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Avante com a agricultura intensiva!

É que graças a esse contraditório ficámos a conhecer os cuidados ambientais dos maiores produtores de olival intensivo, os níveis de qualidade dos seus produtos e a pouca expressão geográfica que este modelo ainda representa no Alentejo e no país.

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A agricultura intensiva está a destruir o ambiente. A agricultura intensiva não contribui para a economia do país. Logo... Este é o silogismo que o país foi convidado a responder nas últimas semanas e ao qual se atirou com pedras na mão. Nas redes sociais, o inevitável termómetro social, milhares de pessoas insurgiram-se contra as culturas ditas invasivas, acusando-as de destruir o que temos de mais precioso: a natureza, o ambiente, a comida e até os direitos humanos. As televisões apoiaram a revolução e apresentaram cenários de horror ambiental e social. E os agricultores, no fim da linha, levaram a lição que mereciam: quem quer inovar e crescer... apanha. Salazar não faria melhor.

A minha ligação à agricultura começa (e acaba) numa reportagem que fiz em 2003, para o Diário de Notícias, em que assisti ao início do que estamos a ver. Era sobre a súbita compra de terras alentejanas por empresários espanhóis, que levou dois terços da freguesia de Baleizão, a mítica terra de Catarina Eufémia, a passar para mãos estrangeiras. Razão: a União Europeia queria assegurar a liderança na produção de azeite, pelo que decidiu subsidiar fortemente a plantação de olival.

Ora, enquanto os agricultores portugueses, habituados à trigo-dependência ou à subsídio-dependência, resistiram ao apelo, os espanhóis, que já não encontravam um palmo de terra barato perto de casa, caçaram a oportunidade. E com a ajuda da Europa, sem risco financeiro, portanto, fizeram o que nós desprezámos.

Nos anos seguintes assistimos a uma mudança estratosférica. A primeira geração de agricultores pós-Estado Novo regressa da universidade com vontade de fazer coisas, e muitas, mas sem vontade de seguir os pais. “Saber fazer agricultura é saber fazer política”, recordo-me de ouvir um agricultor dizer, ao lado de um filho desiludido. A nova geração não queria política, queria negócios.

O resultado está à vista de todos. O Alentejo mudou de cara, contribui positivamente para a balança comercial do país, acrescenta centenas de milhões de euros às nossas exportações, tem produtos que ganham concursos internacionais todos os anos, atrai mais turistas do que nunca, tem a terra hipervalorizada, retém as suas gentes. Se isto não é progresso, alguém tem de me explicar o que é.

Mas não respondi à pergunta: afinal, a agricultura intensiva é boa ou má? Na reportagem com que a RTP lançou o debate público, dia 15 de Abril, o título é claro: “A invasão da agricultura insustentável”. Invasão! Insustentável! São 33 minutos de exclamações passionais como estas sobre a destruição da paisagem, a contaminação dos terrenos, a utilização excessiva de água e até a exterminação de habitats animais.

Nem um único argumento a favor dos novos modos de cultivo. O que até se percebe, na verdade, porque o jornalista ouviu 16 pessoas com a mesmíssima opinião. Ora, o contraditório não é apenas uma regra básica do jornalismo, é uma regra básica da democracia. Quando falha, e de forma tão clamorosa, em pleno horário nobre do serviço público, sabemos que alguma coisa está muito mal.

Uma semana depois fiquei com a certeza de que o problema era geral. O mesmo tema, o mesmo ângulo, o mesmo peso de grande reportagem, mas agora no prime time da SIC. A reportagem está a anos-luz da primeira, convém sublinhar, porque aqui sim o contraditório existiu. Mas até por isso o tom se tornou estranho. É que graças a esse contraditório ficámos a conhecer os cuidados ambientais dos maiores produtores de olival intensivo, os níveis de qualidade dos seus produtos e a pouca expressão geográfica que este modelo ainda representa no Alentejo e no país. E nada disso casa com as conclusões tristes e sombrias da reportagem.

Mais sete dias volvidos e a trama adensa-se: António Costa anuncia uma cerca sanitária no concelho de Odemira, associada à actividade agrícola. O país desperta para um problema humano que tem barbas, mas que escandalosamente se mantém na mesma. Um problema que era mais do que expectável, diria eu, já que esteve sempre associado aos crescimentos da indústria (desde a revolução industrial) e da agricultura (os espanhóis não falam de outra coisa há 20 anos). Sempre com a mesma origem: empresários sem escrúpulos, que exploram trabalhadores ou toleram a sua exploração. Gente que devia estar presa, em síntese, e que nada nos ensina sobre modelos de agricultura, mas quando muito sobre a crónica lentidão da nossa máquina administrativa.

Mas, pela terceira vez, e o modelo? É bom ou mau? Pois bem, caro leitor, pelo que li em títulos como a “Voz do Campo”, o “Alentejo Atual” ou o Agroportal.pt, o tipo de títulos a que temos de recorrer se quisermos perceber o mínimo sobre este assunto, os modelos intensivos praticados em Portugal são altamente profissionais e, em muitos casos, até mais amigos do ambiente do que a agricultura dita tradicional (leia-se, sequeiro promovido pelo Estado Novo). Além de que criam níveis de riqueza que eram inimagináveis há apenas uma década no mundo rural.

Em suma, é provavelmente a melhor coisa que nos aconteceu depois do turismo. Mas claro, o turismo também é horrível.

 

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