeridade para o Governo não agravar o défice, diversos fiscalistas vêem falta de transparência na solução apresentada para a sobretaxa do IRS
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Já houve um tempo em que tudo era muito melhor, até o futuro. Nir Hod, artista plástico, numa exposição em Nova Iorque
Semanada
• Bruxelas pediu mais austeridade para o Governo não agravar o défice • diversos fiscalistas vêem falta de transparência na solução apresentada para a sobretaxa do IRS • o Orçamento não indica nenhuma diminuição de impostos • o líder parlamentar do PSD congratulou-se por não haver nenhum aumento de impostos • o CDS tinha reivindicado uma diminuição da carga fiscal em 2015 • o Orçamento prevê que receita total dos impostos cresça 4,7%, o triplo do crescimento estimado do PIB, que é de 1,5% • quatro autarquias já pediram ajuda de emergência ao Governo • no último ano, aumentou em dez mil o número de milionários portugueses. Há agora 76 mil portugueses com um património de um milhão de dólares ou superior • os portugueses trabalham mais 300 horas por ano que os alemães • a quantidade de empregos vagos em Portugal daria apenas para ocupar 2,74% dos desempregados • mais de metade dos eurodeputados exerce actividades fora do Parlamento Europeu • o preço dos combustíveis não está a acompanhar a descida do preço do petróleo, que já atingiu o mínimo dos últimos quatro anos • o Porto de Lisboa perdeu tráfego e recuou para níveis de há doze anos • Cavaco Silva pediu reflexão sobre o modelo de colocação de professores • já há escolas a eliminar matéria que não vão conseguir dar por falta de tempo devido aos atrasos no começo das aulas • António José Seguro vai dar aulas de Teoria do Estado no curso de Relações Internacionais e a sua turma tem 12 alunos • em Coimbra, a nova moda é atirar carros de compras do supermercado ao Mondego no final do desfile dos caloiros.
OVNI
Um observador neutral que, de repente, no decurso desta semana, tivesse aterrado no país, saído de um OVNI, depois de ouvir as declarações de Passos Coelho sobre o Orçamento do Estado, diria que o primeiro-ministro está farto de ser Governo e quer ir embora logo que possível. Essa poderá ser a única explicação para o Governo ter desistido de rever a carga fiscal dos cidadãos em 2015, ter inventado mais umas taxas com desculpas ecológicas e, de um modo geral, ter continuado a ser mais papista que o Papa em matéria de austeridade. Já se viu que o Orçamento é baseado na perspectiva de a receita fiscal crescer o triplo da economia, o que diz tudo sobre a estratégia que se deseja para o país.
O facto de existir um efectivo agravamento da carga fiscal obrigou a ministra das Finanças a malabarismos de contorcionismo intelectual para o tentar esconder. A apresentação do Orçamento decorreu sob o espectro de crises graves na justiça e na educação, que deixaram marcas em dois sectores que tocam toda a população. Vozes de dentro do PSD, como Marques Mendes, já começaram a insinuar a necessidade de uma remodelação que substitua as figuras que, notoriamente, não provaram ser capazes.
A crise nos tribunais, que demorou mais de um mês a resolver, foi, no entanto, pouca coisa comparada com o caos no arranque do ano lectivo - por muitas ideias que tenha, Nuno Crato perdeu no ponto crítico ao dar razão aos professores sobre a situação de descalabro no seu Ministério. Esse é, porventura, o custo mais grave de uma gestão política inábil de toda a situação. A nova oposição também não está muito melhor: António Costa apressou-se a reivindicar a demissão de Crato - mas, menos de 24 horas depois, foi literalmente inundado, numa demonstração de falta de organização da Câmara Municipal a que preside. Para agravar as coisas, recorreu a um sentido de humor bem negro - parece que a culpa das inundações, na versão oficial da autarquia, foi de ter chovido e Costa afirmou alto e a bom som que não há solução para as inundações em Lisboa. Se seguir raciocínio idêntico para o país, o pequeno rectângulo afunda-se de vez. Entre uns e outros, venha o diabo e escolha, pensa com os seus botões o observador que saiu do OVNI.
