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O alerta urgente e necessário

Há dias, Hélia Correia, a grande escritora e querida amiga, deu um grito de sobressalto e de alerta: "Sem a Grécia nada somos! Viva a Grécia!"

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O dr. Passos Coelho aproximou-se do proscénio da Europa e falou que Portugal contribuíra, decisivamente, para a "solução do problema grego." Disse-o num tom fúnebre e rosto cerrado, mas sem perceber que dera uma machadada nos escombros do que restava da "União» Europeia". O golpe de Estado acabado de ser perpetrado pela Alemanha de Angela Merkel e de Wolfgang Schäuble conferia à chanceler o título de imperatriz e ao ministro das Finanças as funções de uma espécie de Rasputin germânico.

Há anos, chamou-se de "satélites" da União Soviética aos países de Leste sob influência comunista. O império, agora, é outro, e os seus serventuários são-no "democraticamente", mas o estilo é o mesmo, e quem pense e aja ao contrário do pressuposto já sabe o que lhe acontece. O cerco e o esmagamento da Grécia, a chantagem ao seu governo, o medo inculcado na sua população não podem ser ignorados. A verdade é que os países que votaram a imposição das suas regras aos gregos cumpliciaram-se, de bom grado, com a destruição dos princípios da "União", e com o fortalecimento dessa monstruosidade ideológica inadequadamente classificada de "neoliberal."

Porém, ao que parece, as coisas não serão assim tão fáceis, apesar de uma sondagem proclamar que os alemães estão muito contentes com a decisão que resultou em mais uma humilhação do povo grego, e de o resto da Europa se quedar num repulsivo silêncio. As manifestações populares no belo país começaram logo e os princípios que deram origem ao Syriza não se diluíram.

O golpe de Estado alemão contra a Grécia terá, necessariamente, de obter consequências. O povo grego possui a coragem dos velhos combatentes: enfrentou a invasão nazi, cuja violência e crueldade são ignoradas; uma guerra civil tremenda; a ascensão dos coronéis ao poder, que originou uma sangueira sem par; e uma "democracia" de alternância (como é comum na Europa "ocidental") que originou a fome e a miséria mais exacerbadas. O Pasok socialista e a Nova Democracia de Samaras, irmã gémea do PSD português, nada mais fizeram do que dar continuidade a políticas de esbanjamento e de saque. A democracia, tal como em Portugal, foi esvaziada de sentido e a perversão do "sistema" fizeram o resto.

Não se julgue que a questão grega é, somente, um sintoma. Ela resulta da distorção democrática, do cansaço a que os políticos conduziram os antigos padrões, das traições sistemáticas e das ausências de líderes progressistas, substituídos por uma horda de medíocres enfatuados que as circunstâncias levaram ao poder. A estratégia do capitalismo permitiu e estimulou o aparecimento destes "jovens turcos" e o seu apoio em partidos de Direita, desprovidos de ideais e de convicções. O "deus dinheiro", como lhe chamou, recentemente, o Papa Francisco, tem arrastado, num turbilhão de derrubamento de valores e de padrões, o enquadramento civilizacional no qual fôramos educados.

Portugal não fugiu à regra. Politicamente, somos frágeis; socialmente, débeis; culturalmente, quase inexistentes. Há dias, Hélia Correia, a grande escritora e querida amiga, deu um grito de sobressalto e de alerta: "Sem a Grécia nada somos! Viva a Grécia!" Contrapondo, com a verdade histórica a cultural, o rol de mentiras e de omissões desgraçadas com as quais tem sobrevivido Passos Coelho e os seus. Precisamos, o nosso povo precisa, de uma sacudidela que nos tire destes torpores e desta indignidade letal. As próximas eleições são marcantes para se perceber o que somos e o que queremos de nós próprios. E não são apenas os partidos os protagonistas desta mudança necessária. Reconheço que a tarefa é difícil, mas já passámos por dificuldades maiores. Estamos aqui, para o que der e vier. E temos de admitir que a questão não é meramente passageira. A nossa pátria está em perigo, e os vendilhões do templo, do nosso chão sagrado, continuam impunes e sossegados.

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