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Brexit, Trump, populismo e autarcia: desafios que adquirem maioridade em 2016

Qualquer indicador que possamos encontrar mostra de forma clara que o rendimento tem aumentado em todo o mundo, e que os níveis de pobreza diminuíram substancialmente um pouco por todo o globo.

Nota: Este artigo está acessível, nas primeiras horas, apenas para assinantes do Negócios Primeiro.

 

Refletindo sobre o que o ano de 2016 trouxe de significativo, gostaria de destacar a conjunção entre o Brexit e a eleição de Donald Trump. Porventura apenas um destes acontecimentos isolados não teria o mesmo significado. Mas a combinação entre os dois marca de forma indelével este ano. De facto, líderes de dois dos países mais liberais e abertos do planeta conseguiram afirmar nas urnas propostas políticas (ditas populistas) que oferecem o isolamento e a autarcia como respostas para o descontentamento e ansiedade de importantes franjas da população, que se têm sentido marginalizadas do processo de desenvolvimento económico. Considero a afirmação deste caminho como uma das maiores ameaças para o desenvolvimento do nosso planeta.

 

Qualquer indicador que possamos encontrar mostra de forma clara que o rendimento tem aumentado em todo o mundo, e que os níveis de pobreza diminuíram substancialmente um pouco por todo o globo. Mas é também inegável que a evolução tecnológica e o modelo de crescimento económico das últimas décadas têm gerado crescente desigualdade. Não é consensual como é que esta desigualdade se tem manifestado a nível global. Mas é inequívoco que existe um aumento importante na desigualdade dentro dos países mais desenvolvidos, e uma importante diminuição nas oportunidades de emprego para alguns segmentos da população, sobretudo os menos qualificados.

 

As decisões no Reino Unido e nos EUA cavalgaram sobre a incerteza e a ansiedade que esta franja da população mais desprotegida tem sobre o seu futuro, e a ausência de respostas por parte dos políticos para os seus desafios. Mas o que é significativo é que, para o lado vencedor destes plebiscitos, os desafios gerados pela lógica económica e tecnológica do mundo moderno se resolvem com maior isolamento e autarcia. Temos tido ao longo da História do século XX inúmeras histórias de países e regiões que tentaram esse caminho de autarcia como modelo de desenvolvimento, do lado esquerdo e direito do espetro político, com resultados sempre negativos, e inúmeras vezes mesmo catastróficos. No entanto, temos agora em 2016 a aceitação de perspetivas com esta natureza por um grupo que representa uma maioria democrática nestes dois países. Existindo muitos problemas e importantes desafios que resultam destas decisões, esta perspetiva de isolamento parece-me ser a mais perigosa para a Europa e para o mundo.

 

A autarcia e o isolamento de países e regiões, com menos abertura e liberdade na mobilidade de pessoas, bens e serviços, só irá ter consequências ainda mais negativas para o desenvolvimento económico e para o progresso social dos seus cidadãos. O problema é que qualquer mau resultado será sempre lido nesta lógica populista de isolamento como sinal de que é necessário ir mais longe, erguendo mais muros e estabelecendo mais restrições, criando ciclos que podem ser muito destrutivos, como podemos testemunhar hoje na Venezuela.

 

O Brexit e a eleição de Trump trazem a maioridade para a ideia de que a solução para a desigualdade de rendimentos e oportunidades está na autarcia. Cumpre a todos aqueles que têm consciência de que tal caminho é, não só infrutífero, como extremamente perigoso, contrariar de forma deliberada e veemente esta perspetiva. O progresso económico e social exige abertura e oportunidade como respostas para a desigualdade. Mas este caminho tem sempre risco e incerteza, e também excluídos. Por isso, é igualmente crítico repensar o modelo e as soluções sociais para aqueles que, apesar de empenhados, não conseguem mobilizar as ditas oportunidade no contexto atual e futuro. E temos igualmente de encontrar forma de, numa sociedade cada vez mais envelhecida, dar maior protagonismo aos jovens, os grandes arautos da oportunidade e da abertura.

 

Diretor da Católica-Lisbon School  of Business & Economics

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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