Opinião
Tempo de pensar
Portugal está parado, mas a política agita-se. Face à crise, económica mas sobretudo moral, os oportunistas procuram os seus quinze segundos de fama, enquanto na frente esquerdista as organizações multiplicam-se a fazer lembrar o tempo do delírio ML (marxistas-leninistas), ligas, reconstruídos e afins.
Henrique Neto, socialista muito apreciado pela direita, quer mais tempo de antena do que aquele que já lhe dão quando é preciso chamar alguém para dizer mal do PS. Terá. Mas vale pouco. O homem tem um discurso velho a fingir que é novo. Dá sono e só anima títulos de jornais.
A infidelidade está aliás na moda. Veja-se como a esquerda adora a Dra. Manuela Ferreira Leite.
Uma esquerda que brota. Como se não bastassem os três do costume, PC, Bloco e PS, que não se entendem, temos agora mais o Livre, o Tempo de Avançar, o Juntos Podemos, e o Agir, embora este diga que não é de esquerda nem de direita numa declaração pitoresca. Salvo a prosápia, não se percebe o que os distingue. Até porque todos afirmam, sem rir, um desmedido amor à unidade. Enfim. Não há paciência para esta esquerda. Acrescente-se o aparecimento, esta semana, de uma coisa que dá pelo nome de Nós Cidadãos.
Alguém, sem mais nada que fazer, poderia debruçar-se sobre os nomes destes novos partidos. O apagão ideológico é evidente. Definem-se pelo movimento, agir, avançar, ou pela dinâmica de grupo, podemos, cidadania. Mas tudo com uma visão de muito curto prazo. Não se descortina um pensamento atualizado e ainda menos de futuro.
Pensa-se à antiga. Defende-se mais Estado, quando este já não existe ou foi totalmente capturado pela finança internacional; afirma-se o nosso Portugal quando a soberania é agora uma palavra vã e o mundo grande; ou, batalha-se por várias formas de retrocesso civilizacional, esse tempo em que os pescadores pescavam (já não há peixe), os agricultores cavavam (a agricultura é agora uma engenharia) e os operários vestiam de azul (as fábricas já só têm robôs).
E, no entanto, existem muitas coisas dignas de reflexão. Assistimos a uma enorme concentração de meios financeiros, nas mãos de um reduzido número de pessoas, a que se junta um contexto tecnológico que vai dispensando o trabalho humano. Isto significa que o capital está cada vez menos dependente do trabalho assalariado. Ou seja, a sociedade do emprego vai dando lugar a uma outra onde milhões de pessoas não terão uma ocupação remunerada.
O Estado tem crescente dificuldade em garantir um rendimento, mesmo mínimo, para as multidões de desocupados. Pelo menos nos termos em que o tem feito, ou seja, por via das prestações sociais de quem trabalha. Eventualmente um dia os robôs e outras máquinas terão de pagar impostos para cobrir o ócio humano. Poderá também imaginar-se uma sociedade de empreendedores, onde cada um cria a sua própria atividade e vive dela. Mas isso implica mais do que meros apelos. Implica sobretudo uma alteração radical, mesmo radical, do ensino. Veja-se como a Finlândia decidiu recentemente acabar com as disciplinas, aquelas que tanto agradam ao nosso ministro e, em geral, aos nossos educadores. A maioria daquilo que se ensina nas escolas aprende-se melhor na internet. O que não se ensina é o como fazer. Um ensino do fazer é fundamental se queremos verdadeiros empreendedores.
Num contexto em que as máquinas serão cada vez mais inteligentes, autónomas, capazes de decisão e de realização, será necessário inventar novas ocupações para a espécie humana. A criatividade é certamente uma delas. Durante algum tempo, mesmo numa fase avançada, os robôs irão ocupar os trabalhos de rotina, pouco criativos portanto. Segundo o The Huffington Post o gráfico já inverteu. O trabalho humano de rotina está numa linha descendente, enquanto o não-rotineiro sobe. Para isso precisamos de pessoas com elevada capacidade de adaptação a novas situações.
A criatividade será por isso, pelo menos durante algum tempo, a vantagem competitiva dos humanos sobre as máquinas inteligentes. Trata-se de um tema crucial para a sociedade futura. Algum partido, velho ou novo, reflete sobre isto?
Artista Plástico
Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico