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O setor privado e o programa de privatizações em Angola

Quem tem estado ligado a Angola há quase duas décadas não pode deixar de considerar notável a evolução que se tem verificado, principalmente nos últimos anos, no sentido de assegurar o fortalecimento e crescimento do setor privado. São inúmeros os exemplos.

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Desde logo, os esforços feitos para assegurar os direitos dos investidores, atribuir incentivos (nomeadamente fiscais) e flexibilizar os pagamentos internacionais, refletidos na nova lei do investimento privado e alterações à legislação cambial. Depois, a aprovação de uma nova lei de parcerias público-privadas, que agiliza e regula a participação do setor privado no esforço de dotação do país das infraestruturas necessárias ao seu desenvolvimento. E, não menos importante, a clara preocupação em relação à transparência, bem patente na lei da concorrência e no novo Código de Contratos Públicos.

Associadas a esta vertente regulatória, estiveram também medidas muito importantes, como sejam o ambicioso programa de implementação de parcerias público-privadas; a desvalorização do kwanza, que logrou conseguir uma maior estabilidade macroeconómica e fortalecer as reservas cambiais; e os esforços em ultrapassar a dependência do setor petrolífero e diversificar a economia. E não se pode esquecer também o resultado do Índice de Transparência e Corrupção 2020, no qual Angola subiu 25 lugares nos últimos três anos.

Mas provavelmente a medida mais marcante foi o lançamento, em 2019, de um ambicioso programa de privatizações, o PROPRIV.

Trata-se de um programa para privatização, até 2022, de 195 participações, direta ou indiretamente, detidas pelo Estado angolano. Os ativos a privatizar são de todos os tipos, setores e dimensões. Desde as unidades industriais da ZEE, até participações na banca, seguros, telecomunicações, construção, cervejeiras, têxteis e nos gigantes Sonangol e Endiama.

Para além de todas as outras importantes medidas a nível regulatório, o PROPRIV contou também com a aprovação da Lei de Bases das Privatizações e a entrada em funcionamento da BODIVA (Bolsa de Dívida e Valores de Angola), ambos fundamentais para assegurar a eficiência, clareza e transparência do processo. Estes diplomas preveem que as privatizações se concretizem através de concurso público (com e sem prévia qualificação) e venda em bolsa (por leilão ou oferta pública inicial).

Até agora foram concluídas 36 privatizações e todas por concurso público. E esperam-se para breve as privatizações de participações em ativos de maior dimensão, incluindo, ainda em 2021, no banco BCI, na seguradora ENSA, na MS Telecom, na TAAG e, em 2022, na Sonangol e Endiama, tendo sido anunciado que todas estas serão feitas em bolsa, através de leilão ou oferta pública inicial.

Tudo isto cria grandes oportunidades e expectativas para potenciais investidores. E se por um lado não se pode deixar de louvar tudo o que o Estado angolano tem feito para criar a confiança necessária ao sucesso da política de fortalecimento do setor privado, por outro, existem ainda desafios e problemas a ultrapassar.

A questão das reservas cambiais, embora tenha melhorado muito, continua a não ser um problema menor para os investidores que pretendem ter a possibilidade de repatriar o produto dos seus investimentos. Tão-pouco é a circunstância da BODIVA ainda não ter empresas cotadas e de a maior parte das grandes empresas angolanas terem ainda de se preparar para as exigências de informação e transparência de uma empresa cotada em bolsa. A própria implementação do PROPRIV previa-se que pudesse ter outra dinâmica.

Mas apesar dos desafios, o certo é que estão criadas as condições para o crescimento da participação do setor privado e, ainda mais importante, existe vontade política de o fazer. Do lado do Estado é preciso que mantenha o curso e vá corrigindo as imperfeições. Os investidores privados, por seu turno, deverão preocupar-se em estruturar de forma adequada os seus investimentos, identificando e mitigando os riscos.

 

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