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13 de Janeiro de 2015 às 20:10

A massificação terrorista

Os atentados de Paris são o pesadelo de serviços de informação e forças de segurança ante uma avalancha de suspeitos de incitamento, organização e concretização de actos terroristas na galáxia do jihadismo que tão cedo não terá fim.

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Por alegada insuficiência de recursos humanos e identificação de outras, escaparam à vigilância em meados de 2014 os irmãos Kouachi e Amedy Coulibaly. 

 

Os cadastros de Chérif e Said, as suas alegadas viagens a Omã e ao Iémene, a participação em grupos de propaganda jihadista, e, no caso de Amedy, duas condenações por participação em acções de apoio a terroristas islamitas tipificavam perfis de alto risco.

 

Falta de meios para vigilância ou insucesso de operações de controlo destes suspeitos para identificação e/ou neutralização de outros alvos de maior valor surgem como explicações plausíveis para a liberdade de movimentos dos jihadistas.

 

O problema maior, independentemente de erros operacionais e avaliação de risco, de falhas do policiamento de proximidade por alienação ou intimidação das comunidades muçulmanas dos subúrbios, tem a ver com uma questão de escala.

 

A vaga radical muçulmana 

 

O número de muçulmanos em França, entre nascidos e conversos, maioritariamente sunitas, corresponderá a cerca de 8% dos actuais 64,2 milhões de residentes da metrópole e 2,1 milhões de habitantes do Ultramar.

 

O jihadismo recruta entre estas comunidades relativamente desqualificadas - geradas pela descolonização e importação de mão-de-obra barata e indiferenciada - e o elevado número de muçulmanos detidos (aproximadamente 40 mil, o equivalente a 60% da população prisional), o que aumenta as possibilidade de radicalização.

 

O islão, como outras religiões, comporta vertentes exclusivistas passíveis de justificar o aniquilamento de infiéis, é marca de identidade cultural, e ao ignorar a distinção entre esferas política e da fé, pode propiciar enquistamentos em ambientes de imigração significativa passíveis de gerar hostilidade face a comunidades de acolhimento secularizadas de matriz cristã.  

 

Desconhecedora das confrontações teológico-ideológicas no seio do islão, a maior parte dos europeus cristãos, descristianizados, agnósticos, indiferentes, ateus (deixando de lado os casos singulares do islão na Rússia e nos Balcãs), tende a encarar os crentes muçulmanos como bloco alheio e hostil.

 

Em França, acresce que mais de um milhar de cidadãos terá partido para a Síria, numa migração jihadista para o centro de combate de mais fácil acesso via Turquia que mobilizará talvez 4 mil portadores de passaportes da UE, e o retorno de parte destes combatentes reforçará o núcleo duro europeu ocidental islamita.

         

Falhados e capacitados

 

As biografias dos Kouachi, de ascendência argelina, tal como Hayat Boubeddiene, a companheira de Amedy, filho de imigrantes do Mali, são típicas da  radicalização de jovens de meios pobres, diminuta formação escolar, desemprego ou trabalho mal remunerado e/ou precário, criados nos ambiente de violência, vandalismo e criminalidade das urbanizações degradadas dos subúrbios.               

 

Djemal Beghal, nascido na Argélia em 1964, aderente do "Grupo Islâmico Armado" argelino, posteriormente activo nas redes da "Al Qaeda", e, agora, detido, está, por sua vez, identificado como um dos mentores dos Kouachi e de Coulibaly.

 

Os terroristas franceses foram sugados pelas galáxias da "Al Qaeda na Península Arábica" - apostada no ataque aos "inimigos distantes" do islão, a par do combate contra a família real saudita e os rivais no Iémene - e, também, pelo "Estado Islâmico", foco de jihadistas na luta por um califado levantino.

 

Matar por conta da fé

 

A caracterização dos Kouachi e Coulibaly susceptíveis à endoutrinação jihadista, capaz de fazer oferecer focos identitários religiosos e políticos para desqualificados carentes de referentes, não deve, contudo, obliterar que a motivação ideológica terrorista é bem mais vasta.

 

A radicalização ideológica jihadista vivida no Médio Oriente e do Magrebe desde a década de 70 atrai, igualmente, crentes e conversos na Europa ocidental de grupos sociais de rendimentos altos, com relevantes qualificações escolares e profissionais, incluindo mulheres dispostas a envolver-se como apoio e suporte familiar e comunitário dos guerreiros.

 

O terrorismo jihadista é táctica motivada por ideologia exclusivista de extermínio, que perdurará enquanto se revelar eficaz para mobilizar os crentes.

 

Jornalista

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