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O custo de pedir conselhos

Bem vistas as coisas, Hayley Blunden tem um conselho-chave para lhe dar: se sabe que não vai seguir o conselho que solicita, não o peça! É claro que sabe que há grande probabilidade de ninguém lhe dar ouvidos.

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Ouvir o que os eleitores, os trabalhadores (ai, agora diz-se “colaboradores”), os clientes, os maridos/mulheres, alunos ou filhos têm a dizer, escutando e valorizando os seus conselhos, é obrigatório. Vem recomendado nos manuais de como ganhar eleições ou gerir empresas, e os tratados de educação infantil dedicam-lhe capítulos inteiros. E, em teoria, funciona.

Basta ver a expressão de vaidade na cara daqueles que são chamados a Belém para “aconselharem” o Presidente da República ou dos convocados para as reuniões do Infarmed, que se apressam a partilhar connosco como foram escutados ao mais alto nível. Por vezes, não resistem a deixar cair como impressionaram os interlocutores com a sua argúcia, seguros de que implantaram na mente de quem os escutou os mais brilhantes planos, que certamente vão seguir à risca. Não são só eles que reagem assim. Sentimos o mesmo quando o chefe nos pede conselho sobre se há de pegar ou largar num projeto de desenvolvimento da empresa, a colega nos pergunta como deve resolver um problema ou um amigo afirma que somos a única pessoa capaz de lhe resolver a vida amorosa. Funciona sempre como um bálsamo para o ego.

O pior é depois. Quando as pessoas percebem que os seus conselhos não foram seguidos. Pior, que ouviram mais trinta pessoas sobre o mesmo assunto, provavelmente até que alguém lhes disse o que queriam ouvir, sem ligar patavina aos fantásticos contributos generosamente oferecidos. Aí está o caldo entornado.

Espere, é verdade que todos intuímos isto, mas há quem tenha estudado o assunto a fundo. Li um paper da Harvard Business School, assinado por Hayley Blunden e colegas, especialistas em comportamento das organizações, com o divertido título “Seeker Beware: The Interpersonal Costs of Ignoring Advice”, ou seja, um aviso de que ignorar os conselhos que nos dão tem um custo, e é alto.

Afinal, explica a equipa de Harvard, quando alguém nos pede um conselho, temos de puxar pela cabeça, esforçarmo-nos para estudar a questão e encontrar uma solução, passando a assumir o problema como nosso. No momento em que transmitimos o veredicto, sentimo-nos bem connosco próprios, e quanto mais consideramos quem nos solicita o input, mais insuflado fica o nosso ego. Mas se as nossas pérolas de sabedoria são sistematicamente ignoradas, é o nosso tempo e esforço que é deitado à rua. Ficamos zangados, até humilhados. E por muito boas pessoas que sejamos, a tendência é desprezarmos a pessoa que nos pediu conselho e não o seguiu. Afastamo-la, e tentamos não cair segunda vez na mesma esparrela. E até há quem, digo eu, se vingue mudando o sentido do seu voto, retirando o seu apoio, e se tiver poder para tal, puxando-lhe o tapete.

Mas porque é que solicitamos conselhos, se maioritariamente os ignoramos? Porque é uma forma de nos interligarmos com os outros, de lhes fazer saber como os admiramos, de os envolver e, até, de os corresponsabilizar nas nossas decisões. Outras, por pura demagogia ou para fazermos deles bode expiatórios. Há ainda a possibilidade de não sermos capazes de nos assumir como autores do nosso destino.

Para evitar mal-entendidos, a sugestão dos investigadores é que quem solicita apoio de terceiros esclareça logo à partida ao que vem. É que é diferente o investimento pedir um conselho, uma opinião sobre uma decisão já tomada (e a que se pretendem limar arestas), ou simplesmente desejar uma conversa destinada a recolher mais informação para uma futura tomada de decisão.

Bem vistas as coisas, Hayley Blunden tem um conselho-chave para lhe dar: se sabe que não vai seguir o conselho que solicita, não o peça! É claro que sabe que há grande probabilidade de ninguém lhe dar ouvidos.

 

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