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Agricultura do futuro

O ministro Capoula Santos é um bom exemplo daquilo que chamo a política do possível. Os produtores de leite e carne protestam? Dá-se um subsídio e o assunto está arrumado. Mas, estará mesmo?

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A agricultura e as pescas, atividades básicas que fornecem a alimentação humana, estão em acelerada mudança. Por vários fatores, alguns contraditórios. As alterações nos hábitos alimentares e nos modos de vida conduzem, por um lado, a um menor consumo de determinados produtos, carne por exemplo, significando portanto uma diminuição no circuito do horror que é a industrialização da produção de carne, mas, por outro, as exigência do consumo levam a uma maior industrialização de muitos produtos até aqui tidos por "naturais". É o caso da chamada agricultura bio, que começou por se afirmar como um modo de produção tradicional, ou seja, antiquado e primitivo, mas que o sucesso implicou a inevitável industrialização dos processos.

 

Mas as maiores mudanças derivam da tecnologia. Só na cabeça de alguns citadinos é que ainda existe a visão bucólica dos camponeses de enxada na mão. Agricultura e pescas são hoje um domínio dos engenheiros. O resto é parque temático.

 

As estatísticas provam-no. No Portugal dos anos 60 o sector primário ocupava 43% da população ativa. Hoje ocupa cerca de 7%. Na Europa são 5 %. Na Alemanha 2%. Nos Estados Unidos 3%. A China passou de 50% em 1994 para 3% hoje. Dados do Banco Mundial.

 

Acresce que na Europa agricultura e pescas são uma ficção. Só uma elevada subsidiação permite preços relativamente baixos ao consumidor, mantendo algum emprego e atividades que na realidade são altamente deficitárias. Sem os subsídios agricultura e pescas tradicionais estariam mais falidas do que os bancos.

 

A brutal diminuição no número de trabalhadores rurais deve-se à introdução das máquinas. A mecanização permitiu reduzir substancialmente o trabalho humano, sistematizando procedimentos, na fase da colheita por exemplo, e permitindo uma industrialização generalizada. A agricultura é hoje uma atividade industrial como qualquer outra. A distinção sectorial deve mais ao hábito do que à realidade. Mesmo nas pescas, a introdução da aquacultura, significa que finalmente o sector chegou à idade moderna.

 

Mas a mecanização das últimas décadas não tem comparação com o que está em curso. Aproximamo-nos de uma extensiva automação também na agricultura e nas pescas.

 

Já aqui, noutro texto, dei o exemplo das quintas verticais, onde se cultiva sem terra, por hidroponia, e sem pessoas, pois são totalmente automatizadas. Mesmo de modo mais "convencional", o inevitável recurso a estufas e viveiros, de forma a contornar a meteorologia e as estações do ano, significa a criação de condições de otimização de recursos, água por exemplo, mas também de procedimentos. O que abre caminho à robotização. Uma estufa ou viveiro deve menos à natureza do que à engenharia e à indústria.

 

Em suma, agricultura e pescas são duas atividades que têm em curso uma extensiva automação dispensando a mão humana, na linha da chamada indústria 4.0. Com muitos benefícios, ainda que se diga que os legumes e os frutos assim produzidos não sabem a nada… para já não falar do desemprego.

 

É neste panorama que as políticas do possível não resolvem nada. Capoulas Santos, que é um bom ministro, conhecedor, apreciado à esquerda, faz o que pode neste tempo de grandes mudanças. Mantém e até reforça a política do subsídio, mas sabe que ela não leva a nada. O futuro não vai por aí.

 

Artista Plástico

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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