Opinião
Um realista esperançoso
No momento em que o psicopata que o Brasil tem como Presidente leva a Copa América para o país (se calhar, para comemorar os 500 mil mortos oficiais pela covid) cabe lembrar que ele não faz isso sozinho. Faz com o apoio de grandes marcas internacionais.
Este meu espaço aqui no Negócios é uma extensão da minha cabeça, daquilo que penso. Logo, compreenda este texto que está a ler como um tapete de entrada, um capacho à porta do meu cérebro a dizer “Bem-vindo”.
Se não sabe, depois de muitos anos às quartas, passarei a publicar aqui às sextas, de quinze em quinze dias, alguns insights sobre como ler o mundo que se passa lá fora através do que é dito nas séries de TV, nos filmes, nos livros, nalguma mitologia, do marketing e através da etimologia das palavras. Daí o nome da coluna “O Contador de Histórias”.
Há muitas maneiras de interpretar os acontecimentos do dia a dia, o zeitgeist que nos envolve, o fumo cotidiano que nos turva os olhos; o que vou oferecer aqui será sempre uma versão apoiada no storytelling.
Acredito que somos as histórias que contamos uns dos outros. Somos vilões, heróis, personagens secundárias de tramas que se entrelaçam como fios de tricô num cachecol metafísico. Sim, sou dado a imagens poéticas e a metáforas pouco ortodoxas e absolutamente imprecisas (o que não deixa de ter lá a sua graça tendo em vista este ser um jornal voltado mais para os números).
Às sextas, somos pessoas diferentes do que costumamos ser nos outros dias. Às sextas, recuperamos as esperanças perdidas ao longo dos quatro dias úteis anteriores e apostamos tudo na noite que irá acontecer daqui a poucas horas e nos dois dias deliciosamente inúteis que nos oferecem à frente.
Espero que a minha coluna seja mais um dos seus pontos regulares de abastecer a alma antes do fim de semana. Nem que seja para saber o que estreou ou vai estrear no streaming, que livro vale a pena ler ou reler, que filme faz sentido ver, que facto não ganhou a devida atenção dos media.
Também encontrará aqui textos que tentam explicar o que acontece no Brasil. Trata-se do meu país de origem, com fortes ligações a Portugal e onde está sempre a ocorrer histórias raras, surpreendentes, surreais. Espero contribuir para que quem vive do lado de cá do Atlântico possa compreender melhor os acontecimentos da ex-colónia.
Tudo isto dito, deixa eu já contar uma coisa recente.
Dizem que um bom marketing acelera a morte de um mau produto. Verdade. Mas um mau marketing pode acelerar a morte de boas pessoas. Explico: no momento em que o psicopata que o Brasil tem como Presidente leva a Copa América para o país (se calhar, para comemorar os 500 mil mortos oficiais pela covid) cabe lembrar que ele não faz isso sozinho. Faz com o apoio de grandes marcas internacionais.
Daí que podemos perguntar: como podem as marcas falar sobre responsabilidade social, um mundo melhor e outras coisas do género e emprestar o seu apoio a um crime contra a humanidade ainda em movimento?
Não é viável uma marca posar de boa cidadã, preocupada com o planeta, às terças, quintas e sábados, e pactuar com uma atitude maligna de um governo genocida nos restantes dias da semana. Ainda estava a elaborar essa questão quando li que a Mastercard, uma das principais investidoras do evento, irá abrir mão de expor a sua marca, ou seja, desistiu de ativar o seu patrocínio, irá pagar o que o contrato manda, mas sem querer aparecer. Pode não ser perfeita, mas trata-se de uma boa decisão. Daquelas que não são tomadas de alma leve, que vai ter de ser justificada aos acionistas, coisa de gente grande e que percebe que a vida de uma marca depende das vidas dos seus consumidores. Que bom. Viu só como ainda dá para ter esperança no ser humano?
Ou como diria o meu Tio Olavo: “O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso.”