Ver
A Sala do Veado fica na Faculdade de Ciências , na Rua da Escola Politécnica. É um espaço amplo e austero, despido, onde a relação entre o lugar das obras e a configuração da sala é, por si só, um desafio. Ana Vidigal aceitou o desafio e mostra pedaços da sua vida, entre imagens, leituras e objectos. De 2 de Outubro a 2 de Novembro, "Où Va-t'-on?", (na foto) uma obra única com três elementos - uma série de 90 Polaroids, trabalhadas em técnica mista com recurso a banda desenhada e comentários manuscritos, e duas pequenas vitrinas, onde estão um veado em porcelana e um bambi num dispensador de pastilhas Pez. Mais uma vez, Ana Vidigal mostra o seu humor e sentido de observação aplicado ao quotidiano e a evocações do seu próprio passado. Uma outra exposição a visitar é a de Inez Teixeira, "No Vazio da Onda", que vai estar até 30 de Dezembro no Teatro Municipal Joaquim Benite, de Almada. É uma pena que durante a semana estas exposições estejam tão vazias e que a promoção seja tão pontual e dirigida, fundamentalmente, ao momento da inauguração. Qualquer uma destas duas exposições merece atenção.
Dixit
"Com este elenco governativo, nem vale a pena concorrer às próximas eleições".
António Lobo Xavier
Provar
A Quinta do Monte d'Oiro, de José Bento dos Santos, já nos habituou a reservas de grande qualidade. A de 2010, agora colocada no mercado, distingue-se pelo aroma e suavidade na fruta, pela presença discreta da madeira, pelo final longo. Este vinho, da região de Lisboa, é feito com 95% de casta Syrah e 5% de casta Viognier.
Este Reserva já vai na 12ª colheita, de uma vinha plantada em 1992, e tem-se mostrado consistente na qualidade, progressivamente mais apurado e requintado.
É, porventura, das melhores reservas de produtores portugueses, um tinto verdadeiramente excepcional que vai bem com pratos de caça e carnes intensas.
Gosto
A Weso, uma orquestra portuguesa especializada em bandas sonoras para a indústria cinematográfica, venceu a 6ª edição do Prémio Nacional Indústrias Criativas Super Bock/Serralves.
Não gosto
Nuno Crato continua sem dizer quando estará resolvida a colocação de professores.
Folhear
A edição de Outubro da revista Wired é o número anual dedicado ao design e, além de conter um mostruário de gadgets e de tendências, apresenta este ano "Dez Lições Para Uma Nova Era". É um repositório de ideias, de evocações, de incursões no mundo novo, dos objectos de decoração às próteses para o corpo, passando pela arquitectura, por novas empresas, pela moda e pela recuperação das suas marcas (o exemplo da Burberry), pelo equipamento tecnológico da Nike, pelos "drones" e pelo poder da imaginação e da criatividade da mente humana. É uma edição para guardar, onde poderão ainda encontrar artigos sobre como se podem fazer partes de esqueleto com uma impressora 3D ou uma conversa com o Monty Python Terry Gilliam.
Arco da velha
Vítor Bento foi presidente do BES sem nunca perder a ligação ao Banco de Portugal, do qual ainda é funcionário, e onde gozava de uma licença sem vencimento desde que foi para a SIBS, em 2000.
Ouvir
Desta vez, proponho um DVD e um CD. O DVD é de Sting, acompanhado em palco por uma orquestra de 14 músicos. Dentro do horário previsto, Sting apresentou este mês, na Broadway, "The Last Ship", uma peça de teatro musical baseada no seu disco de final do ano passado. A coincidir com a estreia, Sting editou um DVD que reproduz um concerto realizado no Public Theatre de Nova Iorque, e apresenta 15 temas, em vez dos onze que estavam no CD do ano passado e que foi o seu primeiro disco de originais nos últimos dez anos. "The Last Ship" conta a história do declínio da indústria de construção naval em Newcastle, onde Sting cresceu. Há uma forte influência de música folk e, como aqui escrevi quando o disco saiu, "as canções não são para brincadeiras, contam histórias duras, abordam rupturas familiares e tensões dentro da comunidade, mas também casos de amor e desejo, como em "I Love Her So But She Loves Someone Else"". O segundo disco é um resumo da carreira de Madeleine Peyroux, uma cantora de jazz americana com quase 20 anos de carreira (o seu primeiro disco é de 1996). Trata-se de um duplo CD com 27 canções, que percorre muitos dos seus temas originais mas também versões de canções alheias que ela incorporou no seu cancioneiro. Eu gosto do estilo desprendido de Madeleine Peyroux e, mesmo nos discos de estúdio, ela canta como se estivesse num cabaret frente ao público. Não exagero se disser que ela é uma das minhas cantoras preferidas, bem longe de algumas coisas delico-doces que por aí abundam.