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José Maria Brandão de Brito - Economista 10 de Junho de 2015 às 21:00

Não estamos em campanha eleitoral!

A coligação que nos tem governado quis marcar terreno e, quando se esperava uma proposta de programa de governo limitou-se a apresentar um conjunto de generalidades que remetem para a continuidade do que foi a sua actuação nestes quatro anos.

Não estamos em campanha eleitoral, mas... Sim, afinal estamos em campanha, numa campanha ronceira em que se tem de calcorrear uma maratona, chegar a Setembro ou Outubro com os programas ainda viçosos e actualizados e os protagonistas em forma, com energia para cortar a meta. Vamos ter todos de fazer um esforço para que estes meses venham a ser importantes para esclarecer os portugueses sobre as alternativas em presença. Talvez como nunca, até hoje, vai ser necessário "votar bem".

 

Não estamos em campanha eleitoral, mas atente-se na agitação que se apoderou de uma grande parte dos dirigentes políticos, que fazem e desfazem partidos, fundem outros, fazem coligações, ensaiam discursos. Em todo este frenesim que vantagem para os portugueses? Como separar o trigo do joio? Afinal talvez seja possível, à custa da repetição das coisas e das causas compreender o que é essencial e o que não passa de areia que nos atiram aos olhos mesmo que o façam com ar sério como se, em vez de areia, fossem propostas inovadoras o que nos atiram. Compreender os impasses em que se encontra toda a sociedade portuguesa, como se expõem ou como se encobrem e disfarçam, reconhecer as alternativas.

 

A coligação que nos tem governado quis marcar terreno e, quando se esperava uma proposta de programa de governo limitou-se a apresentar um conjunto de generalidades que remetem para a continuidade do que foi a sua actuação nestes quatro anos: umas linhas orientadoras e uma inócua carta de garantias, tudo vago q.b., sem graça nem conteúdo. Como a comunicação social, quase unanimemente, assinalou com mais ou menos ironia, nada têm que nos propor; só têm de mostrar como bem nos governaram neste ciclo político e como o País está melhor (tudo o que está pior é varrido para debaixo do tapete)... afirmando, com a habitual arrogância, que não há alternativa.

 

Mas o mais grave é que o tempo tem sido quase sempre utilizado para criticar os programas dos adversários, sem praticamente os ler, desvalorizando-os, menosprezando-os, taxando-os de irrealistas, despesistas, insensíveis à vulnerabilidade da nossa economia e das finanças públicas. Nesta fase a sua ideia forte é não ter estratégia, por cálculo ou pura e simplesmente porque ela não existe e é a mesma que foi usada durante os últimos anos; não apresentar nenhum programa alternativo, não se comprometer com políticas e com medidas que as escolhas exigem; ficar por umas ideias vagas, insinuando a estabilidade que assenta no prosseguimento do caminho até agora seguido.

 

Bem vistas as coisas, afinal existe uma estratégia de campanha: num primeiro momento força-se o sermão, esgrimindo o fantasma grego, abrindo espaço ao momento seguinte que assenta no discurso do medo de que tudo, o que se atribuem ter feito, se pode vir a perder num "leilão de promessas". Que podem fazer as outras forças políticas responsáveis senão, responsavelmente, propor as suas alternativas aos portugueses? A experiência da austeridade está feita com os resultados que são conhecidos. Tudo aconselha a necessidade de utilizar novas vias  que recuperem a economia, o emprego, o investimento, a dignidade.

 

É esse o trabalho que António Costa e o PS têm vindo pacientemente a construir. Ao colocar como a prioridade das prioridades está a ir ao encontro do principal flagelo que corrói e fragiliza a sociedade portuguesa. É isso que está em causa, sem disfarces nem rábulas de má comédia. Hoje em Portugal, os políticos e os partidos que elaboram propostas rigorosas e geradoras de confiança só podem fazer promessas compatíveis com os compromissos celebrados, no contexto de uma estratégia explícita, propondo-se agir da forma que melhor defendam os interesses nacionais, furtando-se à obsessão ideológica dominante, provando que afinal há mesmo alternativa. Por isso há quem se empenhe em combater os sentimentos de dependência e conformismo propondo outras soluções. Temos de encontrar uma saída para não termos de sair do País.

 

Economista. Professor do ISEG/Universidade de Lisboa

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