Opinião
Taxas e taxinhas
É preciso topete, como diria Freitas do Amaral, que o governo que mais aumentou os impostos aos portugueses se indigne agora com uma taxa de um euro, cobrada pela cidade de Lisboa, a turistas.
Prática aliás corrente por essa Europa fora, sobretudo nos maiores destinos turísticos. Em Veneza, por exemplo, são cinco euros. Em Amesterdão ainda pode ser superior pois o município cobra 5,5% do custo do alojamento. Em muitas cidades, para além das taxas que incidem sobre as dormidas, existem também preços diferenciados para turistas nos transportes, nas entradas de museus e noutros locais. Enfim, banal.
Porquê então tanta agitação? Como acontece com frequência em política, a origem do alvoroço não está no assunto propriamente dito. A taxinha é irrelevante. O problema são as eleições. O governo e os partidos que o apoiam estão em pânico e já em plena campanha. Veja-se aliás o recente tempo de antena do PSD.
A estratégia é bastante linear, diga-se de passagem. Sócrates é um demónio e António Costa que foi seu ministro, companheiro e lhe aperta a mão em público, só pode ser tão mau como ele. Pior não, porque não existe. É claro que esta narrativa, de tão gasta que está, vai perdendo a sua eficácia. A direita devia estudar o conceito de entropia. E, embora muita gente sofra de socratite aguda, a maioria dos portugueses já não se comove com o tenebroso argumento.
Daí que alguns ministros se excedam em ataques, tão patéticos quanto excêntricos, a propósito de nada. Irão certamente continuar, pelo que a política portuguesa se arrisca a tornar-se numa versão caseira da Britcom.
Costa pelo seu lado tem-se portado bastante bem. Uma das coisas mais irritantes da atividade política atual reside na ideia de que o líder da oposição, para ser eficaz, deve comentar a cada hora ninharias. É sua obrigação aparecer a todo o momento e dizer qualquer coisa. Esta tendência que se desenvolveu, penso que sobretudo a partir de Blair e dos seus conselheiros, gera na verdade um enorme desgaste, pois quanto mais se fala maior é a probabilidade de se dizerem disparates. Por isso, a parcimónia de Costa é muito positiva e só espero que se mantenha. O partido tem outras pessoas para tratar das intrigas do quotidiano.
Do mesmo modo, já ninguém suporta uma política feita de promessas. A realidade é complexa e aquilo que agora parece razoável daqui a um ano pode ser inviável. Existem muitas condicionantes externas e imprevisíveis. De um político sério esperam-se por isso orientações de fundo, técnicas e ideológicas. E não soluções voluntaristas.
Costa já disse aquilo que importa. Em vez de uma política de austeridade e empobrecimento, vai dedicar o seu mandato ao desenvolvimento económico e à aposta naquilo que pode ajudar o país a sair do ciclo de miséria e atraso em que se encontra. Ou seja, educação, ciência e cultura. Não são ideias vãs, mas as mesmas que por estes dias começam a inverter as próprias políticas europeias austeras cujos resultados nefastos estão à vista. A Europa, na linha de uma Alemanha de vistas curtas, está a perder competitividade e o seu lugar como uma das maiores economias no mundo. Nesse sentido, Costa tem alguma sorte. Um novo ciclo é agora uma exigência mesmo para aqueles que imaginaram que o empobrecimento podia conduzir, miraculosamente, ao crescimento. Uma ideia cuja ineficácia está plenamente comprovada.
Os meios existem. Tal como dizia o nada saudoso Durão Barroso, estão disponíveis "pipas de massa" para investimento. O seu pleno aproveitamento depende de uma visão divergente daquela que tem sido seguida nos últimos anos. Podemos entrar numa nova era. E Costa representa essa possibilidade.
Daí o pânico. O governo queixa-se de ter sido obrigado a fazer o trabalho sujo. Lamenta-se que agora venham outros colher os resultados. Mas já não convence. Os portugueses estão fartos e querem a mudança. É incontornável, não há nada a fazer. Não serão taxas, taxinhas, ridículas performances ou o papão Sócrates que bastem para alterar esse sentimento generalizado.
Artista Plástico
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