Opinião
O desvairado e a equilibrista
Hillary Clinton prometeu arrancar o marido à reforma e encarregá-lo de "revitalizar a economia", acenando com um retorno à prosperidade dos anos 1990, mas a tirada da candidata revela as dificuldades que enfrenta na corrida pela nomeação democrática.
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Bill Clinton, político empolgado e capaz de fingir completamente, vendeu na campanha de 1992 "dois por um" em louvor dos dotes da mulher, mas Hillary, altaneira e fria, revela-se baça e inconvincente ao repisar as alegadas sinergias do casal.
Hillary chegou fragilizada às primárias do Kentucky e Oregon e ao prometer altas responsabilidades para o ex-Presidente afasta-se do legado equívoco dos anos Obama com forte aumento das desigualdades sociais.
O "dois por um" com Bill Clinton recupera, ainda, o legado de políticas liberais concertadas com as lideranças republicanas em contradição com outras declarações de Hillary.
Bernie Sanders, clamando contra poderes instalados, desigualdades e injustiças da globalização, reduziu os apoios seguros de Hillary às minorias negra e hispânica, acentuando as dificuldades para ganhar a adesão de mulheres e homens brancos de baixos recursos e qualificações educacionais.
O voto feminino jovem escapa igualmente a Hillary que surge com exasperantes índices nacionais de rejeição e desconfiança, só superados por Donald Trump, num cenário de vincada bipolarização ideológica.
Hillary resistiu mal à vaga de contestação à elite do poder pelo senador do Vermont e maior dificuldade terá ao enfrentar um milionário por herança.
Até assegurar a nomeação escapa-lhe a oportunidade de explorar as divisões republicanas e, ao contrário do que sucedeu na campanha contra Obama, vê-se obrigada a conter ataques a Sanders para evitar alienar potenciais apoiantes altamente reticentes.
A moderação de Hillary e sobretudo de Bill Clinton nas críticas a Sanders atestam um risco muito maior de fuga de apoios democráticos do que em 2008.
Entres os líderes democratas percebe-se agora que a demagogia de Trump é capaz de cativar classes médias em perda de rendimento e eleitores atraídos por promessas de alargamento de programas de saúde e assistência.
Hillary é lídima representante das elites democráticas e veterana de jogos de influência nos universos da finança e negócios desde a eleição do marido para governador do Arkansas em 1978.
A imagem de manipuladora e oportunista - capaz de passar inopinadamente de apoiante de acordos de liberalização do comércio a crítica da Parceria Transpacífico que aguarda aprovação no Congresso - não larga a antiga senadora.
Omitindo fracassos, do plano de reforma da saúde nos idos de 1993 à intervenção na Líbia em 2011, a ex-secretária de Estado terá de se apresentar como o contraste da razoabilidade face à demagogia de Trump.
A escolha de um(a) vice-presidente é para democratas e republicanos concitarem apoios, mas é difícil avaliar as consequências da dinâmica populista, proteccionista, xenófoba e isolacionista, hostilizando países aliados e adversários, promovida por Trump.
A imprevisibilidade do comportamento do demagogo nova-iorquino condiciona inclusivamente as expectativas dos republicanos que tanto podem perder a esperada maioria no Senado e na Câmara de Representantes como vir a alargar a vantagem no Congresso se o vento soprar de feição a Trump e o partido não se fracturar.
A brutalidade que Trump traz à campanha tanto lhe pode dar a vitória como arrasar os republicanos.
Jornalista