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Um imposto europeu

Por mais impopular que seja, o pagamento de impostos representa uma contrapartida necessária à vida em comunidade e transforma a cidadania numa realidade dinâmica e participativa.

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Um dos efeitos da crise da zona euro foi o ressurgir das discussões sobre o aprofundamento da integração política na União Europeia, o que permitiu constatar que algumas áreas politicamente sensíveis - como a integração fiscal ou a adoção de um modelo europeu de Estado Social - continuam largamente ausentes dos Tratados e do discurso político europeu, ainda que sejam centrais para a determinação do que seja a solidariedade entre os Estados e a União Europeia. Em concreto ao nível da integração fiscal, apesar de a crise ter tornado mais ou menos clara a necessidade de se fazerem mais progressos neste domínio, a verdade é que muito pouco foi feito desde então.

 

Dito isto, e correndo o risco de defender uma ideia especialmente impopular (e mais ainda em tempos de crise), julgo que devemos encarar com seriedade a possibilidade de criação de um imposto supranacional europeu como um meio de promoção de maior integração política e de solidariedade ao nível da União, o qual deve ser introduzido em substituição (e nunca a acrescer) de um imposto nacional.

Com efeito, por mais impopular que seja, o pagamento de impostos representa uma contrapartida necessária à vida em comunidade e transforma a cidadania numa realidade dinâmica e participativa - em vez de inerte e estéril -, na medida em que comporta uma dimensão de integração política dos indivíduos no interior dessa comunidade, acentuando a ligação dos cidadãos com a comunidade política e legitimando-os a exigir uma contrapartida de solidariedade por parte da sua comunidade política. Estas são dimensões muitas vezes ignoradas no discurso político, mas empiricamente demonstradas e que justificam que se pondere a médio prazo a introdução de um imposto supranacional europeu.

 

Para além disso, o pagamento de impostos é uma realidade em todas as ordens nacionais, e são estes mesmos impostos que permitem aos Estados-membros suportar o custo económico da execução das políticas da União Europeia. A construção de um imposto supranacional europeu apenas permitiria uma maior eficiência na determinação do contributo de cada Estado-membro para o Orçamento da União, bem como da distribuição de recursos entre os Estados-membros no âmbito da execução das políticas europeias.

 

Ora, se até hoje a ausência de um imposto direto europeu era facilmente compreensível - pois a União tem sobretudo pretendido cortejar os indivíduos para, no futuro, receber uma maior aceitação como corpo político -, porventura já chegámos a uma fase de maturidade no processo de integração europeia que permite lançar as sementes de um imposto supranacional europeu e iniciar um processo que culmine, num prazo de 10 anos, na adoção desse imposto.

 

Será preciso, porém, bastante coragem da parte dos políticos para defenderem um processo que, sem uma informação e explicação cuidada, será amplamente rejeitado pela população. Mas esse é um risco da profissão e é também para isso que servem os políticos e as campanhas eleitorais: para a promoção corajosa de ideias. 

 

Docente da Universidade Católica Portuguesa | Direito

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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