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O mestre Jedi da estatística 

O sueco Hans Rosling lutou contra a ignorância até à morte. Deixa-nos quatro cábulas para não engrossarmos o rol dos que veem o mundo às avessas.

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Isto não está fácil. E quanto mais difícil fica, mais complicado se torna acreditar que o mundo é, globalmente, um sítio cada vez melhor. Mas a verdade, é que é mesmo. Garantem-no os factos, aqueles que se encontram quando nos damos ao trabalho de os ir procurar, deixando de lado o conforto (e a preguiça!) das ideias feitas.

 

Quem nunca desistiu de combater a ignorância até à morte, no passado dia 7 de fevereiro, foi o sueco Hans Rosling, conhecido como o "mestre Jedi da estatística" e o único orador com dez Ted Talks. Em sua homenagem fui revisitar "Como não ser ignorante sobre o mundo", uma conferência em que a partir do confronto com a assistência, deixa bem claro como temos uma visão enviesada da realidade.

 

Quando lhes é perguntado se a pobreza no mundo cresceu ou diminuiu, votam em que aumentou (não diríamos o mesmo?), quando de facto diminuiu; quando quer saber a percentagem de crianças vacinadas no planeta, marcam muito longe dos 80% reais. Hans Rosling, com um humor cáustico, sossega-os: mais ignorantes do que eles são, por exemplo, os suecos e os norte-americanos, e a bem da verdade é preciso dizer que os que mais acertaram foram... os chimpanzés. E quando os chimpanzés nos ganham, recorda, significa que a nossa percepção está abaixo do "acaso". Mas de onde vem tanta ignorância, pergunta.

 

É a deixa para a entrada em palco do seu filho Ola Rosling, ex-Google e sócio do pai no "Projeto Ignorância". Para Ola, a resposta é simples. Andamos a leste, em consequência da nossa experiência pessoal (tomamos a parte pelo todo), de um ensino que transmite factos fora do prazo, de jornalistas que falham tanto nas respostas como o comum dos inquiridos, a que se soma a tendência humana para exagerar o que nos assusta - sejam ataques de tubarões, ou de terroristas.

 

A cura é demorada, e vai passar, acreditam, por uma "prova de factos" que fará parte de qualquer entrevista de emprego. Afinal, se partimos de premissas erradas, não há política, educação, estratégia empresarial, já para não falar em votos nas urnas, que possam dar certo.

 

Enquanto isso, deixam-nos quatro cábulas que nos permitem fazer generalizações com maior segurança. A primeira é que a maioria das coisas tende a melhorar, por isso, na dúvida, escolha o cenário mais optimista. A segunda é que a grande maioria das pessoas está no "meio". Por exemplo, não são nem milionárias, nem vivem em pobreza extrema, têm acesso a alguns cuidados médicos, mas não a todos, etc. A terceira implica ter a consciência de que a riqueza de um país não antecede o investimento no desenvolvimento social (escola, saúde), mas o contrário, e por fim, a quarta: se lhe mete medo, vai exagerar!

 

Quando este fim de semana ouvi Trump a inventar um atentado na Suécia de Rosling, imaginei-o a erguer-se na campa. Suspeito de que se lhe dessem a oportunidade de uma última conferência resumiria as quatro cábulas a uma única: pense sempre ao contrário do Presidente dos EUA. Mas voltaria a recordar que foi a ignorância que o pôs lá.

 

Nota: Não deixe de ver (tem legendas em português):

https://www.ted.com/talks/hans_and_ola_rosling_how_not_to_be_ignorant_about_the_world/transcript?language=pt

 

Jornalista

 

Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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