Opinião
[719.] Aparelhos auditivos; CGD; Novo Banco; PT Empresas
Diz-me quem anuncias, dir-te-ei quem te vê: de manhã e à tarde, os canais nacionais estão cheios de publicidade televisiva a aparelhos auditivos.
Protagonizados por homens simpáticos, alguns de bata, simulando serem médicos, são de uma simplicidade audiovisual arrasadora, sem recurso a sonhos, estilos de vida, efeitos especiais, piadas. Concentram-se na mensagem sobre os produtos e no bem-estar que trarão aos utilizadores e nas condições de compra.
Aflige nestes reclames basearem-se na comunicação oral, isto é, aquela que o público-alvo não tem na totalidade. Esperar-se-ia que usassem mais a linguagem visual para comunicar com os velhotes meio surdos, mas preferem o conservadorismo das narrativas orais, semelhante ao dos programas da manhã e da tarde em diversos canais. O "especialista" com "autoridade" fala do produto, sendo a parte visual mero acessório dos reclames. Nesse sentido, são mais eficazes os igualmente conservadores anúncios de produtos auditivos na imprensa, recebidos pela visualidade.
Entretanto, o enxame destes anúncios na TV e na imprensa beneficia os consumidores, com a concorrência activa e constante entre as diversas marcas.
A Caixa Geral de Depósitos também fez um anúncio simples para novos clientes individuais. Tão simples e conservador que a imagem mostra em tamanho gigante uma fita métrica daquelas lindas, antigas, maleáveis, em amarelo, com as marcas dos centímetros bem visíveis. Que digo? Os publicitários deram destaque à face que mostra a medição em polegadas. Podiam ter tido a maçada - não era muita, só uns segundos - de encontrar nos catálogos de imagens uma foto duma fita destacando os centímetros. Aquilo, vá lá, a que chamamos fita métrica. Mas não. Sacaram uma foto duma fita "polegática" que eu, vejam só, também encontrei em segundos na internet, recurso maravilhoso para todos, não apenas os publicitários. Para quem quiser ver a foto usada pelos anunciantes da CGD pode encontrá-la por exemplo aqui: http://www.mattnorman.com/whats-your-measuring-tape/. Tendo em conta que a foto se destinava a portugueses de Portugal, país que começou a introduzir o sistema métrico em 1852, um bocadinho de respeito pela realidade não ficaria mal na escolha da foto, tanto mais que o anunciante pagou anúncios de página inteira. Se voltarem a usar este anúncio, mudem a fita, está bem?
Já quanto aos publicitários do Novo Banco, não sei se tomaram boa nota duma crítica em que eu lamentava que um anúncio de serviços para empresas agrícolas mostrasse um campo sem ninguém, inclusive na debulhadora mecânica. O que é certo é que um novo anúncio de página inteira do "banco que é a referência para as PME da agricultura" mostra em grande destaque, com o ponto de vista à altura quase do chão, o trigo num campo pronto a ser ceifado. Mais de metade da superfície do anúncio é ocupada pelo cereal. E, ao fundo, há gente a conduzir a ceifeira debulhadora! Então, publicitários, não se agradece o meu conselho?
PT, Altice, SIRESP: estão na berra nas notícias. "O seu negócio está protegido?" A pergunta não é sobre a PT, mas da própria PT, nuns anúncios destinados a publicitar os serviços da PT Empresas para a guarda e segurança de dados informáticos. "Rede segura", diz um. "Disaster recovery", diz outro. Letras brancas, gigantes, por trás dum protagonista e repetidas em baixo, como título do texto explicativo. A montagem fotográfica e artística coloca cada um dos protagonistas sem mais, sobre um fundo azul onde há traços brancos simulando o movimento de dados. Qualquer deles ri, pois tem os dados seguros.
Chamou-me a atenção estarem estas pessoas num espaço virtual - sem chão por baixo. Estão no ar, ou no meio dos dados, plenamente seguros. A composição das imagens corresponde bem aos serviços, mas eu, que caminho com segurança para a velhice, penso sempre se não faria falta um armarinho para guardar alguns documentos mais importantes em papel, um material que dura milénios.