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Manuel Caldeira Cabral 24 de Novembro de 2014 às 19:10

Exportações em desaceleração?

A retoma do crescimento em Portugal coincidiu com o aumento da procura interna e a redução da procura externa líquida, que passou a dar um contributo negativo para o crescimento do PIB desde finais de 2013. Nos primeiros nove meses do ano, as importações portuguesas cresceram o dobro das exportações.

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O crescimento puxado pela procura interna, nomeadamente pelo consumo e pela recuperação da procura de bens duráveis, como os automóveis, tem sido a principal razão utilizada para explicar este fenómeno. De facto, o aumento do consumo implicou um aumento das importações. Mas isso é apenas metade da história.

 

A outra parte da história é simples: as exportações estão em desaceleração. Nos primeiros nove meses do corrente ano cresceram apenas 2,2% em termos nominais, o mais baixo crescimento nos últimos 5 anos, ficando abaixo da média do período de mais baixo crescimento das exportações portuguesas na história recente - os anos entre 2000 e 2005 - ver gráfico.

 

Este facto desmente a ideia de que foi em reacção à crise, e às reformas efectuadas no contexto do programa de ajustamento, que as empresas se viraram mais para o exterior. Pelo contrário, o programa de ajustamento coincidiu com uma desaceleração das exportações face ao período anterior.

 

A desaceleração das exportações portuguesas está a acontecer desde o final de 2011, o que em parte se explica pelo arrefecimento do mercado europeu. Mas a manutenção deste fenómeno pode indiciar outros problemas ao nível de alguns sectores exportadores.

 

A desaceleração em 2014 foi especialmente marcada pela redução das exportações de bens - que registaram um  crescimento nominal de 0,5% nos primeiros 9 meses.

 

Parte da desaceleração verificada entre 2013 e 2014 é explicada pela redução das exportações de produtos refinados de petróleo, tal como a aceleração de 2013 também foi. Anulando o efeito dos produtos petrolíferos, temos um crescimento nominal de 3% a 4%. Trata-se de crescimento. Mas de um nível de crescimento próximo do verificado no período de menor crescimento das exportações portuguesas.

 

Em termos sectoriais há alguns sectores em contraciclo como o vestuário e calçado, ou o turismo, que registaram uma aceleração do crescimento das exportações e foram responsáveis por mais de metade do crescimento das exportações em 2014. Mas outras áreas como as de minérios e produtos metálicos, máquinas, madeiras e cortiça estão a registar crescimentos negativos ou muito próximos de zero.

 

Os baixos níveis de investimento e a manutenção de elevados custos de financiamento podem estar a limitar o crescimento destes sectores.

 

Em conclusão, os dados das exportações dos primeiros nove meses de 2014 não dão um cenário de desgraça, mas também não reflectem um quadro muito animador. A procura externa não está a ser um motor do crescimento. As exportações estão a crescer pouco. Verificando-se um crescimento particularmente baixo em muitos sectores industriais.

 

Pode-se perguntar onde estão os sinais de mudança de modelo de crescimento face ao período anterior? Será que alguém tem ilusões de que um crescimento baseado apenas na procura interna é sustentável? E a resposta não é animadora.

 

Pode-se também perguntar onde encontrar os resultados do programa de industrialização? Ou o que aconteceu à prometida aceleração das exportações puxada pela desvalorização salarial? A descida dos salários aconteceu. A aceleração das exportações não.

 

É interessante ver, que mesmo os sectores que estão a crescer, como o calçado, negam o modelo de baixos salários, crescendo pela capacidade de criar valor, pela qualidade, e anunciando aumentos salariais em contraciclo com a falhada teoria do empobrecimento. 

 

Professor no departamento de Economia da Universidade do Minho

 

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