Opinião
Estado da visita
A visita do primeiro-ministro português, António Costa, a Luanda agendada para a próxima semana, marca o início de um período novo nas relações entre Angola e Portugal.
António Costa vai encontrar-se pela primeira vez em Angola, numa visita de Estado, com o Presidente da República, João Lourenço, depois de um sucessivo conjunto de encontros entre ambos em Abidjan na Cimeira União Europeia/ União Africana, em Davos no Fórum Económico Mundial e na Ilha do Sal, em Cabo Verde, na última reunião da CPLP.
Nesse conjunto de encontros terão sido limadas algumas arestas de uma relação bilateral, aqui e ali pontuada por situações de alguma crispação e desconfiança, em que o caso Manuel Vicente terá sido o de maior visibilidade mediática.
Angola e Portugal têm que fazer um caminho juntos e simultaneamente separado. Depois de mais de quarenta anos de independência, Angola começa a olhar para a presença colonial portuguesa como um facto histórico e não deverá continuar a ver no passado a justificação para tantos erros que foram sendo cometidos, e que a nova geração de políticos, onde se inclui João Lourenço, vai assumindo como próprios e com necessidade urgente de serem reparados.
Portugal, em função da integração europeia, também começa a esquecer o seu passado, sem esquecer a história, e cada vez mais a nova geração de licenciados começa a olhar as ex-colónias como mais um lugar de oportunidades em igualdade com muitos países do mundo, sem atestados de menoridade por terem sido potência colonial.
Estamos no fim daquilo que foi a mentalidade prevalecente no último século em que Angola era um quintal português. A nova geração de angolanos, e estamos a falar de uma percentagem significativa de uma população jovem, já não conheceu a era colonial e o que viveu foi uma independência difícil, mas onde lhe foram inculcados valores de Nação, que hoje é motivo de orgulho de todos, mesmo os poucos que vão sendo desmesuradamente pessimistas em relação ao futuro.
Portugal não deve temer concorrência em Angola
António Costa é filho de Orlando da Costa, um antigo combatente contra a sociedade colonial, membro dos corpos dirigentes da Casa dos Estudantes do Império em Lisboa no fim dos anos 50, companheiro de Agostinho Neto, Lúcio Lara, Amílcar Cabral e outros valorosos combatentes pela independência das colónias. Nasceu no estertor da ditadura e fez todo o seu percurso académico e político em democracia.
João Lourenço já não é um produto da guerrilha do MPLA, foi um militar nas lutas pós-independência, e já fez saber que o seu projecto de desenvolvimento será assente na criação de uma hierarquia de competências, e na busca de condições plenas para que o investimento seja feito de acordo com as necessidades urgentes do País, e não com megalomanias empresariais com objectivos de lucro fácil e instalação de nepotismo em diferentes patamares do aparelho de Estado, como se tem verificado nos últimos tempos.
Neste quadro inovador é perfeitamente natural que esta visita fuja um pouco ao cinzentismo e à desconfiança com que foram encaradas outras de tempos idos. A discrição com que os dossiês têm sido preparados, e exemplo disso foi uma discreta visita a Lisboa de Ana Dias Lourenço para contactos com dignitários de instituições portuguesas, entre os quais o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa deixam antever resultados auspiciosos.
Prevê-se que seja assinado um instrumento fundamental para uma efectiva normalização das relações empresariais entre os dois países, e que será o fim da dupla tributação, uma antiga reivindicação dos empresários angolanos e portugueses.
A agilização dos vistos de entrada e permanência nos territórios para cidadãos de dois países, acordos no domínio do ensino superior e qualificação profissional e protocolos ao nível cultural e desportivo são algumas áreas que tornarão a viagem de António Costa um excelente princípio num quadro de relações bilaterais, que serão reforçadas aquando da visita de João Lourenço em Novembro próximo a Lisboa.
Portugal não deve temer a presença de outros parceiros internacionais em Angola, económica e financeiramente mais fortes. Pelo contrário, tem nesse particular vantagens claras derivadas do passado comum e do conhecimento mútuo.